Muitos dos meus antigos colegas de redação foram testemunhas de episódios que entraram para a História. Cobriram guerras, entrevistaram presidentes da República, revelaram escândalos. Eu não fiz nada disso, mas realizei uma fantasia de infância: entrei dentro de uma novela.
Fui uma criança noveleira, como muitas da minha geração. Lembro da primeira novela colorida, da primeira novela censurada, da primeira novela das seis. Mesmo assim, escrever sobre TV não era exatamente minha maior ambição profissional quando saí da faculdade. Esse tipo de cobertura não rende prêmios, furos de reportagem ou manchetes de capa. Em compensação, coisas sensacionais podem acontecer na vida de quem é pago para correr atrás do galã da novela das oito. Como, por exemplo, você estar em casa, saindo do banho, com uma toalha enrolada na cabeça, quando toca o telefone e do outro lado da linha está um ator que tinha ficado de lhe dar uma entrevista. Um homem que você amava tanto na infância que chegava a achar parecido com seu pai: “Cláudia? Aqui é o Tarcísio Meira, pode falar agora?”.
Enquanto os repórteres de política passeavam pelos jardins da Casa da Dinda, eu frequentava o Jardim Botânico e os estúdios onde as novelas eram gravadas – o que era mais ou menos como entrar dentro da cartola do mágico, descobrir como funcionavam seus truques e ainda bater um papo com o coelhinho branco.
Protagonistas da era de ouro da telenovela, Paulo José e Tarcísio Meira não deixam sucessores entre os atores mais jovens. Mudou a televisão aberta, mudaram as novelas e mudaram os hábitos dos telespectadores. A família não se reúne mais na sala para assistir TV, e estrelas aparecem e desaparecem das telas sem que ninguém sinta falta delas.
Os atores e atrizes que trabalhavam na Globo nos anos 1970 e 1980, quando o Brasil todo era noveleiro, eram artistas que haviam começado suas carreiras no rádio, no teatro ou no cinema – e não nas escolinhas de talentos. Talvez por isso sejam tão queridos pelo público até hoje. Como os italianos entendem de ópera e os espanhóis de touradas, brasileiros são experts em telenovelas e instintivamente percebem a diferença entre quem interpreta e quem apenas declama (mal) um texto decorado. Uns ficam famosos porque estão na novela. Outros ainda serão lembrados muito tempo depois que o gênero deixar de existir.