Será que Maurílio pressentiu sua despedida no enterro de Marília Mendonça?
Não, ninguém sabe do fim. Vive-se com a inconsciência da esperança. Um dia de cada vez, uma eternidade em cada dia.
Não há ensaio, não há teste de som, não há chance de afinar a voz e dizer as últimas palavras. A intuição nos sonega (e nos protege) da nossa hora aguda e derradeira.
Mas as duas dores, as duas lacunas juntas, próximas, são traumáticas. Provocam uma microfonia insuportável entre novembro e dezembro de 2021.
O destino colocou os cantores no mesmo palco da ausência. No mesmo silêncio. Um refrão do outro.
Ficaram como gêmeos do aceno, vizinhos do adeus por menos de dois meses, ambos tão jovens, ambos antes de completar três décadas de existência, com toda uma carreira pela frente.
Compositor, produtor e arranjador, formando ao lado de Luíza uma das duplas sertanejas de maior sucesso no país, o maranhense Maurílio partiu aos 28 anos, nesta quarta-feira (29), vítima de uma infecção no pulmão. Marília havia nos deixado com 26 anos, no início de novembro.
Maurílio tinha a paz da felicidade, uma mansidão na alegria. Era romântico por vocação, casado com Luana desde adolescente. Um menino grande, que nunca mudou com o sucesso, que nunca permitia a barba crescer demais e roubar o riso de canto a canto da sua infância, que mantinha a simplicidade familiar sempre com o cabelo partido e penteado.
Fecha-se o camarim do coração. E os que ficam tentam decifrar as letras das canções nos cadernos e desembaraçar as melodias fragmentadas.
A saudade não é somente de tudo o que fizeram, mas também de tudo o que não será mais ouvido.
Quando um cantor vai embora, são dois mortos. Além do artista, o seu violão é enterrado no estojo preto.