A polarização não é uma febre passageira, causada pela ascensão de uma determinada visão de mundo ao poder, mas uma doença crônica com a qual vamos ter que aprender a conviver nos próximos anos.
O comentarista político americano Ezra Klein, fundador do site de notícias Vox e filho de um matemático brasileiro, analisa vários aspectos da "grenalização do mundo" (em livre tradução gaudéria...) no livro Why We're Polarized, lançado na semana passada nos Estados Unidos.
"We", claro, são os americanos e seu sólido sistema democrático, desafiado nos últimos quatro anos pelas extraordinárias incontinências de Donald Trump e pela crescente dificuldade de diálogo entre liberais e conservadores. Mas, por motivos óbvios, o livro também pode ser muito esclarecedor para leitores (e eleitores) brasileiros.
Em cinco brevíssimos tópicos, um resumo do livro de Ezra Klein sobre a polarização:
1. A polarização não pode ser atribuída a um único fator ou à ação de um único personagem ou grupo. Todo o sistema se tornou tóxico, e sistemas tóxicos comprometem bons indivíduos.
2. Nossas inclinações políticas estão mais associadas a traços de temperamento do que imaginamos. Ideologia e psicologia se atraem. (Pense nisso antes de romper definitivamente com aquele seu tio que você adorava até 2017…)
3. A política tornou-se uma forma de expressão da individualidade: sou aquilo em que acredito e também aquilo que odeio. Uma identidade é mais difícil de mudar do que uma opinião: "Estamos trancados dentro das nossas identidades políticas e não há nenhum candidato, nenhuma informação, nenhuma circunstância que possa nos levar a mudar nosso pensamento".
4. Com a lógica da audiência pautando as decisões editoriais dos veículos, as vozes mais radicais ganharam mais espaço na mídia. Quanto mais sensato e equilibrado um comentário ou uma notícia, menos chance de ser notado ou compartilhado. Mas, mesmo quando recebe informações corretas e ponderadas, a maioria das pessoas tende a rejeitar aquilo que não confirma seus pontos de vista.
5. Toda política é "identitária", e não apenas aquela que traz as reivindicações de grupos historicamente marginalizados (negros, mulheres, gays…). Mas nossas ideias e inclinações políticas costumavam refletir várias das nossas identidades em cruzamento: gênero, cor, religião, geografia, cultura, origem social… A polarização não foi causada pelas "políticas identitárias", e sim pela fusão de muitas identidades em uma única megaidentidade: contra ou a favor de determinada orientação política.