Por Marcelo Dutra da Silva
Ecólogo, docente no Instituto de Oceanografia da Furg
A década de 1960 viveu experiências culturais incríveis, que revolucionaram o mundo – do nascimento do movimento hippie ao avanço do movimento estudantil – em que passaram a ser contestados o modelo de sociedade, a sexualidade, os costumes, a moral e a estética. A década também ficou marcada, ao final, pela percepção dos países ricos e industrializados quanto aos efeitos negativos de suas práticas e tecnologias, sobre os recursos e o meio ambiente.
Foi naquele cenário que Aurélio Peccei, top manager da Fiat e Olivetti e diretor da Italconsult, estimulado pela preocupação com os rumos da economia mundial, formou junto ao cientista escocês Alexander King o Clube de Roma, que reuniu na Accademia dei Lincei cerca de 20 líderes e personalidades da época, entre cientistas, industriais e políticos, para tratar das condições humanas para o futuro. Detectaram que a industrialização acelerada e o rápido crescimento demográfico levariam à escassez de alimentos e ao esgotamento dos recursos não renováveis e definiram que o grande problema estava na pressão da população mundial – na perspectiva do consumo e da ocupação do espaço.
Os participantes firmaram o compromisso de influenciar seus líderes e divulgaram, em 1972, o primeiro relatório do Clube de Roma, intitulado The Limits to Growth (“Os limites para o crescimento”). O texto apontou para a necessidade de respeitar a finitude dos recursos naturais, a modo de ser possível atingir a estabilidade econômica, a começar por frear o crescimento da população global e das atividades industrializadas, posição que rapidamente repercutiu no mundo e descontentou nações em desenvolvimento.
A tese do Crescimento Zero foi o primeiro ataque direto às teorias de crescimento econômico contínuo, propagadas pela visão expansionista do modelo econômico vigente, de acesso ilimitado aos recursos, que sem dúvida não é real. O relatório acendeu um debate caloroso que culminou, naquele mesmo ano, na conferência das Nações Unidas sobre o meio ambiente humano, a Stockholm Conference Eco, presidida pelo canadense Maurice Strong, em Estocolmo (Suécia).
Aberta no dia 5 de junho de 1972, foi a primeira conferência global sobre meio ambiente, e, por essa razão, comemoramos nessa data o Dia Internacional do Meio Ambiente (comemorado neste sábado). Um marco histórico, no debate de políticas voltadas ao gerenciamento ambiental, que novamente não contou com a adesão de todos, sobretudo dos países em desenvolvimento, inclusive o Brasil, que argumentou em nome do “crescimento a qualquer custo” que todos tinham direito de crescer e que não seria justo impedir o desenvolvimento dos países pobres.
Estocolmo reuniu 113 países e centenas de órgãos intergovernamentais e organizações não governamentais. Foi o primeiro grande alerta mundial para os perigos da degradação ambiental e ameaças à existência humana, algo que permaneceu aceso na ideia do desenvolvimento sustentável, lançado para o mundo no final da década de 1980 pela Comissão Brundtland, na publicação do relatório Nosso Futuro Comum, em consideração às gerações futuras, diante dos padrões elevados de produção e consumo.
O debate prosseguiu, evoluindo entre líderes das principais economias do mundo. Foi assim na Eco 92, na Rio+20 e nas diversas conferências do clima, inclusive na última, realizada em abril deste ano, no espírito do Acordo de Paris (2015), de cooperação entre os países para o desenvolvimento de uma “economia verde”, que na prática compreende uma proposição de política pública global de sustentabilidade ambiental.
Entretanto, o momento político do Brasil sugere um retrocesso de décadas. Voltamos a reivindicar nossa posição desenvolvimentista, em detrimento dos valores coletivos, para além das fronteiras nacionais. Nosso discurso não corresponde aos fatos, e vivemos, por aqui, o maior desmonte ambiental da história. São rotineiras e sucessivas as tentativas de alteração do regramento legal, na mais descarada intenção de “passar a boiada”, enquanto o desmatamento avança em meio a denúncias graves de comércio ilegal de madeira e possível participação de agentes públicos do governo.
Então, que este dia nos permita refletir sobre o nosso futuro, nossa sobrevivência e destino dos nossos filhos e netos.