Dois geoparques do Rio Grande do Sul foram reconhecidos pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) na manhã desta quarta-feira (24), durante uma conferência em Paris, na França. Com as novas certificações, concedidas aos territórios que ficam em Caçapava do Sul, no sudeste gaúcho, e na Quarta Colônia, na Região Central, o Estado passou a ter o maior número de locais com a titulação no Brasil.
Outros três territórios brasileiros já eram classificados dessa forma pela Unesco: Caminhos dos Cânions do Sul, que envolve sete cidades de Santa Catarina e do Rio Grande do Sul, Seridó, no Rio Grande do Norte, e Araripe, no Ceará. Os dois primeiros foram reconhecidos em abril de 2022, enquanto o terceiro recebeu a certificação, em 2006, tornando-se o primeiro geoparque das Américas.
Esse reconhecimento indica a presença de espaços com diversas opções de turismo, que colaboram com o desenvolvimento dos municípios. Conforme a Unesco, os geoparques mundiais “são áreas geográficas unificadas, onde sítios e paisagens de relevância geológica internacional são administrados com base em um conceito holístico de proteção, educação e desenvolvimento sustentável”, combinando conservação com desenvolvimento sustentável e envolvendo as comunidades da região.
O secretário estadual de Turismo Vilson Covatti comenta que o reconhecimento da Unesco está sendo muito comemorado, mas destaca que o Rio Grande do Sul precisa desenvolver expertises para aproveitar o potencial dos geoparques, como turismo de aventura, de conhecimento, de história, de cultura e de natureza, além da infraestrutura na gastronomia:
— Ganhamos um presentão. Temos cinco geoparques no Brasil e três são no Rio Grande do Sul. Estamos antecipando essa questão da organização internacional e fazendo a nossa parte, porque eles também são exigentes.
A área do Geoparque Quarta Colônia abrange nove municípios gaúchos próximos a Santa Maria: Agudo, Dona Francisca, Faxinal do Soturno, Ivorá, Nova Palma, Pinhal Grande, Restinga Seca, São João do Polêsine e Silveira Martins. O projeto é uma iniciativa da Pró-Reitoria de Extensão da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) em parceria com o Consórcio Intermunicipal de Desenvolvimento Sustentável da Quarta Colônia (Condesus Quarta Colônia).
Avaliadores da Unesco visitaram o território da Região Central em outubro do ano passado. Na ocasião, foram apresentados os principais pontos que dizem respeito à paleontologia da Quarta Colônia, à questão cultural e ao patrimônio natural, como as paisagens, as cachoeiras, a mata atlântica e também a estrutura e a organização que já existe para o turismo no território.
Já em Caçapava do Sul, a visita ocorreu em novembro. Os avaliadores da Unesco passaram por pontos como o Forte Dom Pedro II, a Pedra do Segredo e os geossítios Guaritas e Minas do Camaquã.
O município da Região Sudeste é considerado a capital gaúcha da geodiversidade, com mais de 30 geossítios catalogados, tendo como principal característica a presença de rochas muito antigas em seu território. O projeto Geoparque Caçapava é realizado em cooperação entre a UFSM, a Universidade Federal do Pampa (Unipampa) e a prefeitura de Caçapava do Sul, além de contar com o apoio da comunidade, instituições e empresas locais.
Com o anúncio, os territórios já são considerados geoparques mundiais. Entretanto, as certificações serão oficialmente entregues em uma cerimônia durante a 10ª Conferência Internacional dos Geoparques Mundiais da Unesco, que ocorrerá em setembro, no Marrocos.
O trabalho começa agora, afirmam especialistas
A ideia do Geoparque Quarta Colônia surgiu em 2008, quando o Condesus contratou a Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais (CPRM) para fazer um inventário dos recursos da região. De acordo com a diretora do geoparque, Jaciele Sell, esse estudo foi a base do projeto, assumido como uma iniciativa institucional pela UFSM em 2018. Hoje, há mais de cem professores envolvidos.
