Mais um dos presos por suspeita de participação no caso que envolve um assassinato e a descoberta de valores milionários em Novo Hamburgo, no Vale do Sinos, recebeu o direito de permanecer em liberdade. A mãe da jovem que namorava a vítima, João Victor Friedrich de Oliveira, 31 anos, deixou a prisão, após ficar quase um ano e meio detida pela morte do genro.
Cinco réus respondem pelo caso na Justiça — desses, dois ainda permanecem encarcerados: o pai da garota e um ex-PM temporário. Nova audiência foi realizada nesta quarta-feira (1º).
A sogra de Oliveira recebeu liberdade na última sexta-feira (27), após pedido da defesa. Ainda no mês de junho, já tinham sido soltos um primo do pai da garota e a cunhada dele (que estava em prisão domiciliar). Além deles, a jovem, que tinha 16 anos à época, e atualmente tem 18 anos, responde pela morte do namorado, em procedimento separado. Ela chegou a ser apreendida, mas atualmente está em liberdade.
Entre os réus, três respondem diretamente pelo homicídio: os pais da jovem e o ex-PM — os outros são acusados de crimes como organização criminosa e fraude processual, por supostamente terem ajudado a esconder provas. O processo segue em fase de instrução — etapa na qual são ouvidas testemunhas e réus. Quatro audiências já foram realizadas: uma no dia 8 de junho, duas em agosto, nos dias 18 e 25, e uma nesta quarta-feira.
De forma virtual, a audiência desta quarta-feira teve início às 9h30min e se encerrou por volta do meio-dia. Nela, foram ouvidas as últimas testemunhas de acusação. Ainda precisarão ser ouvidas as testemunhas de defesa, que somam total de 30 pessoas. Após inquiridas todas, será a vez de os réus serem interrogados.
Somente após essa etapa é que a Justiça deverá decidir se os cinco devem responder pelos crimes. Caso sejam pronunciados por homicídio doloso, o julgamento ocorre em júri popular.
O crime
O crime aconteceu em março do ano passado, em um apartamento na Rua Marcílio Dias, no bairro Rio Branco, em Novo Hamburgo. João Victor foi assassinado a tiros dentro do imóvel, depois teve o corpo transportado em um veículo, que foi encontrado incendiado — parte do crime foi registrado por imagens de câmeras do próprio prédio.
A mãe da jovem, que recebeu liberdade, inclusive, foi flagrada pelas câmeras do local. No momento em que o corpo de João Victor estava no elevador, ela cobriu com um pano um dos equipamentos, para evitar a gravação. Depois, teria limpado o chão da garagem, após o cadáver ter sido transportado para dentro do veículo clonado.
Na mesma madrugada do crime, após vizinhos ouvirem gritos e tiros, a Brigada Militar foi até o apartamento. No prédio, localizou a adolescente e a mãe dela. Dentro do imóvel havia marcas de sangue, armas e cerca de R$ 2 milhões entre dólares e reais. Também foram encontradas 30 placas de veículos (algumas com identificação da Câmara dos Deputados e do Senado), lacres de placas e documentos falsos.
A investigação concluiu que o rapaz foi assassinado a tiros. Para a acusação, o crime teria sido premeditado como queima de arquivo, mas o plano teria sido acelerado pelo fato de João Victor ter agredido a namorada. A briga teria sido usada como pretexto para que a morte acontecesse.
Segundo a denúncia do Ministério Público (MP), o assassinato foi a forma de garantir que os autores ficariam com o dinheiro encontrado no imóvel. A defesa da família nega que esse tenha sido o motivo do crime (detalhes abaixo).
Os presos
O pai da jovem e o ex-PM também aparecem em imagens de câmeras de segurança chegando no prédio, onde já estava João Victor. A acusação sustenta que eles estavam decididos a matá-lo e que assim fizeram. O MP afirma que os dois homens e a garota atiraram em João Victor. Enquanto a defesa diz que eles só estavam tentando evitar que ele agredisse a namorada e os outros familiares. A defesa afirma ainda que foi a adolescente quem atirou no namorado, para se defender.
O sogro é apontado como o responsável por esconder o cadáver, enterrado em um mato em São Sebastião do Caí. Depois, teria ateado fogo ao veículo onde o corpo foi transportado. O corpo de João Victor foi localizado dias depois em uma chácara — foi necessário realizar exame de DNA para comprovar que se tratava da vítima.
