Ídolos dependem de muito mais do que oferecem em suas profissões - lhes é exigida uma vida de coerência.
É uma retidão que extrapola os holofotes. As sombras domésticas e caseiras importam. Contará preciosos pontos se a figura é um bom filho ou filha, um bom marido ou esposa, um bom pai ou mãe, um bom amigo ou amiga.
Sua aparição, portanto, é rara, submetida ao crivo da opinião pública e exame de suas qualidades morais ao longo da carreira.
Popularidade é um espelhamento da idealização, uma projeção virtuosa, a ponto de o fã querer ser como a pessoa é, transformando-a num exemplo a ser seguido no trato com os demais.
Há jogadores de futebol, por exemplo, que podem obter êxito nos gramados, só que não sobrevivem aos escândalos pessoais, como a falta de pagamento da pensão alimentícia aos filhos.
Estrelas no esporte ou na arte podem sucumbir nos bastidores. Mesmo sendo tricampeão mundial de Fórmula 1 como Ayrton Senna, Nelson Piquet jamais alcançou a mesma unanimidade. Pelo contrário, recaiu sobre ele o estigma de preconceituoso: foi condenado na Justiça por comentários racistas e homofóbicos contra o piloto Lewis Hamilton.
As redes sociais ampliaram a visibilidade da privacidade. Nada mais passa impune pelos registros dos seguidores. Os mínimos gestos são escrutinados.
Uma das “sensações” de Roland Garros, Thiago Wild, 23 anos, não conseguiu se classificar para as oitavas de final no sábado (3), porém ganhou atenção inesperada como uma das promessas do nosso tênis, pela carreira meteórica e pelo título juvenil do US Open em 2018. A despeito do seu talento, ele teve prints de suas conversas com a ex-mulher, com a qual viveu em união estável por um ano e oito meses, revelados pelo jornal O Globo.
Quem lê não tem como não ficar assustado. Não é somente terrorismo psicológico, é uma devastação de alma sem precedentes, num linguajar ofensivo, desprovido de educação, respeito, decência. Nem se acredita que ele está falando com a esposa, caracterizando-a costumeiramente de palavras de baixo calão.
Assume as infidelidades, manda fotos dela com chifres a amigos, envaidece-se da condição de machista e opressor, avisa que ninguém manda nele e é capaz dos mais absurdos controles como exigir que ela apague imagens postadas, as quais julga que são impróprias para quem está namorando, mas que, na verdade, não têm nada demais.
Ele age com violência podando e censurando, de modo ciumento e possessivo, e, ao mesmo tempo, faz questão de não dar satisfações de seus casos de traição.
Mergulhamos num filme de terror, como se as palavras trocadas no WhatsApp fossem câmeras ligadas.
O litígio é segredo de Justiça, ainda não existem pormenores das duas versões. O que já antevemos é que dificilmente será um ídolo como o sorridente, cabeludo, despojado, carinhoso e torcedor do Avaí Guga, ainda que acumule troféus dos torneios de Grand Slam e um dia ingresse no ranking do top 10 da ATP.
Carisma vai além de exercer com excelência o seu ofício. É uma competência em amar os outros.