
Autoridades ambientais do Rio Grande do Sul estão atentas ao avanço da piranha-vermelha, também chamada de palometa (Serrasalmus maculatus), para as bacias dos rios Jacuí, Guaíba, dos Sinos e até mesmo à Lagoa dos Patos. A localização mais recente da espécie ocorreu na Prainha do Paquetá, em Canoas, na região metropolitana de Porto Alegre. O peixe é carnívoro e de água doce.
As palometas são comuns na bacia do Rio Uruguai, em municípios como Uruguaiana e Rosário do Sul. No entanto, a partir de 2020, o peixe chegou a bacia do Rio Jacuí e segue em direção a outros pontos do Estado. A suspeita é de que a invasão tenha ocorrido por meio de lavouras de irrigação, especialmente de arroz.
As fontes ouvidas por GZH não relatam ataques a pessoas até o momento, mas estão preocupadas com o desequilíbrio do ecossistema e com prejuízo a pescadores que a presença dos peixes pode causar.
O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) é o responsável pelo monitoramento da situação no Estado. A autarquia federal tem uma lista de locais onde foi relatada a presença da piranha-vermelha. Os dados foram obtidos por meio de um questionário eletrônico disponibilizado pelo órgão.
Segundo o material, os peixes foram encontrados nos seguintes municípios: Santa Margarida do Sul (Rio Vacacaí), Restinga Seca (Rio Jacuí), Cachoeira do Sul (Rio Jacuí), Rio Pardo (Rio Jacuí - Porto Lambari), Vale Verde, General Câmara, Triunfo, São Jerônimo (Rio Jacuí), Estrela e Bom Retiro do Sul (Rio Taquari) e Canoas (Praia do Paquetá - Rio Jacuí/Rio dos Sinos).
— Os animais já foram vistos em praticamente toda a calha do baixo Jacuí. As palometas estão subindo os afluentes, mas isso não quer dizer que irão se estabelecer em todos esses locais — explica Maurício Vieira de Souza, analista ambiental do Ibama no RS.
De acordo com o profissional, os relatos chegaram ao Ibama a partir de 2020. No entanto, há poucas informações sobre como lidar com o problema até o momento.
— Não temos experiência com o assunto no Estado. Então, vamos levar a questão aos pescadores, para a academia, porque queremos entender de que forma eles estão se espalhando e como estão se reproduzindo. Os animais têm uma porta aberta entre dois sistemas que não se comunicavam e não temos ainda uma informação precisa sobre os motivos. É uma situação que vem para ficar — afirma.
Souza explica que o poder público e estudiosos no tema trocam experiências e informações desde a identificação do fato. Para avançar no assunto, eles devem organizar, no próximo mês, um seminário para abordar os impactos ecológicos e econômicos, as ações de monitoramento e controle, perspectivas de convivência e ações para mitigação da piranha-vermelha.
Quando questionado sobre ações para conter o avanço do animal, Souza alerta para o cuidado do não emprego de medidas precipitadas, feitas sem estudos de impacto, que podem gerar outros problemas ao ecossistema, além da presença da espécie invasora.
Prainha do Paquetá
Paulo Denilto Ribeiro, pescador e presidente da associação de pescadores da Prainha do Paquetá, em Canoas, relatou ter encontrado palometas há cerca de um mês, em uma época de seca. De acordo com ele, as espécies pescadas no local pesavam entre 250 e 300 gramas.
— O que nos causou estranheza foi que alguns pescadores pegaram grande quantidade das menores. Por isso, acho que talvez tenhamos problemas (com a presença da piranha-vermelha) no ano que vem. Até hoje, não tivemos prejuízos na pesca — disse.
A Secretaria do Meio Ambiente de Canoas confirmou que foram encontrados cinco exemplares, mas que o número não preocupa no momento. No entanto, a pasta diz monitorar a situação com as autoridades e a associação de pescadores.
As autoridades ambientais, até o momento, não receberam informações sobre o aparecimento de palometas em Porto Alegre. Procurada, a Secretaria do Meio Ambiente e Infraestrutura (Sema) não respondeu à reportagem.
Biólogo teme chegada do peixe a outras bacias
O biólogo Jackson Muller mantém contato com pescadores que informam o aparecimento da piranha-vermelha em diversas regiões do Estado. Ele relata diferenças no tipo de peixes encontrados nos últimos meses. Em 2021, pescadores costumavam pescar palometas com 120 gramas; neste ano, há registros de peixes com mais do dobro desse peso.
De acordo com Muller, isso ocorreu porque os animais encontraram ambiente favorável e alimento na bacia do Jacuí. Houve, por isso, a reprodução e consolidação da espécie em diversos locais. Se antes havia relatos de captura de indivíduos, hoje, com a permissão do uso de redes de pesca, são apanhados cardumes, explica o biólogo.
— É impressionante. Antes eram pequenos, agora são encontrados (peixes) de 300, 400 gramas. Eles farão um estrago até que o ambiente se estabilize. Mas não existe um mecanismo de controle, pois não há predador. Por isso, está em um processo de expansão, que continuará até que haja controle natural — afirma.
Como exemplo, ele cita uma barragem em Rio Pardo, município onde pescadores lidam com a espécie invasora. Além do prejuízo econômico, o problema pode desregular o sistema hídrico das regiões invadidas.
De acordo com biólogo, o peixe dourado é o predador natural da palometa, mas há poucos nas bacias do Estado. Por não haver controle natural, as piranhas-vermelhas se desenvolvem e se alimentam dos peixes menores.
Souza destaca a necessidade de união entre poder público, especialistas, população e pescadores para combater o problema. Isso porque, se o peixe ao chegar à Bacia do Guaíba, por exemplo, terá caminho acesso à Bacia da Lagoa dos Patos, no sul Estado.
— Precisamos buscar medidas para minimizar o problema, trabalhar com a captura, com o dourado. Agora é a hora de mobilização, das medidas preventivas. Não tenho dúvidas de que vamos ter que conviver com a palometa. Isso pode causar um impacto que desconhecemos — finaliza.