Uma das formas de conter a derrocada da vegetação nativa de um certo local é ampliar a quantidade de unidades de conservação — espaços com regras mais rígidas para uso, o que favorece a preservação. Porém, conforme publicação do Ministério do Meio Ambiente, o Pampa é o bioma que tem menor participação no Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC), “representando apenas 3% da área continental brasileira protegida por unidades de conservação”.
Reverenciado em prosa e verso pelos gaúchos, o Pampa ganhou atenção internacional durante a COP28 realizada em Dubai, nos Emirados Árabes. Ao declarar ter descoberto somente agora que o ambiente pampiano constitui um bioma, a exemplo da Amazônia ou do Cerrado, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva ilustrou o fato de que muitos brasileiros desconhecem que os campos sulistas têm alta relevância ecológica. A falta de uma maior conscientização sobre seu papel ambiental também explica por que é o ecossistema com o maior nível de ameaça em todo o país atualmente.
Em comparação, embora o pantanal tenha uma área levemente inferior à pampiana, responde por 4,6% das zonas de conservação no país — ou seja, um nível de proteção 50% maior em relação ao bioma sulista.
— Além de ser uma área muito pequena de conservação, a maior parte fica em zonas privadas, e não públicas, que são sempre melhores para fins de preservação, como a Área de Proteção Ambiental (APA) do Ibirapuitã, que é um caso de sucesso — afirma o biólogo do MapBiomas Eduardo Vélez.
A pouca abrangência das zonas de proteção nesse ambiente multiplica o grau de ameaça sobre a fauna e a flora. Há um índice destinado a medir o patamar de risco de cada bioma por meio da relação entre o tamanho das áreas legalmente protegidas em cada um deles e a quantidade de mata nativa perdida regularmente. O resultado dessa conta confirma a precariedade do ecossistema típico dos gaúchos.
O doutor em Ciências Naturais e professor da UFRGS Gerhard Overbeck cita um estudo publicado em 2015 (ainda válido) que apontou o Pampa como o ecossistema com o mais elevado grau de ameaça no país com base nesse indicador. O ecossistema aparece com uma cifra de 15,9 – muito acima do segundo colocado, a Mata Atlântica, com 6,9 (quanto mais elevado esse número, maior o risco).
Velez observa que muitas das unidades de conservação existentes estão localizadas mais próximas da faixa costeira, como o Taim ou a Lagoa do Peixe. A APA do Ibirapuitã, com 317 mil hectares localizados entre Livramento, Quaraí, Rosário e Alegrete, é uma exceção.
Além disso, há uma disputa legal em andamento no Estado que questiona a chamada “reserva legal”, dispositivo que prevê a proteção de pelo menos 20% das propriedades rurais. Uma ação ainda em análise na Justiça sustenta que essa obrigatoriedade não deveria ser exigida em locais em que for comprovada presença anterior de criação de gado — o que indicaria que o local já foi transformado pela ação humana, conclusão contestada por ambientalistas. Devido a essa contenda, o dispositivo ambiental nem sempre é respeitado.
— Faz falta uma política de apoio à pecuária sustentável, implementar de fato a reserva legal, criar corredores ecológicos e investir na criação de mais unidades de conservação longe da costa, no interior do Pampa — avalia o biólogo Eduardo Vélez, integrante da equipe do Pampa do MapBiomas e da empresa Geokarten.
Soluções para o Pampa
Equilíbrio entre atividades
Hoje o campo nativo recua, enquanto atividades como agricultura e silvicultura seguem ganhando terreno. Especialistas defendem um maior equilíbrio entre os diferentes usos do solo.
Estímulo à pecuária sustentável
A pecuária, com manejo adequado (evitando sobrecarga de animais em uma determinada área, por exemplo) é considerada uma atividade econômica adequada ao Pampa, com preservação do ambiente nativo.
Combate a espécies invasoras
A proliferação de espécies exóticas de rápida disseminação, como o capim-annoni, suprime a vegetação nativa e reduzem a biodiversidade. Há iniciativas capazes de conter o avanço dessas espécies, como um projeto desenvolvido por UFGRS, LaSalle e Emater/RS na Fronteira Oeste.
Aumento de unidades de conservação
Hoje, o Pampa é o bioma menos representado entre as áreas de preservação de todo o país. Uma forma de aumentar a proteção do ecossistema é estabelecer uma maior quantidade de unidades de conservação.
Legislação específica
O professor da UFRGS Gerhard sustenta que “até hoje, não existe legislação específica de proteção do bioma, diferente do que ocorre com a Mata Atlântica”.
— O Pampa tem uma baixíssima cobertura de unidades de conservação, tornando o mais vulnerável às perdas da vegetação nativa, e programas importantes como o Programa de Recuperação Ambiental (PRA), que deve tratar da restauração ecológica de áreas degradadas, não são implementadas — complementa o especialista.