Butte, Montana – Os primeiros indícios de ouro foram encontrados aqui, em 1864, em um riacho que ganhou o nome de Silver Bow. A descoberta se transformou em uma corrida de ouro desenfreada e, na década de 1860, inúmeros mineiros vieram para o córrego minúsculo em busca de suas riquezas.
Mas Butte nasceu do "útero de cobre", como escreveu um poeta, um veio muito mais rico. Depois que milhares de quilômetros de túneis foram dinamitados e perfurados, uma mina gigante foi escavada perto da cabeceira do riacho.
Ao longo dos anos, o córrego acabou ficando extremamente poluído: os resíduos da mineração foram despejados por fábricas poluentes que trabalhavam o minério, e o riacho teve seu curso alterado, além de ser aproveitado para satisfazer as demandas industriais; uma grande inundação, em 1908, levou toneladas de detritos por toda a extensão do córrego; o esgoto não tratado foi nele despejado até a década de 1960. A maior parta da vida que existia no córrego e ao longo de suas margens foi dizimada. Ao lado do Silver Bow, ossos do gado adquiriram uma tonalidade quase azul-esverdeada por causa dos altos níveis de cobre na água.
"Minha vida toda ouvi as pessoas avisarem para a gente não chegar perto do Silver Bow", contou Ellen Crain, diretora do Arquivo Público do Silver Bow em Butte, que narra a história da mineração local.
Porém, nas últimas duas décadas, grande parte do córrego foi meticulosamente reconstruída e restaurada, com a remoção de mais de um milhão de metros cúbicos de solo e rocha contaminados, a um custo de cerca de US$150 milhões.
Agora só pouco mais de três quilômetros do riacho não estão recuperados, incluindo um trecho que atravessa bairros desta cidade. No final de maio, depois de oito anos de sigilo em torno da limpeza, determinado pelo tribunal, muitos segredos foram revelados, e a Agência de Proteção Ambiental (EPA) divulgou seu plano para terminar a empreitada.
Uma parcela será desviada, desta vez com metas ecológicas, mas não há planos para restaurar o último quilômetro do Silver Bow, que corre por alguns bairros, o que gerou mais preocupação nesta cidade de 34 mil habitantes.
"Quero ver um Silver Bow limpo e restaurado serpenteando pela cidade. Não só queremos e precisamos de um córrego limpo, mas temos direito a ele", disse Fritz Daily, ex-deputado estadual que já trabalhou nas minas e que agora é chefe da Coalizão Nascente do Riacho Silver Bow.
A prospecção de minérios da chamada "colina mais rica da Terra" durou mais de um século. O cobre retirado daqui eletrificou a nação e forneceu material para a guerra, transformando a Anaconda Copper Co. em uma empresa poderosa de Montana, que fazia o que bem entendia.
Com o declínio da mineração, a companhia foi comprada pela Atlantic Richfield Co, que logo fechou a mina e se envolveu com o maior fundo de restauração ecológica dos Estados Unidos para lidar com as áreas tóxicas espalhadas pelo oeste de Montana. Entre elas está a mina de cobre gigante da Anaconda, o solo contaminado em torno da cidade de Butte, o cavernoso Fosso Berkeley, o rio Clark Fork de quase 200 quilômetros e a Represa Milltown, já removida, e o Silver Bow, um afluente desse rio.
Esse último já teve cerca de 40 quilômetros de extensão, cruzando a Divisão Continental, onde um pequeno fio de água se juntava aos riachos Yankee Doodle e Dixie, ambos sendo prospectados por mineiros de lados opostos na guerra civil. Cerca de 38 quilômetros do riacho ao sul de Butte, chegando até o ponto em que encontra o rio Clark Fork e o rio Columbia, foram restaurados.
Ele está muito mais limpo, mas nunca voltará a ser o que já foi. Nos melhores trechos, há cerca de 200 peixes pescáveis a cada 1,6 km, enquanto que em córregos semelhantes existem mil.
Porém, Butte ama seu Silver Bow recuperado. Em uma recente manhã cinzenta, os patos nadavam em uma área do córrego e os peixes pequenos eram visíveis. Os visitantes contam com trilhas para caminhadas e mesas de piquenique convidativas.
