Não há como prender nossos talentos, ainda mais diante de nossa realidade de enchente e reconstrução. A alienação é impraticável.
Mas somos apegados, numa incompetência emocional para fechar ciclos e dizer adeus. Não sabemos nos desligar, acenar, agradecer. Guardamos as mãos trancadas no bolso, numa avareza romântica.
O futebol é dinâmico. Nem sempre permanecer é o melhor para o time ou para o atleta.
Por mais que eu goste de Mauricio, o jovem meio-campista colorado de 23 anos (aniversariante de sábado), sinto que ele não é capaz de dar mais do que já ofereceu para o manto.
O namoro não tem perspectiva de noivado ou de casamento com as arquibancadas.
Encontrou um teto, que não permite a regularidade admirável de atuações. Da mesma forma que brilha, some. Da mesma forma que mostra personalidade para fazer um gol de cobertura no último minuto em cima do Flamengo, leva um cartão vermelho bobo numa semifinal do Gauchão, caindo em provocação do adversário.
Chegou como promessa do Cruzeiro, em 2020, num negócio promissor, em troca de Pottker. Alcançou a seleção olímpica, marcou 25 gols em 176 partidas, experimentou sua lua de mel com a torcida, que o apelidou de Mau Mau. Desfrutou de titularidade incontestável, no entanto, apenas em alguns confrontos. Só a lesão de Alan Patrick garantia seu lugar certo na equipe.
Por que sofrer com hipóteses, com o futuro?
Nem precisamos raciocinar a partir dos desfalques momentâneos ou da quarentena de convocações da Copa América. Em condições ideais, prosseguimos com peças habilitadas para a reposição.
Olhe, por exemplo, o quanto funcionou a difícil separação com Yuri Alberto, o artilheiro de 2021. Ninguém queria o distrato. Havia a sensação de que o auge do centroavante iria continuar, mas ele não valorizou seu passe nas temporadas seguintes. Hoje, em retrospectiva, a proposta do Zenit calhou de ser altamente rentável.
Mauricio é uma incógnita. Talvez tenha maior sucesso no plantel milionário do Palmeiras, com mais mobilidade no plano tático de Abel Ferreira. Ou desapareça entre tantos craques insubstituíveis do campeão brasileiro.
O que vai acontecer com o seu destino, de bom ou ruim, não deve pesar na decisão de negociá-lo. É a perspectiva profissional favorável dele, e também o período dele em que apresenta menos criatividade e definição no Inter. São ondas que se encontram.
Não diria que se abriu uma janela, porém se escancarou uma porta.
O Colorado teve a sinalização de R$ 40 milhões pelos direitos econômicos do atleta, do percentual de 50% do contrato. Um valor que ajudaria muito a alcançar a meta de R$ 135 milhões em negociações, como havia sido planejado o reforço no orçamento antes da enchente, e sem criar vácuos incorrigíveis. Temos a joia Gabriel Carvalho, de 16 anos, para ser lapidada.
Já acertamos a ocasião de transferência de Johnny para a Europa, aos 22 anos, numa aposta que dobrou de valor com o tempo. O desempenho do volante no Betis, com menos de um semestre no novo clube, já desperta o interesse de gigantes da Espanha, como Atlético de Madrid e Barcelona. Na época, recebemos 6 milhões de euros (cerca de R$ 32 milhões). Agora existe a possibilidade de, numa nova transação, ganharmos outros 6 milhões de euros.
Por mais que seja paixão, futebol é também razão e momento. Até mais, Mauricio. Não se esqueça de nosso carinho.