O Congresso aprovou um projeto de lei que passa da União para as prefeituras a competência para definir regras de proteção nas margens de rios. O texto, que altera o Código Florestal (que é federal), vai para a sanção do presidente.
Especialistas veem riscos ambientais e geológicos com a medida, além de prever questionamentos na Justiça. Já defensores dizem que a mudança dá mais autonomia aos municípios.
Conforme o Código Florestal, hoje, as margens de rios em áreas urbanas são consideradas Áreas de Proteção Permanente (APPs) e a vegetação ali deve ser mantida em faixas que variam de 30 metros a 500 metros, a depender da largura do rio. Em áreas como as margens do Rio Amazonas é comum a obrigatoriedade, por exemplo, de manter extensões de meio quilômetro.
O projeto aprovado, na prática, dá aos 5.568 municípios brasileiros o poder de estabelecer a faixa a ser preservada, após consulta aos conselhos municipais e estaduais de meio ambiente. O texto vetou emenda apresentada no Senado que estabelecia o mínimo de 15 metros a serem preservados.
Riscos
Entre as consequências da mudança apontadas por especialistas estão o assoreamento dos rios. Quanto menos vegetação nas margens dos cursos d'água, maior a chance de a terra nua ser carregada pela chuva para o leito do rio ou córrego. Outros riscos são enchentes mais constantes, resultado direto do assoreamento, e desastres ambientais como o deslizamento de terra.
A biodiversidade também pode ser afetada nos casos de preservação muito pequena das matas ciliares. Um dos efeitos da destruição das margens é a mortandade de peixes. Isso pode aumentar ainda o risco de doenças, como a leptospirose, transmitida pela urina do rato, em locais de saneamento precário. Até agora, era válido o entendimento estabelecido pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) de que o Código Florestal é que deve definir essas faixas de proteção.
O projeto é do deputado Rogério Peninha Mendonça (MDB-SC), que tem defendido a dificuldade de ter regra igual para diferentes municípios. O texto também prevê que construções já existentes em áreas que eram consideradas irregulares pela legislação ambiental em vigor, até o dia 28 de abril deste ano, podem ser mantidos. O mesmo vale para áreas consolidadas urbanas — cujo definição do que é fica a cargo dos municípios.
Constituição
Para Maurício Guetta, consultor jurídico do Instituto Socioambiental, o projeto ignora o artigo 225 da Constituição.
— Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado — diz. — Legislaram como se os rios conhecessem fronteiras entre os municípios — afirma.
Um dos problemas está em rios que passam por diferentes cidades. Se na área da nascente as margens não forem respeitadas e preservadas, o resultado será assoreamento e piora da qualidade da água e em qualquer outra região do curso d'água, sem importar se os outros municípios têm ou não leis mais restritivas. Para especialistas, há pressão da construção civil e interesses eleitorais de prefeitos e deputados para a aprovação do texto.
Fiscalização
Para o presidente da Confederação Nacional dos Municípios (CNM), Paulo Ziulkoski, o entendimento deve ser o oposto. Ele diz que a lei, se sancionada sem emendas, dará aos municípios poder previsto na Constituição.
— Todos cobram que os municípios precisam de autonomia, mas quando se dá ainda existe uma ideia errada de que eles não sabem o que fazer ou que há corrupção — afirma.
Ziulkoski diz que o projeto de lei pode dar margem à especulação imobiliária ou afetar o ambiente apenas se os municípios não forem orientados e fiscalizados. Segundo ele, a fiscalização ocorre em nível municipal também pela ação dos cidadãos e do Ministério Público.
— O pior é como está hoje, sem fiscalização nenhuma.