Jaciele destaca que o reconhecimento é uma comprovação mundial de que a região comporta um patrimônio da humanidade, singular e único, que deve ser preservado por interesse global:
— É um prazer sem tamanho ver um trabalho de anos, que envolve várias pessoas, ser reconhecido mundialmente. Ao mesmo tempo, sabemos a responsabilidade que isso traz, mas estamos muito empenhados em garantir a manutenção do selo. O trabalho não termina, começa agora, mas é muita felicidade, alegria e gratidão por ter tanta gente acreditando nisso.
A diretora também aponta que o selo da Unesco acaba atraindo mais pessoas interessadas em conhecer o território e usufruir dos serviços e produtos locais. Relatos de outros geoparques indicam, segundo Jaciele, que o número de visitantes aumentou até quatro vezes depois da certificação.
Outra mudança está relacionada às possibilidades de investimentos, já que chama a atenção dos governos, que muitas vezes criam políticas públicas direcionadas a fomentar esses territórios, e também da iniciativa privada.
— Isso representa uma virada. Então, o lugar precisa se preparar para receber visitantes, o que envolve trabalho. Uma outra lógica de turismo passa a incorporar o dia a dia dessas comunidades — afirma.
Jaciele salienta que a certificação é reavaliada a cada quatro anos e que o território pode perder o selo, caso deixe de atender aos critérios estabelecidos pela Unesco. Por isso, a partir de agora, o geoparque precisa manter o trabalho no padrão que foi apresentado aos avaliadores, além de atender o que eles recomendaram no relatório feito no final do ano passado.
Entre as recomendações citadas pelos avaliadores, estão a melhoria da divulgação do território como um geoparque, a fim de obter mais visibilidade, e a ampliação dos produtos turísticos, que sejam atrativos aos visitantes, do networking com outros geoparques, e das medidas de conservação dos fósseis.
Já o projeto do Geoparque Caçapava surgiu há cerca de 10 anos, em função da geodiversidade presente na região, que atrai geólogos e estudantes de todo o Brasil, explica o diretor do campus de Caçapava do Sul da Unipampa, José Rojas. A iniciativa ganhou mais força em 2018, também impulsionada pela UFSM, que tinha como objetivo fortalecer o desenvolvimento regional.
Além das riquezas geológicas, o que fortalece ainda mais o projeto e foi levado em conta pelos avaliadores da Unesco, conforme Rojas, é o engajamento da comunidade com o geoparque:
— A cada visita aos geossítios, eles viam a paixão das pessoas daqui, que agora têm seus geoprodutos valorizados com o selo. É um trabalho longo, mas o que potencializa são as pessoas.
De acordo com o diretor, que acompanhou ao vivo a conferência da Unesco, o dia está sendo de muita alegria e emoção para todos os cidadãos de Caçapava do Sul. Rojas ressalta ainda que a Unipampa tem como missão apoiar o desenvolvimento da região e que o geoparque é uma das iniciativas que fazem a diferença para o território.
— A emoção é muito grande e as pessoas estão felizes. Claro que temos um grande trabalho a ser feito. Costumamos dizer que o trabalho começa agora, porque temos que defender o nosso selo — afirma.
Assim como o Geoparque Quarta Colônia, o Caçapava terá que trabalhar a partir do relatório de melhorias elaborado pelos avaliadores. Entre os aspectos apontados, estão os acessos aos geossítios, a oferta de sinalizações em outros idiomas para receber os turistas e a construção de um Centro Interpretativo do Geoparque, que faz parte do plano de desenvolvimento do território.
O que é um geoparque?
Geoparque é um território com limites definidos e com uma estratégia de desenvolvimento sustentável. É um local com relevância geológica internacional, incluindo também bens naturais e culturais, que é promovido com foco na conservação da natureza, na educação para a sustentabilidade e no desenvolvimento econômico por meio do turismo. Ampliando a conscientização sobre a importância destes locais, os geoparques fortalecem a identificação das pessoas com estes territórios e estimulam novas oportunidades de desenvolvimento econômico sustentável.
Além de reafirmar o compromisso da promoção do desenvolvimento local sustentável, os dossiês enviados são compostos de autoavaliações de elementos, como a geologia, a educação, a informação e o desenvolvimento local sustentável. A partir das informações indicadas nos relatórios que a Unesco, em uma visita presencial, avalia aspectos e características que justificam o título de geoparque.