Aos nove anos, minha mãe me recomendou:
- Use sempre gasolina aditivada.
Naquela época, pilotava apenas a minha coleção de miniaturas, mas guardei o conselho como um mandamento irrevogável. Representava uma ordem superior e moral.
Quando assumi o volante, jamais admitia a natureza de outro combustível. Pensar em pôr gasolina normal era como trair a minha mãe, adulterar a bomba de sua sabedoria.
Óbvio que eu descobri que seu conselho resultou da força noticiosa e datada de um momento, não era uma verdade absoluta, e que tampouco ela mesma colocava gasolina aditivada em seu carro.
Mas agora o seu pedido acabou de ser sumariamente extinto. Nem como piada tem validade.
Com o aumento da Petrobras de 5,18% na gasolina e de 14,25% no diesel, devo retornar às fantasias de minha coleção de miniaturas.
Desde sábado, o litro da gasolina subiu nas refinarias de R$ 3,86 para R$ 4,06. Com o diesel, o preço por litro teve a alta de R$ 4,91 para R$ 5,61. As tarifas que serão aplicadas nos postos, com a nova indexação, ainda são incertas.
Jamais direi a algum frentista para completar. É uma quimera inalcançável. Nem acredito que um dia já falei sem medo do futuro: “encha o tanque”.
O Brasil pode contar com um preço menor do que a média mundial (com régua acima pela Guerra da Ucrânia), mas temos peculiaridades infelizes que agigantam a influência da elevação dos preços em nossa rotina.
Somos reféns do petróleo para qualquer consumo ou deslocamento. Colocamos todos os ovos numa única cesta quebrada.
Em capitais como Porto Alegre, não existem linhas de metrô interligando os bairros. Nosso sistema ferroviário é objeto de exposição de museu. Dependemos do transporte público absolutamente endividado depois da pandemia. Motoristas de Uber e de táxis não têm como fazer mágica para não repassar o acréscimo e onerar clientes. Não há para onde correr. Inclusive para sair do país, as passagens ficarão mais caras (o que parecia impossível).
Teremos reflexos diretos na inflação e no custo de vida, porque 75% das mercadorias em nosso território têm seu escoamento feito pela malha rodoviária. Não há como comprar sequer um sabonete sem os caminhoneiros, que já ameaçam retomar as paralisações – o fantasma da greve de abastecimento de nove dias no governo Temer, em 2018, volta a nos assombrar.
Não me darei ao luxo de abobrinhas. Até a abobrinha, que gosto tanto refogada, já teve um aumento de 102% de 2021 a 2022, e certamente quebrará seu recorde.
Refogar é nostalgia. Estaremos afogados na remarcação de preços, sem capacidade de escolha. Para quem está se afogando, jacaré é tronco.