No fim da tarde de 10 de abril, criminosos armados desembarcaram de um veículo, renderam as vítimas e atacaram a tiros duas reciclagens em sequência na mesma rua em Cidreira, no litoral gaúcho. Deixaram um saldo de terror, com cinco mortos e dois feridos — houve ainda uma pessoa ameaçada de morte. Uma das reciclagens foi incendiada pelos bandidos, que teriam partido da Região Metropolitana para cometer o crime.
Na manhã desta terça-feira (30), a Polícia Civil realiza a Operação Poseidon, como resposta à chacina ocorrida há três semanas. Entre os alvos estão os suspeitos de terem cometido os crimes em série, e de integrarem uma facção que estaria por trás das execuções. A ofensiva ocorre na Grande Porto Alegre e no Litoral Norte.
Foram cumpridas nesta manhã quatro prisões preventivas, sendo dois mandados em Porto Alegre e dois em Balneário Pinhal, a cerca de oito quilômetros de Cidreira. Durante a operação, três homens foram presos — duas em Porto Alegre e uma no Litoral — e um seguia foragido. Os policiais civis, com apoio da Brigada Militar, também cumpriram 16 mandados de busca e apreensão. A maior parte das buscas se dá na Capital, onde os policiais cumprem ordens judiciais em nove locais. Há ainda três mandados em Gravataí e um em Viamão. No Litoral, são dois de busca em Balneário Pinhal e um em Balneário Quintão. Nesses locais, foram apreendidos diversos celulares.
— No mínimo, cinco pessoas participaram deste crime. Eles pegaram um carro, vieram da Região Metropolitana e seguiram até Pinhal. Se hospedaram numa pousada e foram praticar o crime. Roubaram, inclusive, o veículo de uma das vítimas — afirma o delegado Antônio Carlos Ractz Júnior, responsável pela investigação.
Disputa do tráfico
A investigação que resulta na ofensiva desta terça-feira se iniciou logo após o crime. No mesmo dia da chacina, cerca de 70 policiais, entre agentes e delegados, do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) foram deslocados para Cidreira, para auxiliar no reforço das apurações. A região também recebeu reforços por parte da Brigada Militar.
Ao longo dos últimos 20 dias, uma equipe do DHPP, com 11 agentes e um delegado, permaneceu no Litoral para apoiar as investigações. A apuração apontou que o crime tem como motivação a disputa entre facções. A área de Cidreira na qual aconteceram as mortes seria de domínio de uma facção com berço no bairro Bom Jesus, na zona leste de Porto Alegre, que tem atuação em diversos locais do Estado. O ataque teria sido orquestrado por uma coalizão de grupos criminosos, que são rivais desta primeira.
Segundo o diretor do DHPP, delegado Mario Souza, a polícia detectou um envolvimento forte da Capital e Região Metropolitana no ataque. Em razão disso, a investigação prosseguirá também pela equipe da Capital.
— Eles, inclusive, atearam fogo num dos locais depois, para demonstrar a gravidade. Era um recado que o crime organizado queria dar. É uma disputa entre facções. O objetivo deles é atacar pontos rivais, matando e aterrorizando. Agora a intervenção da polícia vem para esclarecer o crime, prender os executores, vamos continuar as buscas pelos mandantes. Vamos seguir essa investigação atrás das lideranças e agindo para que não aconteçam novas agressões entre eles. Foi um crime fora da curva, o único homicídio múltiplo do ano no Estado — diz o delegado.
Reforço policial
Segundo o secretário de Segurança Pública do Estado, Sandro Caron, o reforço policial que foi instalado na região após a chacina será mantido no Litoral Norte, como forma de combate ao crime organizado e às disputas envolvendo o tráfico de drogas. A estratégia é semelhante à que foi adotada em outros locais, que tiveram picos de homicídios, como Caxias do Sul, na Serra, e Santa Maria, na Região Central.
— Se a razão dos homicídios no RS e no Brasil é o tráfico de drogas, temos que vir com ações e uma repressão fortíssima ao tráfico, e é isso que vamos fazer em Balneário Pinhal e em Cidreira. Vamos manter o reforço da Polícia Civil e da Brigada Militar. Seguimos nessa pressão para enfraquecer o tráfico. O maior erro que um criminoso pode cometer no RS é cometer homicídio. Fatos como esse que ocorreu no dia 10 de abril não têm mais espaço. A resposta vem com a prisão de quem praticou os homicídios e com reforço à repressão ao tráfico em todo o Litoral Norte. Vamos manter o tempo que for necessário, para que os fatos não se repitam — afirma o secretário.
O crime
Conforme o delegado Thiago Carrijo, titular da 6ª DHPP, dois a três criminosos partiram da Capital num Ford Ka branco, que havia sido alugado, em direção a Cidreira. No Litoral Norte, os bandidos teriam se encontrado com outros dois. Dali, seguiram até os locais onde aconteceram as mortes.
Os dois pontos atacados ficam na Rua 22, no bairro Parque dos Pinos. Dentro do primeiro, foram encontrados os corpos de Gian Cavalheiro Brisola, 19 anos, e Luiz Alberto Xavier, 68, e Edison Moura Espíndola, 61. O imóvel foi incendiado pelos criminosos - ainda não se sabe se eles já foram ao local determinados a atear fogo ou não. Os bandidos ainda roubaram um Fiat Uno, que pertencia a uma das vítimas sobreviventes neste primeiro local.
— Dali, eles se deslocam nos dois carros a uma reciclagem a cem metros do primeiro fato e executam mais duas pessoas — explica Carrijo.
Neste ponto próximo, na mesma rua, foram assassinados a tiros Luiz Cláudio Canabarro Santos, 44, e Florindo Pedroso, 66. Durante a chacina, duas pessoas ficaram feridas com disparos de arma de fogo — eles já receberam alta — e um teve uma arma apontada para a cabeça.
O veículo que foi levado durante o ataque foi localizado na tarde no dia seguinte. O carro foi encontrado pela Brigada Militar após populares estranharem a presença do veículo na beira da praia de Magistério, em Balneário Pinhal. Os bandidos tentaram atear fogo ao Uno, mas não conseguiram. O automóvel passou por perícia, em busca de vestígios dos criminosos.
Os presos nesta terça-feira, foram identificados como sendo o motorista do Ka, um carona, que estava com ele, que a polícia apura a participação nos crimes, e um que é executor, que foi preso no Litoral. O foragido também foi identificado como um dos executores. Os criminosos usaram pistolas de calibre 9 milímetros e .40.
Ainda que as disputas para o tráfico de drogas tenham sido a motivação para o crime, segundo a polícia, parte das vítimas só estava nos locais vendendo produtos recicláveis quando os criminosos chegaram, e acabaram sendo alvo por isso.
– Aqueles locais não eram pontos de tráfico. A questão é territorial – afirmou o delegado Ractz durante a coletiva nesta manhã.
A polícia ainda aguarda os laudos de necropsia para confirmar se todos foram executados a tiros antes de os bandidos atearem fogo na reciclagem. Dezenas de tiros foram disparados nos locais.