O Estado do Rio Grande do Sul foi condenado pela Justiça a pagar indenização para os irmãos da mulher morta em perseguição policial e para um amigo dela, um angolano, que foi baleado e preso injustamente por 12 dias. A decisão, em primeiro grau, foi publicada pela 4ª Vara Cível Especializada em Fazenda Pública da Comarca de Gravataí nesta sexta-feira (28).
A costureira Dorildes Laurindo, então com 56 anos, e o técnico em radiologia Gilberto Andrade de Casta Almeida, 28, retornavam de um passeio a Tramandaí, no Litoral Norte, em maio de 2020, com um homem que oferecia carona por aplicativo. O motorista estava foragido e passou a ser perseguido na RS-118. Segundo a investigação, os PMs atiraram 34 vezes contra o veículo e atingiram Gilberto e Dorildes com ao menos três tiros cada. Ela morreu no hospital cerca de duas semanas depois.
No caso de Dorildes, dois irmãos serão beneficiados com o mesmo valor cada. Já Gilberto vai receber indenização maior, pois além de ter sido baleado, ainda permaneceu preso injustamente, em condições descritas pela Justiça como degradantes. Os valores não serão informados a pedido dos indenizados, por questão de segurança.
"A Gilberto ainda foi injustamente atribuída tripla tentativa de homicídio justamente contra os algozes, em decorrência de depoimento falacioso por eles prestado quando da lavratura do auto de prisão em flagrante, permanecendo detidos no hospital, sem contato com familiares por dias" escreveu o juiz Régis Pedrosa Barros, da 4ª Vara Cível Especializada em Fazenda Pública da Comarca de Gravataí.
A advogada Ana Konrath, que representou as vítimas no processo de indenização, afirma que considerou baixo o valor que deverá ser pago para os irmãos de Dorildes e pretende recorrer da decisão.
No processo, o Estado contestou para não ser condenado e sustentou "a inexistência de conduta ilícita por parte dos policiais, que não teriam se excedido no episódio, argumentando que os brigadianos atuaram em estrita legalidade".
A Procuradoria-Geral do Estado (PGE), quando intimada da decisão, avaliará as medidas judiciais cabíveis
Relembra o caso
Natural de Luanda, na Angola, Gilberto Andrade morava em Anápolis, em Goiás, e veio ao Estado visitar Dorildes Laurindo após se conhecerem pela internet. Ele queria conhecer Gramado, para onde iria no dia seguinte ao que aconteceu a perseguição. Antes de ir à Serra, os dois decidiram visitar Tramandaí e usaram o aplicativo de caronas para realizar a viagem.
O que eles não sabiam é que o motorista com o qual pegaram carona estava foragido por tentativa de feminicídio. O carro em que estavam passou a ser perseguido por policiais militares, após o motorista cruzar um sinal vermelho.
Em Gravataí, o condutor parou o carro e fugiu a pé, deixando Dorildes e Gilberto para trás. Os policiais que perseguiam o carro dispararam diversas vezes, provocando os ferimentos que mataram a costureira e prenderam Gilberto em flagrante, supostamente por ter atirado contra os PMs.
A versão dos policiais militares foi confrontada pela Delegacia de Homicídios de Gravataí, que ouviu novamente os PMs. Neste segundo depoimento, eles modificaram a versão anterior. O delegado Eduardo Amaral entendeu que Gilberto não tinha como estar armado e pediu a soltura dele, que foi acatada pela Justiça.
O Ministério Público, na época, denunciou apenas o motorista do aplicativo por tentativa de homicídio contra os PMs. Com relação à atitude dos policiais, o promotor pediu que o processo seguisse na Justiça Militar. O processo está em discussão de competência no Superior Tribunal de Justiça (STJ).