São Paulo, 17h15min de quinta-feira (5). O cartão destrava a tranca eletrônica e a porta de um quarto do 15º andar de um hotel no centro da cidade é aberta com dificuldade pelo lado de fora por policiais. Atrás dela, está caída Maidê Mahl, 31 anos, atriz e modelo natural de Venâncio Aires, residente na capital paulista há cerca de sete anos.
A gaúcha ficou desaparecida por três dias até ser socorrida pelas forças de segurança de São Paulo, ferida e debilitada. Nesta sexta-feira (6), Maidê passou por cirurgia para aliviar a pressão de inchaços no crânio. Conforme o Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP, a condição de saúde dela é grave, embora estável. Um novo boletim será divulgado no final da tarde de sábado (7).
— Quando a encontramos, estava desacordada. A respiração estava fraca. Seu rosto exibia hematomas. As unhas postiças estavam quebradas. O dorso das mãos apresentava edemas. Não havia arma ou objeto contundente no local. Ninguém esteve no quarto, nem ela saiu, entre a segunda-feira (2) e o momento do resgate — descreveu a diretora do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) do Estado de São Paulo, delegada Ivalda Aleixo, em entrevista exclusiva para Zero Hora.
O caso está envolto por dúvidas. A chefe do DHPP paulista espera que o mistério acerca do que ocorreu no intervalo de tempo em que a atriz esteve hospedada seja revelado pela própria Maidê. Provas periciais devem amparar as conclusões do inquérito.
Entre os exames solicitados estão análise da cena, laudo clínico e toxicológico, perícia telemática em dois celulares da atriz.
— A gente espera e torce pela recuperação desta jovem. Como não se trata de uma investigação de crime, é prudente esperarmos que ela própria possa contar o que lhe aconteceu. Neste momento, devemos reconhecer o trabalho dos agentes que conseguiram apurar a localização e encontrá-la ainda com vida — destaca Ivalda.
Como ocorreu a localização
Maidê deixou seu apartamento, situado no bairro Moema, por volta de 16h da segunda-feira. Entrou em um mercado e comprou três caixinhas de água de coco. Pagou em dinheiro. Dali, chamou transporte por App e dirigiu-se a um tabelionato no bairro da Liberdade. Contratou o reconhecimento de sua assinatura em um documento, cujo teor ainda é desconhecido, e rumou ao hotel, novamente em deslocamento por app, por volta de 16h40min.
Os investigadores obtiveram as primeiras pistas com trabalhadores do mercado. A partir daí, rastrearam os deslocamentos por meio de registros da companhia de transporte e por checagem de imagens de câmeras públicas e privadas.
O check-in no hotel ocorreu por volta de 17h30min. Maidê subiu, entrou no quarto e não interagiu com ninguém, nem mesmo para pedir serviços de alimentação, higienização ou arrumação do dormitório.
Quando a encontramos, estava desacordada. A respiração estava fraca. Seu rosto exibia hematomas. As unhas postiças estavam quebradas. O dorso das mãos apresentava edemas. Não havia arma ou objeto contundente no local. Ninguém esteve no quarto, nem ela saiu.
IVALDA ALEIXO
Diretora do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) do Estado de São Paulo
Ruídos na madrugada
Para concluir que não houve qualquer interatividade ou contato de Maidê com outra pessoa, os investigadores do DHPP consultaram as ocorrência de uso do cartão chave. O único registro foi o do ingresso no quarto. A câmera do corredor, segundo a polícia, tem vista direta para a porta. Nada aconteceu diante da vigilância ininterrupta do equipamento. O local não tinha digitais de outra pessoa.
Um elemento valioso para a investigação é o testemunho de um hóspede que ocupou quarto ao lado do de Maidê. Esta pessoa, cuja identidade é preservada, diz ter ouvido ruídos de móveis arrastados e batidas como de queda ou colisão. Tais ruídos podem estar ligados ao momento em que a atriz perdeu os sentidos e tombou, primeiro contra a parede, depois sobre a porta e finalmente no chão.
As falas da testemunha serão confrontadas com os resultados apontados pela perícia.
Origem dos ferimentos
A equipe médica que atendeu a atriz indicou que ela sofreu convulsões, provavelmente depois da queda e do choque da cabeça contra o piso. Tal circunstância explicaria os inchaços e hematomas verificados no dorso das mãos. As unhas postiças de gel, trincadas na queda, podem indicar que ela tentou se equilibrar, buscando apoio nas paredes e em móveis.
A grave lesão na face seria resultante do desmaio. A testemunha ouvida descreveu um último som, forte e seco, antes do silêncio se estabelecer no ambiente. Todas as lesões foram examinadas e serão descritas por laudo médico forense.
A sobrevivência de Maidê é atribuída às três caixinhas de água de coco que ela comprou antes de cumprir os compromissos e se hospedar. Foi o único alimento ingerido desde o período monitorado, entre a saída de casa e o resgate no hotel.
Tristeza profunda por perda
Maidê não desmarcou agendas de trabalho, manteve reservas relacionadas a uma viagem programada e não deu sinais de modificação em sua rotina, nem a familiares e nem a um ex-namorado com quem mantém boa relação, conforme apurado pela polícia.
Contudo, a atriz teria comentado sobre um sentimento de profunda tristeza pela perda de sua irmã, falecida por doença há cerca de três meses. Ela estaria passando por episódio de depressão e fazia uso de medicação para controle do humor. O medicamento estava no quarto, em quantidade que não desperta suspeita de superdosagem proposital e tinha receita médica regular.
As autoridades investigam a hipótese de uma dose excedente acidentalmente ingerida, o que poderia justificar a perda de coordenação, orientação e, por consequência, ter oportunizado um acidente. A hipótese de tentativa de suicídio não está descartada.
Suporte de familiares e amigos
Desde esta sexta-feira, amigos e familiares acompanham presencialmente, em São Paulo, os cuidados médicos para a recuperação da atriz. Entre eles, conforme a polícia, está a mãe da gaúcha, que viajou de Venâncio Aires na quinta para estar ao lado da filha.