O gesto mais complexo no amor é cuidar de alguém e sair de cena. Para que a pessoa, a partir dali, aprenda a se manter.
Amparar, ficar do lado, para em seguida respeitar a autonomia e deixar que o outro desabroche.
É ajudar o filho, instruir, dar o exemplo e permitir que ele mesmo se defenda e forme seus anticorpos para os obstáculos do destino. Jamais viver por ele. Jamais atrofiar o seu potencial com uma tutela excessiva. Jamais impedir que ele tenha a sua própria história, e saia de casa, e se emancipe da família.
No casamento é igual. Cabe-nos oferecer assistência ao par, quando carente, quando debilitado, quando descrente em si, e recuar para a discrição no momento em que ele recuperar o brilho. Não transformar o incentivo em sustento financeiro ou emocional, anulando o poder de escolha (até porque não ter para onde ir suspende o livre-arbítrio da união).
A proeza de amar é não querer ser sempre útil. É não querer ser sempre necessário. É não estabelecer nenhuma simbiose. É não adoecer a proximidade num vício, é não explorar o medo da solidão para se mostrar imprescindível, é não usar a saudade como chantagem, é não converter a gratidão em culpa.
Pois não se cobra o que foi dado espontaneamente. Generosidade não é investimento.
Não saber se despedir estraga a liberdade, cria monstros do apego.
Se você teve a experiência de um jardim, deve ter visto o que é o esteio, uma estaca para fortalecer uma muda murcha ou com dificuldade de permanecer de pé.
Já reparou que o esteio não pode ser maior do que a planta? Senão a planta morre. Recomenda-se que seja menor, apenas para servir como impulso, como reforço provisório ao seu crescimento alinhado e orgânico.
Assim que ela viceja e se firma, você tira o acompanhamento, para que a natureza prossiga o seu florescimento.
O risco é um esteio que ultrapassa a planta. Ela continuará precisando dele. Ela nunca vai se virar sozinha. Ela nunca conhecerá os seus próprios limites. Certamente, definhará pelo excesso de proteção. Sucumbirá pela facilidade de uma escada sempre disponível, não se esforçando para subir ao alto pelo seu caule e folhas, escorada eternamente nos degraus efêmeros.
A função da escora é apoiar o vegetal por um tempo, mas não ocupar seu lugar. De modo nenhum, substituir ou suplantar uma existência.
Todos somos médicos e enfermeiros da alma. Socorremos os nossos afetos, suprimos as suas faltas imediatas, curamos as suas feridas, porém o curso inexorável é ir nos desvencilhando pouco a pouco com o quadro de melhora.
Não desejamos que o paciente more no hospital. O anseio é que a internação seja a mais breve possível. O objetivo é que ele não dependa de nosso olhar, de nossa vigilância, que possa se reerguer e seguir preservando a sua saúde.
A certeza de um bom trabalho é conseguirmos nos afastar, sem vínculo tóxico.
Nossa presença é um remédio, um esteio, desde que não sufoque ou faça sombra.