Álbuns de figurinhas fizeram a alegria da minha infância e da minha paternidade.
Tenho algumas preciosidades guardadas comigo, como o da Copa de 1982 completo, com cheiro de tutti frutti, somente com figurinhas de chiclete Ping Pong. Havia latas vazias de Nescau em que depositávamos as gomas rosas porque não aguentávamos mais mascar nada. Era o tempo de bater as repetidas no recreio. Arrebatei algumas figurinhas difíceis de ser encontradas, como a do Maradona, com a palma suada de minha mão.
Quando eu me tornei pai, eu voltei a colecionar, e muito mais ávido, com poder aquisitivo. Vivia viajando e trazendo pacotes não viciados de outras cidades. Eu e os filhos concluímos o álbum do pentacampeonato. Participava de pontos de trocas e chegava ao cúmulo do golpe baixo de comprar as que faltavam de cambistas.
Foram vários campeonatos brasileiros e mundiais até Vicente, o caçula, completar 16 anos. Depois ele se desinteressou e perdi o pretexto para manter o passatempo. Não podia seguir sozinho. Como marmanjo, enfrentaria o vexame de explicar para a esposa o desvio dos recursos domésticos. No fim do ano, terminaria pego pela malha fina da Receita Federal de casa.
Hoje fico com pena do orçamento dos pais com a Copa de 2022, que será realizada de 21 de novembro a 18 de dezembro no Catar. Sofrerão um baque em seu planejamento de gastos. Já vejo crianças birrentas e ranhentas chorando na frente das bancas de revistas, já profetizo gritos de chantagem e adultos arrastando braços e pernas de seus filhotes pela rua.
As vendas das figurinhas começarão no dia 15 de agosto pelo grupo editorial Panini. O pacote da edição anterior, da Rússia, custava 2 reais. Agora, dobrou de valor, com 100% de aumento: 4 reais para cinco cromos, oitenta centavos por cada craque. Uma pena que o entretenimento tão divertido estará restrito às classes sociais mais abastadas.
Colocando na ponta do lápis, para fechar o álbum, serão necessários 920 pacotes. Ou seja, a bagatela de R$ 3680,00. Se você tiver sorte, a situação pode melhorar com permutas intensivas entre os filhos na escola.
Não há nem a esperança para recuperar o investimento daqui a quarenta anos no Mercado Livre. Você nunca mais vai repor o que gastou. O álbum de 1982, realizado a grande custo, estragando os meus dentes com cáries, pode ser encontrado por apenas 100 reais.
Mas o que permanece é a subjetividade do afeto, que não existe como precificar. Não tem como não se emocionar com os seus pequenos indo e voltando com seus olhos grandes, incrédulos e extasiados, naquelas páginas e páginas pesadas preenchidas, com 670 estampas entre jogadores, bandeiras e estádios, coladas perfeitamente nos quadradinhos.
Você ensina a persistência, a arte de não desistir e de terminar uma tarefa.
Com tantas lembranças e relacionamentos pela metade durante a existência, isso não deixa de representar um alívio, uma pequena glória.
Um álbum completo traz uma sensação de completude, de inteireza, que nos motivará perante as crises de identidade que atravessaremos. Uma bagagem que se leva para dentro da nossa postura profissional, de ir até o fim, não importando as dificuldades.