O que parecia ser uma forma mais fácil de fazer a venda de um móvel, pela internet, transformou-se em problema para um fisioterapeuta de 48 anos, morador de Porto Alegre. Em dezembro do ano passado, por insistência de amigos, ele decidiu vender uma mesa que estava sobrando em casa. Foi assim que acabou se tornando vítima de um novo golpe. Estelionatários têm forjado compras online por meio do site Enjoei para enganar vendedores.
Com ajuda de um amigo, o fisioterapeuta fez um anúncio por meio do marketplace do Facebook. Depois disso, cinco pessoas entraram em contato relatando estarem interessadas na compra. A mesa foi anunciada pelo valor de R$ 700. Uma das interessadas, no entanto, pediu que o vendedor baixasse o aplicativo do Enjoei e criasse um anúncio por lá. A mulher insistiu, alegando que tinha créditos na plataforma e que gostaria de usar na compra.
Com o intuito de concretizar a venda, ele decidiu fazer o que foi pedido. Alguns comportamentos da suposta compradora começaram a levantar suspeita.
— Vi que cobravam uma taxa pela venda. Então, precisei aumentar o valor da mesa. Fui avisar a guria que estava falando comigo e ela disse “pode aumentar, não tem problema”. Depois, eu disse “às vezes a mesa tem cupim”. E ela “não te preocupa”. Fiquei desconfiado. Nada tinha problema. Mas fiz e mandei o link para ela — lembra o fisioterapeuta, que preferiu não ser identificado na reportagem.
A suposta compradora disse que o site entraria em contato com ele, para confirmar a compra. O fisioterapeuta recebeu um e-mail supostamente do Enjoei, no qual havia a mensagem: “Parabéns! Sua venda foi confirmada com sucesso”. A comunicação era falsa.
Para confirmar a venda foi solicitado um Pix de R$ 210 — este valor, supostamente, seria devolvido, somado ao da venda da mesa. Acreditando que realmente era uma taxa necessária, o fisioterapeuta fez a transação.
Nova tentativa
Mesmo depois disso, os golpistas seguiram insistindo, na tentativa de que o fisioterapeuta fizesse outro Pix. Um dos estelionatários entrou em contato numa ligação por WhatsApp se identificando como representante do Enjoei. Ele disse que era necessário realizar alguns procedimentos para que ele recebesse o pagamento pela mesa.
— Na conversa, ele pede para entrar no banco que tens registrado o Pix, manda um código por e-mail para copiar e colar no banco. Colei no banco e fui seguindo a orientação dele. Então, apareceu uma cobrança de R$ 6,9 mil. Questionei que era um valor a ser cobrado e ele respondeu que não, que era apenas para confirmar o registro do Pix para recebimento do valor do produto — recorda.
Foi neste momento que o vendedor se deu conta que havia sido enganado e não fez o pagamento de R$ 6,9 mil. Os golpistas ainda insistiram em novas ligações ao longo do dia, até ele bloquear os números. O fisioterapeuta registrou o caso na Polícia Civil, por meio da Delegacia Online.
— Era um dinheiro que não precisava ter perdido. Mas, pelo menos, não perdi os R$ 6,9 mil. Golpe sempre vai existir, o tempo inteiro, infelizmente — diz.
Nas redes sociais, é possível encontrar uma série de outros relatos neste mesmo sentido. Vítimas do Rio Grande do Sul e de outros Estados, como São Paulo, Paraná, Minas Gerais e Amazonas, que anunciaram a venda de móveis, eletrodomésticos e outros itens usados pelo site e foram alvo do mesmo tipo de golpe.
Uma moradora de Porto Alegre relatou ter colocado uma cafeteira à venda pelo mesmo aplicativo. No entanto, desconfiou após um pedido de pagamento antes de receber o valor da compra. A mulher não fez o Pix ao perceber que os e-mails não eram os oficiais da plataforma. Os casos são investigados pela Polícia Civil.
