Moïse Kabagambe, de 24 anos, era um garoto tranquilo, falava pouco e gostava de jogar futebol. Fã do atleta Gabigol, o congolês era um flamenguista "de sangue". Veio ao Brasil em 2011 para morar em São Paulo. Mudou-se para o Rio de Janeiro anos depois, onde trabalhou em um quiosque na Barra da Tijuca. Neste local, no dia 24 de janeiro, o rapaz foi agredido até a morte por três homens.
— Está sendo difícil. O vídeo (que mostra Moïse sendo agredido) é muito forte. Mostra a crueldade. É muito chocante — disse seu tio, Edou Mamanu, ao Timeline, da Rádio Gaúcha, nesta quarta-feira (2).
— Ele era muito tranquilo. Não falava muito. Ele não brigava. Ele só briga se tem razão. Você pode até matar ele, mas ele não abre a mão. Jogava bola pra caramba. Uma pessoa muito inteligente. Na escola sempre esteve em primeiro e segundo lugar. Era fã do Flamengo. Era flamenguista de sangue mesmo. Uma pessoa muito doce — acrescentou.
Moïse trabalhava no quiosque há quase cinco anos. Segundo seu tio, o rapaz havia reclamado que o serviço pagava pouco, e estava pensando em largar o emprego de carteira assinada para trabalhar de forma autônoma. No final do mês passado, o congolês teria trabalhado todo um final de semana, no sábado (22) e no domingo (23). Na segunda-feira (24), teria que voltar para casa, mas isso não aconteceu.
De acordo com a família, Moïse teria ido cobrar um pagamento que ainda não recebera do dono do quiosque, identificado como Fábio. O proprietário não estava. Houve discussão com um homem que estaria no lugar de um funcionário, que seria o único com vínculo empregatício com o estabelecimento. Uma câmera de segurança registrou quando o congolês tentou abrir uma geladeira para pegar algo e foi impedido. Foi quando a confusão virou briga, Moïse foi derrubado e espancado até não ter mais sinais de vida.
— Foi só por causa da cobrança ou tinha algo a mais? Não é possível. Só por causa disso tanta crueldade — questiona o seu tio.
Edou falou que não conhece os presos. Até o momento, Alisson Cristiano Alves de Oliveira, conhecido como Dezenove e apontado como um dos autores do crime, apresentou-se para depor. Outros dois homens, conhecidos como Tota e Belo, também foram identificados como participantes do espancamento do congolês, que levou pauladas e golpes de um taco de beisebol.
— A família espera justiça, mesmo que não vá trazer o Moïse de volta — disse. — A gente não está se sentindo em paz. Pessoalmente estou com medo. Estou fugindo até das câmeras. Nós conhecemos o Brasil. Não temos mais o desejo de viver no Brasil — completou.
O presidente da Comunidade Congolesa no Rio de Janeiro, Daniel Diowo Otshudi, esteve na casa da mãe do rapaz morto nesta quarta-feira. Ele disse que, até o momento, ainda não receberam o boletim de ocorrência do caso.
— A gente quer uma justiça transparente. Que falem o nome dos bandidos que agrediram ele. Às vezes tem alguns pontos que têm se escondido —disse.
Ele acredita que mais pessoas serão presas, como o gerente do quiosque. Daniel afirmou que também tinha outra mulher no local na hora do crime.
— As pessoas viram um grupo de pessoas batendo em outra e ninguém foi separar. Até agora, a gente está observando o processo na Justiça. Amanhã (quinta-feira, 3) nossos advogados vão voltar à delegacia de homicídios na Barra (da Tijuca). Desejamos que esse processo vá até o final e que eles fiquem presos — disse.
— Todos devem saber que estrangeiro é uma pessoa. O estrangeiro merece viver, merece respeitar e merece trabalhar. E todos os diretos humanos o estrangeiro merece ter também — concluiu.
Justiça decreta prisão temporária
A Justiça do Rio de Janeiro decretou a prisão temporária de três acusados de participarem do assassinato de Moïse Kabagambe. A autorização da prisão foi concedida pela juíza Isabel Teresa Pinto Coelho Diniz, do Plantão Judiciário. O trio foi indiciado por homicídio duplamente qualificado, por impossibilitar a defesa da vítima e por uso de meio cruel.
Um dos presos, Alisson Cristiano Alves de Oliveira, gravou um vídeo admitindo a participação nas agressões que resultaram na morte de Moïse. No entanto, negou a intenção de matá-lo.
— Eu sou um dos envolvidos na morte do congolês. Quero deixar bem claro que ninguém queria tirar a vida dele, ninguém quis fazer injustiça, porque ele era negro ou alguém devia a ele. Ele teve um problema com um senhor do quiosque do lado, a gente foi defender o senhor, e infelizmente aconteceu a fatalidade dele perder a vida — afirmou Alisson no vídeo.