A cheia dos rios no Rio Grande do Sul é um assunto de grande preocupação desde semana passada, quando a chuva forte atingiu algumas regiões do Estado, causando cheias e inundações. A previsão do tempo não é animadora, já que segundo especialistas a primavera - que inicia no próximo dia 23 - deve ser chuvosa. Com maior dificuldade de escoamento, as bacias hidrográficas deverão continuar exigindo atenção.
Os primeiros 13 dias de setembro foram marcados pela chuva. Algumas cidades, como Caçapava do Sul, na Campanha, e Passo Fundo, no Norte, registraram o dobro de precipitações do que era esperado para o mês inteiro. De acordo com o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), a média histórica de volume de chuva desses municípios no mês de transição entre o inverno e a primavera é de 176,6mm e 165,5mm, respectivamente. Até esta quarta-feira (13), Caçapava do Sul tinha registrado 401,4mm e, Passo Fundo, 396,8mm.
Desde o começo deste ano, os meteorologistas e climatologistas alertam para o início de atuação do El Niño, previsto para setembro, e o risco de altos volumes pluviométricos. A combinação entre a presença do fenômeno e o aumento na temperatura dos oceanos é o que explica as condições climáticas recentes.
— Esse efeito aumenta a chance de formação de ciclones extratropicais, traz volumes maiores de chuva e aumenta os períodos sem sol — explica Eliana Klering, professora da Faculdade de Meteorologia da Universidade Federal de Pelotas (UFPel).
O perfil climático de setembro, outubro e parte de novembro deve seguir esse padrão, já conhecido pelos gaúchos. A previsão é de dias consecutivos de chuva com alguns intervalos de tempo firme.
O cenário, por si só, já é de preocupação. A condição delicada dos rios no Rio Grande do Sul, porém, agrava ainda mais a situação. Segundo Pedro Camargo, hidrólogo da Sala de Situação do governo do Estado, a tendência é de que os níveis das bacias hidrográficas tenham variações significativas se a chuva persistir.
— A situação que temos agora é resultado de semana passada e da chuva dessa semana. Nós precisaríamos de uma semana inteira sem chuva, com dias de sol ou nublados, para que esse escoamento seguisse e os rios voltassem ao normal — afirma.
Rios em situação crítica
O Serviço Geológico do Brasil (CPRM), vinculado ao governo federal, está desde segunda-feira (11) com alertas ativos para todas as bacias hidrográficas localizadas no Rio Grande do Sul. Os hidrólogos categorizam os níveis de referência dos rios em três cotas. É considerado cota de atenção quando o rio já passou o nível seguro, ou seja, a altura normal. Cota de alerta, que segundo o CPRM é o caso das bacias do Rio Caí e do Rio Taquari, é quando o nível está alto e preocupante.
Já a cota de inundação, como o CPRM classificou a Bacia do Rio Uruguai, é quando o rio está tão alto que já atingiu a primeira edificação. Por exemplo, chegou na região do porto ou alcançou uma casa localizada nas proximidades da bacia. Segundo o monitoramento, a situação está mais crítica em Uruguaiana, Alegrete, Manoel Viana e Rosário do Sul. Em Itaqui, também na Fronteira Oeste, os níveis chegavam a 9m56cm nesta quarta-feira (14), quase sete metros a mais do que registrado no dia 3 de setembro.
— Os níveis do Rio Taquari, que está em cota de alerta, baixaram muito, mas ainda não voltaram ao limiar normal — garante Camargo. A cheia que abalou as cidades do Vale do Taquari na última semana já pode ser considerada uma das maiores da história desta bacia. Em 1941, ano da maior enchente, as águas atingiram a marca de 29m92cm, registrada em Lajeado. Essa régua manual (convencional), na cheia mais recente, marcou 29m45cm.
Qualquer acumulado preocupa
É difícil prever com exatidão como deverá ser o comportamento da chuva prevista para as próximas semanas no Estado. A professora Eliana acha difícil que o que aconteceu na última semana no Vale do Taquari, quando choveu o dobro do esperado para o mês inteiro em apenas quatro dias, se repita. Entender se a chuva é forte e de curta duração, ou fraca e constante, é fundamental para prever a situação futura dos rios.
— Muita chuva em pouco tempo vai ter respostas mais rápidas em bacias pequenas, como a do Rio Caí. Ou seja, vai encher com mais agilidade. Mas chuva que dura mais dias gera preocupação em bacias maiores. Na situação atual do Estado, os dois eventos são alarmantes — defende o hidrólogo Camargo.
A previsão para a próxima semana é de que algumas cidades do Estado registrem baixos acumulados por vários dias seguidos. Em Pelotas, na Região Sul, por exemplo, deve chover entre 10mm e 30mm por dia, podendo chegar a 80mm em uma semana. A quantidade de chuva esperada para a cidade no mês de setembro inteiro é de 128,7mm e, até esta quarta-feira, o município já registrava acumulados superiores a 290mm.
— Os sistemas de drenagem e escoamento da água desses rios estão comprometidos. Os solos estão encharcados e saturados, não conseguem absorver mais água. Não precisa de grandes acumulados de chuva para ter impactos significativos. Uma chuva fraca já pode ocasionar problemas de mobilidade urbana ou atingir populações vulneráveis de várias cidades — alerta Eliana.
Contatada pela GZH, a Defesa Civil do RS afirmou que está monitorando a situação dos rios e que trabalha em medidas para contornar a situação. O órgão não especificou se novas iniciativas foram implementadas desde a última semana.
*Produção: Yasmim Girardi