O que diz o Enjoei
Zero Hora entrou em contato com a plataforma, que enviou nota na qual informa que o “Enjoei é um marketplace que conecta compradores e vendedores e oferece soluções de pagamento e logística para que as transações ocorram de forma segura. Por esta razão, a plataforma reforça de forma preventiva e por meio de todos os seus canais que toda compra ou venda deve ser conduzida do início ao fim dentro do próprio site ou aplicativo, a fim de garantir a proteção dos usuários. Os anúncios também contam com um botão de denúncias, que pode ser utilizado nos casos de suspeita de tentativa de fraude ou mal uso da plataforma”.
O Enjoei também divulgou algumas dicas para se proteger de usuários mal-intencionados:
- Não devem ser realizados pagamentos fora da plataforma; o pagamento é único e feito dentro do site ou aplicativo
- Pagamentos por Pix também são realizados através da plataforma, sem nenhum tipo de cobrança ou envio de dados para depósito
- O vendedor só recebe o valor da transação após a confirmação do recebimento do produto pelo comprador
- Todas as taxas já estão inclusas no valor dos produtos, portanto a plataforma não cobra taxas extras ou relacionadas à liberação de compra ou venda
Outros golpes comuns
As trapaças pela internet ainda estão entre as mais cometidas pelos criminosos, que tentam obter vantagem fácil sobre as vítimas. Por meio das redes sociais, de aplicativos de mensagens e sites falsos, os bandidos conseguem altos valores sem a necessidade de se deslocar.
É possível fazer vítimas em série, independentemente de onde elas estejam. Esses são alguns dos fatores considerados pelas polícias como mais desafiadores para identificar os responsáveis.
Outras ações bastante comuns, segundo o Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic), são o golpe dos nudes, estratagemas envolvendo falsos investimentos, pedidos de Pix se passando por parentes e hackeamento de perfis nas redes sociais para usar a conta para falsas vendas de produtos ou pedir dinheiro a pessoas próximas.
Dados
Em 2024, foram registrados 70.010 casos de estelionato no Rio Grande do Sul, ou seja, uma média de 191 registros por dia. O número, apesar de alto, é menor do que o de 2023, quando foram comunicados à Polícia Civil 89.153 casos de golpe no Estado.
Dicas para se proteger
- Não acredite em lucro fácil ou vantagens que pareçam muito atrativas. Essa é a principal estratégia dos golpistas para atrair vítimas
- Não acredite em desconhecidos que lhe abordam na rua ou por telefone. Não acesse links na internet dos quais não tenha segurança. Desconfie
- Converse com familiares, amigos ou mesmo gerente de banco se tiver desconfiança. Estelionatários tentam criar meios de impedir que a vítima busque orientação, como mantê-la ao telefone, para que não seja alertada
- Tome cuidado ao imprimir segunda via de boleto em sites e ao fazer compras online. Golpistas podem criar sites falsos
- Quando fizer uma compra online, guarde num arquivo no computador o link da compra. Pode ser útil para a investigação, em caso de golpe
- Não faça depósitos bancários e nem recargas de celulares para quem não conhece
- No caso dos leilões, verifique se os leiloeiros estão cadastrados junto ao Judiciário. As contas para depósito em leilões oficiais não são de pessoa física ou jurídica e, sim, judicial
- No WhatsApp, habilite a verificação em duas etapas e não forneça esse tipo de código por telefone. O mesmo cuidado vale para outros aplicativos — de compras e bancos — que tenham o recurso de verificação em duas etapas
- Em aluguéis de imóveis, desconfie de preços abaixo do mercado, se o dono exigir adiantamento e tiver pressa para que o depósito seja feito, ou mesmo se o proprietário não aceitar atender a ligações ou se recusar a receber visita do locatário para conferir a casa
- Se receber contato por telefonema ou mensagem de familiar pedindo ajuda, certifique-se de que é real. Telefone para a pessoa antes de qualquer transferência. Converse com outros parentes antes de fazer qualquer depósito
- Se estiver vendendo algo, não entregue o bem antes de ter certeza de que recebeu o valor do pagamento. Depósitos só são confirmados pelo banco após a conferência do envelope. Então, aguarde para enviar a mercadoria
- Se for vítima, registre o caso em uma delegacia da Polícia Civil ou pela Delegacia Online. Tente repassar aos policiais o máximo de informações sobre os golpistas
- Fonte: Polícia Civil-RS