No dia 26 de dezembro do ano passado, um empresário de 31 anos foi abordado por criminosos armados e usando toucas ninja quando caminhava por uma rua da área central de Canoas, na Região Metropolitana. Naquele momento, havia se iniciado sequestro de 27 horas com pedido de resgate de R$ 500 mil.
O refém acabou libertado pela polícia de um cativeiro no Vale do Sinos, quando dois sequestradores foram mortos em confronto. Durante a ação, ficou todo o tempo com as mãos amarradas e com um capuz na cabeça. Nesta quarta-feira (22), operação policial prendeu mais três integrantes da quadrilha. Outros três já haviam sido detidos durante a investigação. Há dois foragidos.
— Não estava nem aí para dinheiro, não sentia fome. A imagem do meu filho não saía da minha cabeça — conta o empresário, que não está sendo identificado por questões de segurança.
A vítima relembra que os criminosos saíram de um carro já gritando pelo seu nome. Além disso, diz que eles sabiam detalhes sobre sua empresa e sua família. Ele relembra que várias coisas passaram pela sua cabeça no período em que foi mantido refém. Pensou que iria morrer ali e até de que poderia se tratar de uma "pegadinha". Mas era a imagem do filho pequeno que a toda hora era lembrada por ele, desde o momento em que estava dentro do carro com uma arma apontada para cabeça indo em direção a Portão.
Cativeiro e pedido de resgate
Os sequestradores colocaram o empresário no banheiro de uma casa na área rural de Portão. Enquanto um grupo enviava as primeiras mensagens para a família pedindo transferência de dinheiro via Pix, outro obrigava a vítima a transferir valores de suas contas. O total chegou a R$ 65 mil.
— Eles diziam: "Se tu der todo o dinheiro que tens, vamos te soltar". A família toda, mas principalmente a imagem do meu filho vinha na cabeça, eu só pensava em fazer tudo o que eles queriam na esperança de que tudo daria certo. Eu me apegava ao que tinha porque a pressão psicológica era grande — relembra o empresário.
A esposa do refém diz que, ao receber a primeira mensagem dos sequestradores, foi direto a uma delegacia em Canoas. Lá, ela foi informada de que a Delegacia de Roubos do Departamento Especial de Investigações Criminais (Deic) iria cuidar do caso.
— Apesar da minha determinação, ao chegar na polícia, foi o primeiro momento em que me desestabilizei, chorei. Eu não sabia que existia uma equipe poilicial especializada em sequestro. O Deic me deixou muito tranquila, eu vi o quanto a polícia tem gente preparada para agir nesses casos — diz a esposa da vítima.
Além da esposa, os sequestradores também enviaram áudios do refém para a mãe dele, algumas já dia 27 de dezembro. Ele pedia que não envolvessem a polícia no caso:
Em áudio para a esposa da vítima, o refém pedia que o dinheiro fosse transferido rapidamente. "A chance de eu ficar vivo é fazer o Pix", dizia o refém na mensagem.
Tiros e liberdade
O empresário lembra que, a todo momento, os criminosos diziam que, se a polícia fosse acionada, ele iria morrer. Mas foi o contato feito desde o início — sem que a quadrilha soubesse — com a equipe do delegado João Paulo de Abreu que garantiu a identificação de um suspeito, a prisão dele e a descoberta do cativeiro em Portão.
A ação foi preparada e, por volta de 21h30min do dia 27 de dezembro, os policiais invadiram o local. Dois criminosos foram mortos durante tiroteio e nenhum policial ficou ferido. Um sequestrador foi preso e outro, que estava usando tornozeleira eletrônica, conseguiu fugir.
A vítima conta que, quando ouviu os gritos e os tiros, pensou que podia ser até um grupo rival. O refém diz que só quando estava dentro da viatura, com os agentes o chamando pelo nome, dando detalhes do contato com sua família, que entendeu que realmente havia sido libertado.
— O Deic chegou e por mais que me diziam que eu estava salvo, não parecia real, não parecia verdade. Eu estava vendado, amarrado. Só caiu a ficha mesmo quando falaram os nomes dos meus familiares. Foi emocionante quando diziam: "Tu vai ver teu filho, tu vai ver teu filho". Parecia que sabiam no que eu mais estava pensando — relembra.
O reencontro com o filho
O empresário diz que, ao entrar na sede do Deic, viu a esposa chorando, o pai, a irmã e o cunhado. Depois de abraçar todos, conta que teve certeza de que estava livre. Ao chegar em casa, encontrou o filho de três anos seguro no seu quarto, dormindo. Foi no dia seguinte o tão esperado reencontro:
— Ele é novinho, não fala tanto ainda, mas me chamava: "Papai, papai, deita no meu colo". Deitei no colo dele e ele começou a fazer carinho na minha cabeça. Nesse dia, eu tinha meu filho perto da minha cabeça, no dia anterior, eram criminosos. Parece que meu filho sabia o que eu estava precisando, isso fez com que passasse qualquer trauma que eu pudesse ter. Tive uma segunda chance para viver.
Operação policial
Na manhã desta quarta-feira (22), cerca de 60 agentes do Deic cumpriram seis mandados de prisão preventiva e outros 14 de busca. Três suspeitos foram detidos e um quarto, já no sistema prisional, teve mandado de prisão cumprido contra ele. A ação ocorreu nos bairros Arroio da Manteiga, Campina, Scharlau, Feitoria e Duque de Caxias em São Leopoldo.
Dois suspeitos, um que usava tornozeleira e havia fugido da polícia quando o cativeiro foi descoberto, seguem foragidos. A investigação continua.