O relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC, sigla em inglês), órgão da Organização das Nações Unidas (ONU), divulgado nesta segunda-feira (9), traz questões sobre o impacto das mudanças climáticas na economia brasileira ao citar que o país produzirá menos alimentos se as metas do Acordo de Paris para a redução da emissão de gases poluentes não forem atingidas.
O sul do Brasil está incluído na região identificada como Sudeste da América do Sul (SES). Além do território brasileiro, ela inclui partes da Argentina, do Paraguai e do Uruguai. Para essa região, as previsões são de aumento da temperatura e da chuva em intensidade e frequência, causando inundações, se a temperatura global superar os 2° C.
— O que estamos vendo e temos avisado é o aumento de eventos extremos. No Rio Grande do Sul, temos um aumento geral da precipitação, mas não é homogênea. Ela está cada vez mais relacionada a eventos extremos, como ciclones extratropicais, complexos convectivos, frentes e tempestades, isso tudo dá um impacto muito grande porque o volume de água fica concentrado. Surgem as enchentes e enxurradas e isso tudo tem um custo — apontou o pró-reitor de pesquisa e fundador do Centro Polar e Climático da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Jefferson Simões, em entrevista à Rádio Gaúcha.
Segundo o professor Nelson Ferreira Fontoura, diretor do Instituto do Meio Ambiente (IMA) da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), o relatório apresentado pelo IPCC é uma confirmação do que se discute há alguns anos em modelos já apresentados.
Com o aumento da chuva na média anual e a maior temperatura, alerta Fontoura, veremos uma "tropicalização do Rio Grande do Sul". Hoje, o Estado tem clima considerado subtropical. Uma das consequências esperadas para um clima tropical é a maior prevalência de doenças como dengue, chikungunya, malária, febre amarela, e leishmaniose, que têm como vetores os mosquitos e hoje ocorrem com mais frequência em outras partes do Brasil.
Como os modelos apresentados não detalham quando os períodos de seca ou de precipitação passarão a ser mais severos, Fontoura acrescenta que é preciso estar preparado com estruturas públicas montadas, como a Defesa Civil ainda mais capacitada, e uma agricultura com cultivares adequados à região.
— A médio prazo, não digo mudar a cultura em sim, mas, com certeza, mudar o cultivar. Porque para uma mesma cultura existem sementes com potencialidades diferentes de tolerância à umidade, ao estresse hídrico ou à determinada praga. A vocação do Rio Grande do Sul de soja, milho e trigo, provavelmente, permanecerá. O arroz é muito mais sensível à questão das grandes inundações porque se pode perder toda a safra numa inundação severa, já que não há controle sobre extravasamento de rios — explica Fontoura.
Para o pró-reitor de pesquisa do Centro Polar e Climático da UFRGS, o ponto mais importante do relatório é que houve uma declaração clara: a mudança climática é generalizada, rápida, se intensificando no planeta e sem precedentes nos últimos 6,5 mil anos. E no caso do aquecimento atmosférico, a velocidade deste aumento é inédita, pelo menos, nos últimos 2 mil anos.
Simões acrescenta que o grande desafio agora é regionalizar os cenários apresentados pelo relatório.
— O Rio Grande do Sul está atrasado na questão, mesmo sendo uma sociedade que depende muito do agronegócio e da agropecuária. Temos consequências sérias e não estamos pensando estrategicamente para o Rio Grande do Sul, como se este assunto estivesse longe — acrescenta Simões.