Cerca de um ano após alerta de autoridades sobre a possibilidade de piranhas-vermelhas, também conhecidas como palometas (Serrasalmus maculatus), avançarem pelo Rio Grande do Sul, duas unidades da espécie foram encontradas por pescadores na Lagoa dos Patos, entre Arambaré e São Lourenço do Sul, no sul do Estado.
— Nós estávamos procurando por linguados quando percebemos que alguns peixes da rede tinham sido comidos. Pensamos que fosse algum outro animal. Até que deparamos com duas piranhas — explica o pescador Marcelo Almeida de Freitas, que registrou o momento em um vídeo.
De acordo com o diretor do Instituto de Meio Ambiente da Pontifícia Universidade Católica (PUCRS), Nelson Ferreira Fontoura, o peixe do vídeo trata-se mesmo de uma palometa, natural da Bacia do Rio Uruguai. E, segundo ele, essa aparição em pleno sul do Estado já era esperada.
— A partir do momento que ela (palometa) chega na Bacia do Rio Jacuí, não existe barreira natural que impeça que ela aumente a sua distribuição pela Lagoa dos Patos. E, com isso, seria apenas uma questão de tempo para se espalhar até o canal São Gonçalo, em Pelotas — afirma o professor.
Para chegar até São Lourenço do Sul, a espécie passou por correntes da Bacia do rio Jacuí para a Bacia do Guaíba. Segundo o professor, essa distribuição acontece de forma gradativa.
A explicação é que, durante o verão, a espécie não passaria pelo estuário da Lagoa dos Patos pelo índice de salinilidade, que é quando a água do mar se mistura com a da lagoa e afasta peixes de água doce, como as piranhas. Porém, ao longo do inverno, a água salgada fica mais restrita ao sul do estuário. Com isso, em momentos de maior vazão da Lagoa dos Patos, haveria presença de água doce suficiente para facilitar o deslocamento da palometa até o canal do Rio São Gonçalo, por exemplo.
— Uma espécie nova apresenta um risco para a comunidade que já estava instalada em um determinado ambiente, já que há um equilíbrio estabelecido. A partir do momento que se coloca um elemento novo, esse equilíbrio se desfaz. Algumas espécies podem diminuir a sua população, outras podem aumentar ou até mesmo desaparecer. No entanto, ainda não sabemos dizer exatamente qual desses fenômenos deve acontecer neste caso — observa o professor.
Além disso, outra preocupação das autoridades está no ponto de vista econômico, já que a piranha tem a vida "facilitada" pela pesca artesanal quando encontra peixes presos em redes. Ao comer uma parte desses peixes, há um prejuízo aos pescadores, que perdem uma parcela da pesca, e também obriga uma revisão mais contínua do material.
No final de 2021, autoridades ambientais já alertavam para a possibilidade do avanço das palometas à Lagoa dos Patos e ao Rio do Sinos. Já em março deste ano, houve aparição da espécie na prainha de Paquetá, em Canoas. Nesse caso, os peixes estavam maiores que os exemplares mapeados em outros rios do RS.
A reportagem de GZH contatou o Ibama, que garante que junto da Secretaria Estadual do Meio Ambiente (Sema-RS) e da Fundação Estadual de Proteção Ambiental Henrique Luis Roessler (Fepam), os trabalhos continuam para evitar que os animais alcancem as lagoas do Litoral Norte. Os órgãos ambientais também atuam para identificar possíveis pontos de passagem entre bacias dos rios Ibicuí e Santa Maria em direção ao Vacacaí, que, segundo o Ibama, pode ser a principal rota desses animais.
"O Ibama, juntamente com a Sema e Fepam/RS, vem monitorando o avanço da invasão biológica pelas "palometas" ou "piranhas" da espécie Serrasalmus maculatus nas bacias hidrográficas do Jacuí, Guaíba e Sistema Lagoa dos Patos desde março de 2021, quando iniciaram os relatos de aparecimento desse animal, principalmente na região de Cachoeira do Sul e Rio Pardo, no Rio Jacuí. Desde então, a expectativa tanto dos órgãos de meio ambiente como dos pesquisadores de diversas universidades era de que a chegada ao rio Guaíba e Lagoa dos Patos era uma questão de tempo", disse em nota.