A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e os partidos PSDB e PSB recorreram ao Supremo Tribunal Federal (STF) para tentar revogar a medida provisória editada pelo presidente Jair Bolsonaro que obriga operadoras de telecomunicações a repassar dados ao IBGE durante a pandemia de coronavírus.
A MP 954/2020, publicada na semana passada, determina que as empresas entreguem dados como nome, endereço e telefone de clientes pessoas físicas e jurídicas para que o IBGE realize a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua, que mede o desemprego, de forma não presencial.
O PSDB alega que o ato é "típico dos Estados ditatoriais, ao despir o brasileiro de seus direitos fundamentais essenciais ao convívio em sociedade", segundo trecho da ADI impetrada na madrugada desta segunda-feira (20). "A suspensão de direitos fundamentais só é admitida em condição de Estado de Defesa ou de Sítio - o que não é o caso brasileiro, apesar da emergência trazida pela pandemia da covid-19", afirma o partido.
Já o PSB argumenta que há falhas como a imprecisão da finalidade do repasse de dados, o que o torna desproporcional, já que obriga a transmissão, por meio eletrônico, de dados de milhões de brasileiros. A ADI diz, também, que não há qualquer mecanismo de segurança para minimizar o risco de acesso e uso indevido previsto na MP.
A OAB vai na mesma direção, alegando que a MP de Bolsonaro viola o princípio da proporcionalidade e que o ato fere a privacidade e o sigilo de dados pessoais. A entidade solicitará ao Supremo que reconheça a existência, no Brasil, do direito que cada cidadão possui de decidir sobre autorizar como seus dados pessoais podem ser usados. "A Adin ainda exigirá um controle efetivo para que tais informações sejam transportadas e armazenadas em segurança."
A MP proíbe a Fundação IBGE de disponibilizar os dados a quaisquer empresas públicas ou privadas ou a órgãos ou entidades da administração pública. Também orienta que, superada a situação de emergência de saúde pública, as informações compartilhadas sejam eliminadas das bases de dados da Fundação IBGE.
A advogada Laura Shertel, professora da UNB e especialista em proteção de dados, diz que não há garantia de segurança de que esse repasse não "caia nas mãos de quem não deveria", a exemplo do que ocorreu em casos de violação de privacidade no mundo.
— Há risco quando dados são compartilhados de forma pouca segura, não explicada e de maneira tão rápida. A MP não estabelece procedimentos seguros — afirma.
Segundo ela, também é desproporcional exigir dados de todos os brasileiros quando a pesquisa é feita por amostragem. A especialista afirma que isso deveria estar explícito no texto da medida provisória.
O debate se tornou mais sensível diante de um contexto institucional em que o Executivo adiou a Autoridade Nacional de Proteção de Dados, que seria responsável por fiscalizar como o poder público protege dados pessoais. Há críticas, também, sobre o relatório de impacto ser feito somente após o repasse.