"Se há 20 anos alguém tivesse me dito que eu estaria pescando truta aqui, eu teria aceitado a aposta", disse Matt Vincent, ex-executivo do governo local e hoje consultor que trabalha na limpeza por duas décadas.
O plano anunciado recentemente visa a porção do Silver Bow que corre através do Cânion Slag, cujas paredes são feitas de resíduos de mineração, e que será desviado para um novo canal longe dos solos tóxicos. O plano também exige a limpeza de centenas de milhares de metros cúbicos de resíduos enterrados ao longo do curso do riacho.
Isso é um alívio para muitos que temiam que as negociações confidenciais entre o estado, a EPA e autoridades da Atlantic Richfield fossem deixar grandes quantidades de resíduos, ou de minério, no chão onde foram despejados pelas empresas. Muitos simplesmente não confiam na ciência que descobriu que deixá-los no lugar é uma alternativa segura. Na verdade, alguns resquícios enterrados liberavam uma água contaminada azulada no riacho recuperado. Eles serão desenterrados e levados nos próximos meses para uma propriedade de uma empresa mineradora daqui.
Mas ainda há a preocupação com o fato de que não existe um plano para recuperar o trecho final do córrego. Em um estado famoso por rios límpidos de trutas e pelo filme "Nada é Para Sempre", aqueles que defendem a limpeza do último pedaço a veem como uma forma de transformar Butte de um dos maiores locais do fundo de recuperação ecológica do país em algo mais lisonjeiro.
O trecho superior do Silver Bow, a leste do centro de Butte, tem um longo caminho a percorrer. Ele é uma sombra do que costumava ser, parecendo pouco mais que uma vala indistinta. Até dois anos atrás, era oficialmente chamado de "Metro Storm Drain" (ralo de tempestades da cidade), até que Daily e outros venceram uma batalha jurídica de quatro anos para que fosse renomeado Silver Bow, fazendo com que o estado fosse obrigado a restaurá-lo.
Qual seria o valor de um novo riacho? O preço para a limpeza está agora em torno de US$5 milhões para cada quilômetro do córrego.
Segundo Daily, um regato limpo e a remoção de rejeitos ajudaria Butte a reduzir seu estigma tóxico, e poderia simbolizar um novo começo. "Em eventos esportivos, os times da cidade são insultados com gritos de 'água suja', e é difícil recrutar profissionais de saúde para o maior complexo de recuperação ecológica do país. Ainda há muito a ser feito", afirmou.
Jon Sesso, coordenador do projeto Butte Silver Bow, disse que, embora não haja nenhum plano para um novo riacho, ele espera que isso ocorra em alguns anos, assim que os resíduos nas proximidades forem removidos. "É complicado. Não há nascente, não há água com que você possa contar. É tudo plano feito uma panqueca de leste a oeste pelo corredor, e não dá para mudar a topografia", por isso o riacho não pode fluir, e não há nascentes porque elas foram isoladas.
Mas existe uma fonte de água que talvez possa ser garantida: o Fosso Berkeley, orifício de quase dois quilômetros de diâmetro ao lado de Butte, de onde o cobre era extraído.
Desde que a Atlantic Richfield desligou as bombas que mantinham o fosso gigante seco para a mineração, em 1982, ele está sendo preenchido com uma mistura de águas subterrâneas. Em 2016, o poço chegou às manchetes quando milhares de gansos migratórios exaustos pousaram nele e morreram ao beber sua água ácida.
Quando uma nova usina do tratamento for concluída, aproximadamente 30 milhões de litros de água potável serão bombeados dos 230 bilhões de litros do poço. Espera-se que essa se torne a nova "nascente" da última milha do Silver Bow.
Pode dar certo. A água tóxica no fosso contaminará o lençol freático se continuar a enchê-lo, por isso deve ser retirada e tratada perpetuamente para evitar que chegue a esse ponto. A Atlantic Richfield criou um fundo para manter a usina de tratamento para sempre.
Daily disse que ele e outros vão continuar lutando para que o riacho passe através de Butte. "Estamos em uma encruzilhada. Se não houver a limpeza do córrego, dos resíduos e da água no fosso, esta comunidade vai fracassar econômica, ambiental e socialmente."
Por Jim Robbins