Três anos depois, o desaparecimento Gabrielly Schneider em Santa Catarina segue um mistério para a família da adolescente, que vive na Lomba do Pinheiro, em Porto Alegre. Na época com 17 anos, a estudante sumiu em 30 de maio de 2019, três dias depois de sair da casa do namorado, em Palhoça, na Grande Florianópolis. Apesar do tempo que passou, a mãe da adolescente, Vânia do Nascimento Schneider, 36, conta que a angústia e a dor seguem presentes no dia a dia da família.
Segundo a diarista, nas últimas mensagens enviadas, Gabrielly pedia socorro. Vânia acredita que o caso se trate de feminicídio, que teria sido cometido pelo ex-namorado da adolescente e um amigo dele. A Polícia Civil investiga o caso seguindo a mesma linha, desde 2019.
— Ela me mandou mensagens de madrugada, áudios pedindo socorro. Mas não disse o que estava acontecendo. Eu só vi depois, quando era tarde demais. Eu sei que fizeram algo com ela. Eu só queria encontrar o corpo dela, dar um enterro digno para minha filha. A gente segue sem nenhuma resposta — lamenta Vânia.
Natural de Porto Alegre, Gabrielly se mudou com a família para Garopaba em 2017. Lá, conheceu o companheiro, de 23 anos, com quem passou a morar junto. Quando a mãe da adolescente retornou a Porto Alegre, cerca de um ano depois, a estudante decidiu ficar em Santa Catarina.
Poucos dias depois, Vânia conta que buscou a filha e a trouxe para o Rio Grande do Sul, em razão de brigas da adolescente com o namorado. No entanto, Gabrielly fugiu para o Estado catarinense novamente, para ficar com o companheiro. Os dois alugaram uma casa em Palhoça, perto da família dele. A diarista afirma que a filha sempre mantinha contato e que as duas eram próximas.
Conforme Vânia, em 27 de maio de 2019, a adolescente saiu de casa a pedido do companheiro e se abrigou no apartamento de um amigo do namorado. Três dias depois, ela saiu do local e nunca mais foi vista.
— Ela me disse que o ex-namorado estava ameaçando ela, que não queria que ela ficasse ali. Eu estava para ir lá trazer ela de volta, mas só cheguei no dia seguinte. No dia 30 ela sumiu, nunca mais foi vista.
A mãe conta que foi a Santa Catarina ao menos oito vezes atrás da filha no primeiro ano de desaparecimento. Ela afirma que rodava pela cidade conversando com moradores e espalhando cartazes, mas que não obteve nenhuma informação:
— Em uma das vezes, eu fiquei sete dias lá. Fui de casa em casa, de bar em bar, no posto de saúde em que ele fazia exames. Perguntei para morador de rua, taxistas, para todo mundo que eu via. Ninguém sabia de nada. Eu parei de ir porque minha mãe disse que eu estava ficando doente. Também fiquei com medo de algo acontecer comigo, igual fizeram com ela — afirma.
Vânia conta que a filha trabalhava como manicure a domicílio e estudava no supletivo à noite. O plano da adolescente era seguir na área da beleza: ela planejava fazer um curso profissionalizante assim que completasse 18 anos.
— Ela estava tão feliz porque estava tirando notas boas no supletivo. Dizia que queria terminar os estudos e arrumar um bom emprego, adorava essa área de salão, gostava de se arrumar. Era uma menina meiga, gostava de estar com a família, adorava comemorar os aniversários. Tenho outra filha de nove anos, que é uma cópia da Gabi, e elas eram muito grudadas.
Abalo emocional
Os três anos de busca por respostas deixaram reflexos na saúde da diarista. Vânia afirma que, muitas vezes, não tem forças para sair de casa. Conta que não consegue trabalhar, pois começa a ter crises de ansiedade. A falta de Gabrielly também é sentida pela irmã mais nova e por demais familiares.
— No ano passado eu só consegui trabalhar dois meses. Se saio de casa, começa a me dar vontade de chorar, de dormir, me dá um desespero. Me sinto em depressão, preciso tomar remédios para passar o dia e para dormir à noite. Às vezes só tenho força por causa da minha pequena. Elas eram agarradas, muito juntas. Minha filha menor as vezes chora à noite, diz que tem medo de sumir também. É muito difícil.
A diarista afirma que solicitou encaminhamento a um psicólogo para ela e para a filha em um posto de saúde do bairro, e aguarda ser chamada.
Investigação
Procurada pela reportagem, a Polícia Civil de Santa Catarina informou apenas que "no momento, em razão do sigilo necessário para os trabalhos", a instituição não irá se manifestar sobre o caso. O inquérito está sob responsabilidade da delegada Daiana Luz, da Delegacia de Proteção à Criança, ao Adolescente, à Mulher e ao Idoso de Palhoça.
O caso, inicialmente registrado como desaparecimento, passou a ser investigado como feminicídio.
Quando o sumiço completou um ano, em 2020, a delegada conversou com a reportagem de GZH e afirmou que a polícia trabalhava com a hipótese de que Gabrielly tenha sido morta. O ex-namorado e o amigo dele — que chegou a ser preso temporariamente para interrogatório — eram os principais suspeitos pelo desaparecimento, disse a delegada na ocasião.
Ainda na oportunidade, Daiana afirmou que o trabalho da polícia foi dificultado. Ela relata que o primeiro registro foi por desaparecimento e que, um mês depois, a família informou sobre a possibilidade de feminicídio, revelando que Gabrielly sofria ameaças.
Após o desaparecimento, a casa do amigo do ex-namorado, onde Gabrielly estaria morando, passou por perícia, mas não foram encontrados vestígios de sangue.
Contraponto
O escritório Gustavo Ortega Sociedade de Advogados, responsável pela defesa dos dois homens, encaminhou nota a respeito do caso. Confira:
"A defesa técnica dos investigados, liderada pelo advogado Gustavo Ortega, informa à imprensa de que os representados aguardam o final da investigação com muita tranquilidade, em que pese a difícil situação ainda enfrentada pela família da jovem desaparecida.
Atualmente, o inquérito policial perdura por quase três anos, sem apontar qualquer elemento indiciário contra os investigados.
É imperioso destacar que desde o início da investigação o ex-companheiro, o amigo do casal e suas respectivas famílias se colocaram inteiramente a disposição da Justiça e contribuíram irrestritamente com as autoridades policiais, entregando-lhes tudo que fora requerido para o deslinde do caso.
Não seria nenhuma impropriedade afirmar que a jovem Gabrielly foi vítima de si mesma, pois sofria de terríveis surtos psicóticos e não estava tomando seus remédios, segundo afirmado pela própria genitora em depoimento policial.
Em que pese as manifestas evidências apresentadas pela defesa que apontavam na direção contrária da investigação policial, instaurada tão somente para apurar eventual crime de feminicídio, optou a Delegada de Polícia encarregada em sustentar uma linha investigativa natimorta que, ao fim e ao cabo, nada apurou de concreto.
Por fim, a defesa bem como os representados se solidarizam com os sentimentos da família e esperam, rigorosamente, que a jovem seja encontrada, respeitando-se sempre os direitos e garantias fundamentais dos investigados no curso da investigação assegurados pela Constituição Federal de 1988, notadamente os direitos ao contraditório e ampla defesa, sustentáculos de um verdadeiro Estado Democrático de Direito."