Uma transição justa para uma economia sem carvão no sul do Brasil foi tema de debate na 26ª Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas de 2021 (COP26) em Glasgow, Escócia, com participação do governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, e organizações ambientais. Na contramão global, o governo brasileiro anunciou neste ano um programa para substituir as usinas termelétricas a carvão mineral do sul do Brasil por outras com a mesma fonte, a mais poluidora entre todas, em um momento em que o mundo decretou o fim do carvão como gerador de energia para reduzir as emissões de gases efeito estufa (GEE).
No debate, o coordenador do portfólio de energia do Instituto Clima e Sociedade, Roberto Kishinami, explicou que uma transição justa para uma economia sem carvão diz respeito a prover condições de sobrevivência aos trabalhadores que antes dependiam das atividades econômicas ligadas ao carvão e tiveram de encerrá-las por força de lei. Ele pediu ao governador do Rio Grande do Sul que falasse sobre o planejamento de políticas públicas nesse sentido. Leite se limitou a dizer que "é favorável à busca de soluções", mas que essa discussão no âmbito público ainda é incipiente.
O debate aconteceu no espaço Brazil Climate Action Hub e contou ainda com a participação de Ricardo Baitelo, do Instituto de Energia e Meio Ambiente (Iema); Nicole Oliveira, do Instituto Internacional Arayara e Observatório do Carvão Mineral; e Lucie Pinson, do Reclaim Finance (TBC).
Em sua apresentação, Nicole Oliveira mostrou os prejuízos causados pela exploração do carvão, como os danos sistêmicos ao meio ambiente, ao clima e à saúde pelas atividades de mineração de carvão do Complexo Jorge Lacerda, o maior polo carbonífero de Santa Catarina. Entre os danos citados estão a contaminação de solo, ar, água e animais da pecuária de corte com elementos tóxicos e a emissão de GEE.
Oliveira também abordou a intenção de governos locais de continuar produzindo energia com o carvão mineral de baixa qualidade já extraído desses complexos. O custo acumulado desses danos até o momento foi estimado em R$1,5 bilhão. O custo estimado com reparações e indenizações chegaria a R$ 6 bilhões, e o número de pessoas afetadas, a 1 milhão.
— Não vale a pena. A termelétrica foi vendida por R$ 300 milhões para gerar um passivo de R$ 6 bilhões. Quem arca com esse custo? Vai sobrar para a União e nós não queremos isso. O carvão é a energia do passado — ressalta Nicole Oliveira.
Já Ricardo Baitelo, do Iema, defendeu que a energia solar fotovoltaica ganhe mais espaço na matriz elétrica brasileira na substituição de fontes mais poluentes. Ele ressaltou que as hidrelétricas — base da geração de energia brasileira — estão esvaziando em função das mudanças climáticas, e que devem ser substituídas por energia renovável, e não por energia fóssil como vem ocorrendo.
Ele destacou a contratação de oiti megawatts em usinas térmicas a gás natural autorizadas na privatização da Eletrobras, que vão emitir até 20 milhões de toneladas de CO2 anuais entre 2026 e 2045.
— De forma cumulativa, isso equivale a mais de um ano de emissões do sistema de transportes inteiro, considerando passageiros e cargas — disse Baitelo durante o debate.