Cheguei a pé no clube de jazz perto de casa onde fui assistir ao meu primeiro show ao vivo depois de 18 meses. Sentei no balcão, pedi uma cerveja e fiquei aguardando o espetáculo começar. Havia pessoas de todas as idades em volta, mas uma mesa especialmente animada me chamou a atenção. Eram homens e mulheres na faixa dos 70 anos – ou mais – que saíram de casa no domingo à noite para ouvir música e se divertir com os amigos. Deixaram de ser “grupo de risco”, pensei. Eram sobreviventes – como eu, você e todo mundo que atravessou a pandemia e foi alcançado a tempo pela vacina.
Sobrevivente era também o lugar onde estávamos. O Birdland é um dos clubes de jazz mais tradicionais de Nova York, mas quase entregou os pontos durante a pandemia. Graças à mobilização de artistas e frequentadores, o dono, Gianni Valenti, conseguiu honrar seus compromissos. Como agradecimento especial ao público, o preço dos ingressos naquela noite era o mesmo praticado em 1949, quando a casa foi inaugurada: 99 centavos.
Quando subiu ao palco para apresentar a atração musical, a Arturo O’Farrill and The Afro Latin Jazz Ensemble, Valenti falou do aperto dos meses anteriores e da alegria de voltar a ver a casa cheia. Antes mesmo de a banda começar a tocar, todo mundo que estava ali – artistas, espectadores, funcionários da casa – sabia que aquela seria uma noite inesquecível e não apenas porque os músicos eram bons: depois de tanto tempo de isolamento, o maior espetáculo da Terra era voltar a fazer parte de uma plateia.
No início do século 20, o sociólogo Émile Durkheim criou um conceito que ajuda a entender o que estava acontecendo ali: “efervescência coletiva”. Sabe aquela alegria que a gente sente quando está em volta de uma mesa com os amigos? Ou com os colegas de trabalho criando um projeto novo? Ou em um estádio comemorando um gol? Efervescência coletiva.
Na alegria e na tristeza, emoções são contagiosas e poucas coisas nos trazem mais contentamento do que compartilhar um sentimento, uma vibração, um estado de espírito. Foi isso que a pandemia roubou de todos nós. E é isso que, aos poucos, vai trazer a vida de volta ao mais ou menos normal.
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Faça como os nova-iorquinos e ajude um espaço cultural da sua cidade a sobreviver. Se existe um local tão importante para a cultura de Porto Alegre quanto o Birdland é para Nova York, é o Ocidente. Os ingressos para a segunda noite do festival Socorro Ocidente Show estão à venda na plataforma Sympla. Ajuda lá!