A outra mulher, que chegou a ficar em prisão domiciliar, mas foi solta em junho, teria sido responsável por buscar com o sogro de João Victor um edredom e cobertor, utilizados para enrolar o corpo. As cobertas foram descartadas em um matagal no bairro Primavera, em Novo Hamburgo.
Fuga de delegacia
Dias após o crime, o pai da jovem foi preso com armas e dinheiro, enquanto, segundo a polícia, preparava-se para escapar. O primo dele também foi preso nesta mesma ação. Naquele mesmo dia, o sogro da vítima protagonizou um episódio na Delegacia de Homicídios de NH, de onde conseguiu escapar.
O homem arrebentou parte do encosto de uma cadeira e fugiu correndo, enquanto estava algemado no corredor. Dez dias depois, a polícia do RS conseguiu recapturar o foragido, em São José, Santa Catarina. Com ele, foi apreendida uma Hilux e cerca de R$ 60 mil em dinheiro
Os crimes pelos quais respondem
- Pais da jovem - homicídio qualificado, ocultação de cadáver, fraude processual, posse ilegal de arma de fogo, receptação, adulteração de veículo, organização criminosa e corrupção de menor. O pai responde ainda por falsificação de documento público.
- Ex-PM temporário - homicídio qualificado, ocultação de cadáver, posse ilegal de arma de fogo, fraude processual, organização criminosa e corrupção de menor.
- Primo do pai da jovem - ocultação de cadáver, organização criminosa, fraude processual e favorecimento pessoal.
- Mulher - organização criminosa, fraude processual e favorecimento pessoal.
O que diz a defesa dos pais e da adolescente
Um dos responsáveis pela defesa dos pais e da jovem, o advogado Jean Severo nega que o crime tenha sido planejado. A defesa sustenta que a adolescente foi responsável pelo disparo que atingiu o namorado e que agiu para defender a família. Sobre a origem da quantia, afirma é lícita e que está tentando comprovar isso na Justiça para obter a liberação dos valores, ainda apreendidos.
— O que está sendo trazido no processo mostra que se trata de uma legítima defesa. A vítima era uma pessoa muito violenta e envolvida com o crime. Também pedimos a soltura do pai dela, e acreditamos que em breve vamos conseguir soltá-lo também — afirma o advogado.
O que diz a defesa do primo e da cunhada
GZH entrou em contato com a advogada Ester Venites Gerhardt, responsável pela defesa dos dois. Em nota, a advogada afirma que o cliente não teve "envolvimento com os delitos geradores do processo". "O mesmo reside com sua esposa no estado de Santa Catarina, onde estava no dia do ocorrido, tendo chegado em NH apenas na sexta feira as 21h, o que resta comprovado nos autos, não tendo como ter qualquer envolvimento", sustenta.
A advogada afirma que no momento em que foi preso, com o pai da jovem, ele tinha somente dado uma carona ao primo. A defesa também nega que ele tenha auxiliado na ocultação do corpo, "pois não estava na cidade, e, muito menos, que tinha alguma arma". A advogada argumenta que esses fatos foram confirmados em depoimento pelo pai da jovem.
Sobre a mulher, a defesa alega que a cliente "não teve qualquer envolvimento com os delitos" e que não tinha relação com a família da jovem. A advogada afirma que ela somente deu uma carona ao pai da jovem, a pedido do cunhado (também réu), que morava em Santa Catarina. A defesa diz que a cliente levou o pai da jovem a alguns lugares, onde ele alegou que precisava passar antes de se apresentar na delegacia.
"Depois, para sua surpresa, foi intimada e presa, acusada de ter auxiliado o corréu a se esquivar da responsabilização criminal, ocultação de cadáver e organização criminosa, o que é um absurdo, pois sequer tem vínculo com (cita nome), apenas fez um favor de lhe dar uma carona", afirma a defesa.
O que diz a defesa do ex-PM temporário
GZH tenta contato com a advogada Luiza Larre Wienandts, que, segundo o Tribunal de Justiça, é responsável pela defesa do ex-PM. Segundo a Brigada Militar, o então policial militar temporário foi excluído da corporação em 10 de junho do ano passado.
Por que não publicamos os nomes dos réus?
GZH não identifica os réus por envolvimento no desaparecimento e na morte de João Victor Friederich de Oliveira, 31 anos, em Novo Hamburgo, para preservar a identidade da adolescente, que tinha 16 anos à época do crime. A preservação do nome de adolescentes infratores é determinada pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).