Houve um tempo em que eu considerava perda de tempo assistir ao mesmo filme duas vezes (a menos, é claro, que não tivesse entendido nada na primeira sessão, o que não é raro de acontecer quando a gente é mais novo e tem uma certa queda por filmes cabeça) ou voltar a um livro já lido para apreciar com mais calma as sutilezas que um leitor afoito às vezes deixa escapar. Minha abordagem em relação ao consumo de livros e filmes era no estilo “buffet livre”: quantidade e variedade a serviço do apetite.
Eis que no meio do caminho desta vida (ou um pouco além do meio, para ser honesta), comecei a reler livros e rever filmes com mais frequência do que antes. Não que eu tenha desistido de explorar novidades no cardápio de opções quase infinitas à disposição dos interessados. Às vezes, só artistas que estão criando neste exato momento nos ajudam a entender o que a gente anda sentindo e pensando. Continuem trabalhando, por favor.
O negócio é que, na proporção em que o futuro encolhe, a nostalgia costuma se espichar. Sentimos saudade não apenas de pessoas, lugares e circunstâncias, mas de nós mesmos e das nossas emoções mais intensas. Quando boa parte dessas emoções está ligada a experiências estéticas marcantes, é natural querer voltar a elas como quem entra em uma máquina do tempo em busca do êxtase perdido.
O que procuramos, em essência, é irrecuperável. Não somos mais as mesmas pessoas. Às vezes nem sequer somos capazes de reconhecer com muita clareza aquilo que nos impressionou tanto da primeira vez. Crescemos além daquela narrativa e, por algum motivo, ela deixou de fazer sentido para nós: a comédia perdeu a graça, o melodrama tornou-se piegas e a canção de amor cheia de significados era de vidro e se quebrou. Acontece.
Mas, em alguns casos, a releitura se torna um prazer completamente novo: no lugar da repetição de uma sensação, encontramos outra, melhor, mais completa, mais intensa. Acredito que a distância percorrida entre a primeira leitura e a atual tem menos a ver com a obra em si do que com o caminho que nós mesmos percorremos. Não é mais uma máquina do tempo que nos transporta, mas um mapa que nos situa.