Dois desaparecimentos de mulheres em Porto Alegre ainda desafiam a Polícia Civil. Tanto no caso da adolescente Letícia Torquato Pereira, que sumiu em setembro de 2020, à época com 15 anos, quando saiu de casa no Centro Histórico, e da advogada Luciana Faleiro Heinze, 47, vista pela última vez no bairro Cidade Baixa, em 30 de setembro do ano passado, a principal suspeita é de que elas tenham sido vítimas de crime.
O tempo em que as duas estão sem contato com familiares, e as relações que foram detalhadas pelas investigações, estão entre os principais indicativos de que as duas podem não ter sumido por vontade própria. O caso mais antigo é o da adolescente, que morava com os avós maternos em apartamento no centro de Porto Alegre. Na tarde de 18 de setembro, Letícia decidiu ir até a orla do Guaíba encontrar amigos. A partir daquele momento, seu paradeiro se tornou incerto. Dias depois, a menina chegou a telefonar para a família, dizendo que regressaria, mas nunca mais voltou.
Desde que o caso chegou à Divisão Especial da Criança e Adolescente (Deca), a polícia vem tentando refazer os passos da adolescente e compreender quem eram as pessoas que mantinham contato com ela. À frente dessa investigação, a delegada Sabrina Dóris Teixeira diz que os policiais fizeram inúmeras diligências à procura da garota. Uma das informações recebidas durante a apuração informava que Letícia estaria em Santa Catarina, mas nenhum vestígio do paradeiro dela foi encontrado no Estado vizinho.
— Até hoje, seguimos recebendo informações via Disque Denúncia, ou outros canais oficiais, de que a Letícia esteja nesse ou naquele lugar. Todas essas informações seguem sendo apuradas, mas até agora nenhuma delas se confirmou — diz a delegada.
Segundo a policial, o caso de Letícia destoa dos demais que chegam ao Deca. A maioria dos sumiços de adolescentes envolve episódios que são resolvidos mais rapidamente, e que tem muitas vezes como pano de fundo desentendimentos entre familiares, por exemplo. Há ainda aqueles de adolescentes que estão abrigados e acabam evadindo dos locais.
— Com esse tempo de desaparecimento, é o único caso. Continua sendo nossa prioridade e a família está acompanhando de perto. A probabilidade mais forte, infelizmente, é de que ela tenha sido vítima de um crime. Avançamos bastante nas investigações. Estamos no aguardo de diversas representações que fizemos junto ao Poder Judiciário — afirma a delegada Sabrina, sem detalhar o que estaria por trás de um possível assassinato.
Os familiares de Letícia também realizaram coleta de amostra de material genético, para o caso da necessidade de confronto com algum cadáver localizado sem identificação. Outros Estados foram alertados sobre o desaparecimento da adolescente.
Da mesma forma, no caso da advogada Luciana, houve coleta de DNA de parentes pelo Instituto-Geral de Perícias (IGP). A polícia também recorreu a Santa Catarina, na tentativa de localizá-la. A advogada, que desapareceu quando visitava a mãe, no bairro Cidade Baixa, em Porto Alegre, residia em Florianópolis, na Praia da Solidão.
Em novembro, dois agentes da Polícia Civil gaúcha estiveram na capital catarinense, refazendo os últimos passos dela e ouvindo pessoas ligadas a ela. Embora vivesse fora do Estado desde o início do ano passado, Luciana mantinha diversos processos criminais tramitando em Porto Alegre. Quando saiu da casa da mãe, no fim de setembro, disse que pretendia ir ao fórum. Desde então, não fez mais contato com familiares.
— Desde o início, há essa suspeita de que ela possa ter sido alvo de alguma facção. Essa suspeita se mantém — diz o delegado Eibert Moreira Neto, da Divisão de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP).
As últimas imagens de Luciana mostram ela saindo do prédio onde mora a mãe, na Capital. Luciana visualizou o WhatsApp às 12h27min daquele dia. A polícia segue monitorando as redes sociais e contas bancárias da advogada, mas também não houve movimentação desde então. No fim do ano passado, nova informação sobre possível paradeiro dela levou os policiais até as praias de Pinhal e Magistério.
— Foram feitas várias diligências, mas nada foi encontrado. A grande probabilidade é de que ela tenha sido morta. Mas não temos comprovação disso ainda — afirma o delegado Eibert.
Quem são as desaparecidas
Letícia - 18 de setembro de 2020
A garota vivia com os avós maternos e com a irmã, na época com 11 anos, em apartamento na Rua Demétrio Ribeiro. A mãe morava nas proximidades e o pai já era falecido, vítima de um latrocínio (roubo com morte). Quando sumiu, Letícia cursava o 1º ano do Ensino Médio, na Escola Técnica Estadual Parobé, mas desde o início do ano de 2020 estava sem aulas presenciais por conta da pandemia.
Luciana - 30 de setembro de 2021
Natural de Venâncio Aires, no Vale do Rio Pardo, Luciana foi inspetora da Polícia Civil. Ela pediu exoneração do cargo para viver na Europa. Depois, voltou ao Brasil e passou a atuar como advogada. Desde o início do ano passado, vivia em Florianópolis, mas seguia trabalhando em Porto Alegre. Luciana teve um relacionamento e, após o término, viveu na casa de amigos. O ex-companheiro também já foi ouvido pelos policiais. Antes de desaparecer, Luciana teria perdido prazos de um cliente que estava sendo atendido por um delito criminal.
Como colaborar
Informações que ajudam na elucidação dos casos podem ser repassadas pelo WhatsApp (51)98444-0606 ou pelo Disque Denúncia, no 181.
Dicas de como agir
Em desaparecimentos
- Registre o desaparecimento na polícia assim que for percebido
- Leve uma fotografia atualizada para repassar aos policiais
- Outras informações relevantes no momento do registro são saber se a pessoa tem telefone celular e se foi levado junto, se possui redes sociais, os dados de conta bancária, se possui veículo e qual a placa, locais que costuma frequentar, pessoas com quem mantêm contato (amigos, familiares), se é usuária de drogas e se houve alguma desavença que pode ter motivado o sumiço
- Comunique o desaparecimento aos amigos e conhecidos, que podem auxiliar com informações. Ao divulgar o sumiço, informe os contatos de órgãos oficiais como Polícia Civil e Brigada Militar para receber informações. Isso evita que criminosos interessados em extorquir familiares de desaparecidos se aproveitem da situação
- Outra orientação importante é que as famílias comuniquem a polícia não somente o desaparecimento, mas também a localização. É muito comum os policiais depararem com casos de pessoas que não estão mais desaparecidas, mas que no sistema constam como sumidas porque o registro de localização não foi feito
Se forem crianças ou adolescentes
- Percorra locais de preferência da criança
- Saiba informar quem são os amigos dela e com quem pode estar
- Esteja atento às roupas que a criança ou adolescente está usando e, em caso de sumiço, descreva para a polícia
- Mantenha alguém à espera no local de onde ela sumiu. É comum que ela retorne para o mesmo ponto
- Ensine as crianças, desde pequenas, a saberem dizer seu nome e o nome dos pais
- Quando a criança ou adolescente for localizada, informe a polícia