Um grupo suspeito de falsificar documentos no Rio Grande do Sul para vender terrenos milionários em Santa Catarina é alvo de operação policial nesta quinta-feira (20). Dois irmãos são suspeitos de articularem o suposto golpe e de se passarem por advogado e corretora de imóveis. Outras três pessoas são investigadas por possível participação no esquema. As propriedades alvo da suposta ação criminosa chegam ao valor de R$ 150 milhões.
Batizada de Unmask (desmascarar em inglês), a operação é resultado de uma investigação que começou em meados de janeiro do ano passado. A ação é realizada de forma conjunta entre o Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic), o Departamento de Polícia do Interior e a Delegacia de Polícia de Eldorado do Sul. Mandados de busca, apreensão, sequestro de bens, bloqueio de contas e prisão preventiva são cumpridos nesta manhã em Porto Alegre, Viamão e Cachoeirinha. Até as 6h50min, cinco pessoas haviam sido presas.
— É o verdadeiro escritório do crime — diz Luciane Bertoletti, delegada da Polícia Civil de Eldorado do Sul, sobre material apreendido na residência onde os irmãos foram encontrados na área rural de Viamão. Sete cães da raça rottweiler estavam na propriedade no momento da chegada da polícia.
No local foram encontrados computador, celular, cofre, dinheiro em espécie, carimbos, documentos, como procurações e contratos, supostamente falsos.
— Eles (os irmãos) pegam o nome do real proprietário (do terreno), pegam atores, laranjas, para se passarem pelos verdadeiros donos. Os laranjas assinam uma procuração em nome dos verdadeiros proprietários, permitindo que os irmãos vendam o terreno. São só terrenos desembaraçados (sem impeditivos para venda), avaliados em R$ 150 milhões, R$ 50 milhões, à beira da praia, em Itapema (em Santa Catarina) — explica a delegada.
A dupla, que se disfarçava de advogado e corretora de imóveis, fornecia documentos falsos, no nome das vítimas, para que os laranjas pudessem, no tabelionato, se passar pelos donos originais dos bens imobiliários. Segundo a delegada, em muitos casos, os suspeitos não chegavam a entregar, de fato, o terreno aos compradores.
— Eles pegavam a arras, dinheiro dado como sinal para a compra, e na hora de passá-lo para o nome do comprador, eles (os suspeitos) sumiam. Uma das vítimas que deu a arras perdeu 10 mil euros e R$ 10 mil. Somado, dá em torno de R$ 70 mil, que foram dados nas mãos do suspeito — detalha.
Dessa forma, o golpe teria gerado diferentes vítimas: o comprador do terreno, que pagava a entrada, mas nem sempre recebia o terreno; e o dono original da propriedade, que, por vezes, nem sabia que o terreno estava sendo negociado por terceiros. A polícia estima que ao menos 10 pessoas foram lesadas, direta ou indiretamente, pelo golpe.
Uma das vítimas é um empresário de 76 anos. Há alguns anos, ele possui um conjunto de terrenos de alto valor em Itapema. Os supostos estelionatários teriam tentado vendê-los de maneira conjunta, como se fossem um lote, por um valor abaixo do mercado.
— Um dos corretores que já conhecia o meu cliente, achou estranho o valor, porque já teria sido ofertado um valor bem maior (para a compra do terreno) e não teria sido aceito. Então, ele (o corretor) resolveu entrar em contato com o meu cliente para ter certeza de que aquilo era verdade — relata o advogado Leonardo Brandão, que representa o empresário.
Ele ressalta que os danos causados pelo suposto golpe geraram ao idoso abalo psicológico, além de uma desconfiança quanto a sua credibilidade. De acordo com a polícia, a maioria dos proprietários dos terrenos alvo da ação dos suspeitos é de idosos e empresários.
Suspeito teria relações com outros esquemas criminosos
Conforme o delegado Max Otto Ritter, titular da 1ª Delegacia de Combate à Corrupção, do Deic, o suspeito que teria se passado por advogado é investigado pelo órgão há cerca de um ano e meio.
— Com o cumprimento dos mandados aqui em Viamão, localizamos, dentro da residência, onde estava os suspeitos, muitos documentos. O órgão também acredita que ele tenha participado de outros golpes, envolvendo, especialmente, falsificação de documentos, tais como procurações e escrituras. Nosso principal investigado, preso hoje aqui, conhecia pessoas de dentro do IPE Prev e possivelmente tenha relações com pessoas alvo da Operação Efêmero, deflagrada em março deste ano — afirma o delegado.
A investigação descobriu, à época, uma rede criminosa que usava dados de pensionistas do IPE Prev para possivelmente realizar compras e contratar empréstimos em nome das vítimas.
— Essa ação trata-se também do desencadeamento da segunda fase da operação policial que visa investigar não apenas a violação de sigilo funcional de dados dos sistemas do IPE Prev, mas também várias formas de crimes contra a fé pública, tais como falsificação de Carteiras Nacionais de Habilitação, de boletos bancários, de procurações e escrituras públicas de imóveis de alto valor — afirma o delegado.
Participaram também da operação equipes da Coordenadoria de Recursos Especiais (Core) da Polícia Civil do Rio Grande do Sul, do Rio de Janeiro e do Paraná.