Não existe nenhum técnico como Felipão.
É um avô com responsabilidades de pai. É um avô criando os seus netos da bola.
Ele vem destruindo os estereótipos da velhice. Apesar dos 73 anos, não fica encolhido na casamata com uma coberta por cima dos joelhos no inverno paranaense. Permanece à beira do campo gritando, orientando, incentivando os seus atletas. Continua sendo expulso pelo juiz, tamanha a sua explosão sanguínea. Há guris que não têm o mesmo preparo físico.
Felipão é fênix renascendo das cinzas, um acumulador de recordes. Nunca desiste de apostar a sua reputação por uma nova conquista. Vive desafiando o destino. Pode-se dizer qualquer coisa a respeito dele, menos que é acomodado, menos que se senta em cima dos seus títulos.
Não existe time grande ou pequeno para ele, o que existe é time motivado ou desorganizado.
Já era campeão do mundo pelo Brasil quando recebeu uma surra da Alemanha na semifinal de 2014. Caiu, levantou de novo, mais forte do que antes. Está agora na sua quarta final de Libertadores, comandando o Athletico-PR, combatendo supremacias do Sudeste e plantéis milionários.
O gaúcho de Passo Fundo é viciado em trabalhar. Desde a sua ubiquidade no início dos anos 70, quando abusou da quilometragem do seu fusca indo e voltando entre três cidades: dava aulas de educação física na Escola AJ Renner (na época Ginásio Industrial), em Montenegro, treinava no Caxias e estudava no Centro Universitário Metodista - IPA, em Porto Alegre.
Longas distâncias jamais foram desculpas para o seu aperfeiçoamento, para o seu apetite pelo infinito.
Não existe time grande ou pequeno para ele, o que existe é time motivado ou desorganizado. Não depende de contratações milionárias. Assim como obteve a tríplice coroa clássica (copa continental, campeonato e copa nacional) com os tradicionais Palmeiras e Grêmio, alcançou uma Copa do Brasil surpreendente para o Criciúma.
Talvez só perca em importância histórica para Zagallo, que teve uma carreira mais vitoriosa como jogador, detentor do recorde de títulos das Copas do Mundo FIFA (como atleta em 1958 e 1962, como treinador em 1970 e como coordenador técnico em 1994).
Ao lado dele, Felipão é o técnico da história do futebol a disputar três Copas do Mundo e conduzir sua seleção à semifinal em todas as suas participações.
Mesmo com retrospecto mano a mano com Zagallo, conta ainda com acréscimos em sua trajetória ao treinar o poderoso Chelsea na Premier League, e a seleção portuguesa, vice-campeã na Euro 2004 e quarto lugar na Copa do Mundo de 2006, na Alemanha.
É o único gaúcho que pode, um dia, virar nome de rua, ao mesmo tempo, em Portugal, Uzbequistão, Kuwait, China e em diversas capitais brasileiras, de Maceió a Curitiba.
Luiz Felipe Scolari é chamado de Felipão pelo gigantismo do seu esforço. Permanece com alma de zagueiro, chutando preconceitos para longe.
A glória não o domesticou, a derrota não o subjugou.
Não o vejo encerrando a carreira tão cedo. Descendente de italianos, praticante do vêneto brasileiro, ainda rosna e morde, porque sabe que “Can vècio no'l ghe sbaia a la luna".
A luz da lua é o seu refletor.