Na tentativa de emplacar um projeto de moeda digital global, o Facebook perdeu parceiros de peso que o ajudariam na tarefa de atenuar a reputação ainda duvidosa que marca as criptomoedas.
Além das críticas recorrentes de autoridades americanas e europeias, o consórcio da libra, moeda digital idealizada pelo Facebook, perdeu Visa, Mastercard, eBay, Stripe e Mercado Pago. As empresas abandonaram o plano na sexta-feira (11), sete dias depois de o Paypal deixar o grupo.
Com pressão de bancos e sem o apoio de empresas financeiras tradicionais, que temem desgaste no cenário de incerteza regulatória, o mercado intensificou os questionamentos sobre a iniciativa.
David Marcus, executivo do Facebook e um dos criadores da libra, agradeceu a participação de Visa e Mastercard em uma rede social e deu a entender que tem cartas na manga.
Depois de afirmar que respeita a decisão das ex-parceiras, sugeriu a seguidores que não lessem o destino da libra naquele acontecimento. "Claro que não são boas notícias no curto prazo, mas de certa forma são libertadoras", escreveu. "Você sabe que está pronto para algo quando tanta pressão aumenta."
Para o funcionamento técnico da libra, que se vende como um meio de pagamento global sem custos e uma possibilidade a desbancarizados, o consórcio não depende das companhias que saíram.
Do ponto de vista reputacional, o Facebook perde, e o ativo corre o risco de virar mais uma criptomoeda marginalizada, já que foram marcas clássicas do sistema financeiro que se retiraram.
Como o fundador da libra, alguns entusiastas ainda mantêm o otimismo. Entendem que a associação pode lucrar com a narrativa de que as bandeiras de cartão de crédito desertoras preferiram manter a alta cobrança de suas taxas.
– Todo mundo apanhou por causa do Facebook – diz Courtnay Guimarães, especialista em criptomoedas e cientista da BRQ Digital Services, empresa de digitalização de bancos. – A libra não perde. Friamente, o projeto não precisa dessas empresas. O problema é superar a imagem de "moeda do Facebook" – afirma.
Desde seu lançamento em junho, a proposta gera reações polarizadas. Um lado defende o conceito de um modelo de transação monetária acessível e prático. Outro mostra preocupação com o monopólio sobre dados pessoais e riscos à privacidade, tema que assombra o Facebook desde o episódio da Cambridge Analytica.
A libra ficará atrelada a um grupo de ativos para que tenha baixa flutuação. Poderá ser usada por desenvolvedores que queiram incluí-la em seus serviços ou aplicativos.
Fica sob a guarda de uma organização, com sede em Genebra, que supervisiona a tecnologia blockchain, a mesma que opera o bitcoin. Vinte e quatro marcas restam no consórcio, como Uber e Spotify.
Na semana passada, autoridades da União Europeia declararam que a criptomoeda, esperada para 2020, não pode operar sem regulação, sob o risco de diminuir a soberania monetária dos países.
França e Alemanha já afirmaram que irão proibi-la na Europa e defenderam uma criptomoeda pública. Na sexta, Portugal se uniu ao grupo ao dizer que ela só circula no país depois que possíveis riscos estiverem controlados.
Nos Estados Unidos, Jerome Powell, presidente do Fed (Federal Reserve, o banco central dos EUA), citou preocupações sobre lavagem de dinheiro, proteção dos consumidores e estabilidade financeira.
Mark Zuckerberg, presidente do Facebook, irá testemunhar em audiência no Comitê de Serviços Financeiros do Congresso americano no dia 23 de outubro para responder a perguntas sobre a moeda. Os parceiros restantes devem se reunir nesta segunda (13) para assinar o projeto.