Pela primeira vez em quatorze anos, o número de homicídios de janeiro a agosto em Porto Alegre fechou em dois dígitos, com 96 ocorrências, e o número de homicídios no Rio Grande do Sul, em três dígitos, com 915 ocorrências.
As promissoras estatísticas rompem a bolha do medo que estava nos intranquilizando nas três últimas semanas, devido aos dois episódios de triplo homicídio em Porto Alegre e Alvorada, na Região Metropolitana, e a chacina de quatro pessoas em Rolante, no Vale do Paranhana.
Parecia que regredíamos no tempo para a Colômbia do Cartel de Medellín ou emparelhávamos com a criminalidade selvagem do México, com um súbito maremoto de mortes autografadas por facções, num aviso de poder, numa delimitação de território em plena luz do sol.
O que se pode concluir, num misto de alívio e de consolo, é que os cenários sangrentos representaram solitárias ondas e isoladas ações do tráfico. Não condizem com o contexto de repressão ao crime e diminuição da violência. Significam barbáries de exceção, que desencadearam reforço imediato de policiamento nas localidades.
Indicadores da Secretaria de Segurança Pública, anunciados na segunda-feira (9), dissipam as preocupações com dados animadores.
Comparando o mês de agosto de 2023 com o de 2024, houve a queda de 27% no número de homicídios, 67% no de latrocínios e 40% no de feminicídios.
Despencaram pela metade os casos de furto, de roubo a pedestre e de roubo de veículos.
Existe uma revolução silenciosa, secreta e coordenada da Polícia Civil e da Polícia Militar.
Nos primeiros oito meses de 2016, presenciamos 125 vítimas de latrocínio; já em 2024, tivemos 24 vítimas. Nos primeiros oito meses de 2016, doze mil veículos foram roubados; em 2024, contabilizamos 1.500, numa retração de 87,5% em oito anos.
Entre março e julho deste ano, por cinco meses consecutivos, Porto Alegre chegou a alcançar o padrão internacional de segurança da ONU, de 10 homicídios ao ano por 100 mil habitantes — 90% dos municípios gaúchos detêm regularmente esse patamar.
A mudança de mentalidade se deve a um monitoramento de três turnos por dia — às 6h30, às 14 e às 18h — de todas as ocorrências em nosso estado, feitas em parceria entre o secretário de Segurança Pública, Sandro Caron, o comandante-geral da Brigada Militar, coronel Cláudio Feoli, e o delegado Fernando Sodré.
— Não soltamos o dedo do pulso em nenhum momento, socorrendo qualquer oscilação de comportamento — diz Sandro Caron, que tem experiência como secretário do Ceará.
Sabendo que, a cada dez homicídios, oito são motivados por briga de traficantes ou cobrança de dívida, a investigação passou a capturar não somente os executores, mas também os mandantes.
Entre as novas formas de atuação, destaca-se a inteligência no combate ao crime organizado.
— São dois movimentos simultâneos. Além de prender as lideranças, colocamos nossa energia na asfixia financeira dos envolvidos, suspendendo a circulação da droga a partir das apreensões, e mapeando a lavagem de dinheiro para sequestrar os bens e bloquear as contas — explica Sandro Caron.
Depois de tantas tragédias, de tantos desastres, é possível recuperar a confiança no estado. E agora nos resta não baixar a guarda, aspirar ao impossível, à idealização, para só comemorar quando reduzirmos ao extremo a dor do luto inesperado.
Enquanto houver viúvos, viúvas, órfãos, pais desamparados, velórios por assassinatos, rangeremos os dentes.