Há quase um ano, a diarista Maria de Fátima Geraldo, 44 anos, percorre Porto Alegre com a foto da filha mais velha na bolsa. Imprimiu a imagem e indaga a maioria das pessoas que cruza seu caminho para saber se ninguém viu Bruna Geraldo Galle, 27 anos, desaparecida desde o início de abril do ano passado. É para dar foco a casos como esse que a Polícia Civil inaugurou nesta quinta-feira (4) a Delegacia de Polícia de Investigação de Pessoas Desaparecidas, a primeira do Estado especializada nesse tipo de apuração.
— É uma angústia, toda hora eu penso. Quando o telefone toca, corro para atender. Se pego um Uber, já pergunto. Quando saio, olhos para todos os cantos, pergunto para as pessoas. Vivo em função disso, de encontrar a minha filha. Só queria saber que ela está bem. Como mãe, a gente tem esperança — diz a diarista, que após o sumiço da filha ficou responsável por cuidar dos cinco netos, três meninas e dois meninos, com idade entre dois e nove anos.
O desaparecimento de Bruna é um dos que está sob os cuidados da nova delegacia, chefiada pela delegada Roberta Bertoldo, que também é titular da 2ª Delegacia de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP).
A delegada prefere não detalhar neste momento a apuração, mas confirma que a principal hipótese é a de homicídio. Bruna estava morando na casa de uma amiga, que havia conhecido recentemente, no Porto Seco, na zona norte de Porto Alegre, quando sumiu em 1º de abril do ano passado. Ela era usuária de drogas e não tinha celular, mas se comunicava com a família regularmente por meio do telefone da amiga.
— Ela me ligava direto. Eu tinha alugado uma pecinha para ela morar na Restinga, perto de mim. Ela estava por vir, mas sumiu antes. A Bruna nunca foi de ficar assim, tanto tempo sem dar notícia. É muito difícil — desabafa a mãe.
A instalação de uma delegacia com foco nesse tipo de crime é uma aposta da Polícia Civil em especializar as investigações. Pelo menos 1.316 ocorrências abertas desde 2004 estão em apuração no momento pela nova unidade. São investigados ali os casos de pessoas maiores de 18 anos, que tenham sumido na Capital. Desde 2017, a 2ª DHPP já mantinha uma seção de apuração de desaparecimentos, que agora foi transformada em delegacia.
Os casos investigados, segundo a delegada Roberta, envolvem diferentes contextos, desde desaparecimentos voluntários, de pessoas com problemas com consumo de álcool e drogas, conflitos familiares ou conjugais, casos de violência doméstica e homicídios. A principal orientação da delegada é para que o registro seja realizado imediatamente após ser percebido o sumiço.
— As pessoas têm uma rotina, se sabe qual a normalidade. Se a família constatou a ausência, algo anormal, procure a Polícia Civil e comunique. Às vezes, há casos em que constatamos que há intenção suicida. E são casos que podem vir a ser evitados. Não existe um pré-requisito para fazer o registro — explica a delegada Roberta.
O registro do desaparecimento pode ser realizado em qualquer unidade da Polícia Civil e também por meio da Delegacia Online (neste link).
Inauguração
A nova delegacia está vinculada ao Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP). Na cerimônia virtual, realizada na manhã desta quinta-feira, a diretora do DHPP, delegada Vanessa Pitrez afirmou que a Polícia Civil aposta em algumas parcerias com o Instituto-Geral de Perícias (IGP) para utilizar mais ferramentas na investigação de casos de desaparecimentos, como envelhecimento facial e coleta de DNA de familiares para confronto com localização de corpos.
— A busca por pessoas desaparecidas no RS dará um novo passo, rumo ao aperfeiçoamento do trabalho da Polícia Civil sobre esse assunto que nos é tão caro — afirmou.
A chefe da Polícia Civil, delegada Nadine Anflor, apresentou uma ferramenta de inteligência artificial que será lançada nas próximas semanas, por meio do WhatsApp, no qual familiares de desaparecidos terão um canal direto para receber orientações e repassar informações.
— Tenho certeza que com o trabalho conseguiremos dar resposta mais imediata aos familiares que se desesperam quando seus parentes, filhos, pais, acabam desaparecendo na Capital. Com essa ferramenta, aliada com esse trabalho especializado, acredito que teremos um sucesso ainda maior na localização dessas pessoas — disse.
O promotor Tiago de Menezes Conceição, que acompanhou a cerimônia online de inauguração, parabenizou a ação e ressaltou a necessidade de ampliar esse tipo de iniciativa para outros públicos – como crianças e adolescentes – e para o Interior.
— É um trabalho que avança numa área extremamente importante. O desaparecimento de uma pessoa é realmente um grande drama. As autoridades públicas quando percebem isso e começam a trabalhar para trazer um pouco de alento às famílias estão cumprindo seu papel de agente público que pretende atender os anseios e demandas sociais — afirmou o promotor.
SERVIÇO
- Onde fica: 2º andar do Palácio da Polícia, na Avenida João Pessoa, nº 2050, sala 223
- Horário: 8h30min às 12h e 13h30min às 18h, de segunda a sexta-feira. O registro do desaparecimento pode ser feito em qualquer horário nos plantões de delegacias e na Delegacia Online
- Telefones: 3228-2254 e 98519-2196
DICAS
- Registre o desaparecimento na polícia assim que for percebido
- Leve uma fotografia atualizada para repassar aos policiais
- Outras informações relevantes no momento do registro são saber se a pessoa tem telefone celular e se foi levado junto, se possui redes sociais, os dados de conta bancária, se possui veículo e qual a placa, locais que costuma frequentar, pessoas com quem mantêm contato (amigos, familiares), se é usuária de drogas e se houve alguma desavença que pode ter motivado o sumiço
- Comunique o desaparecimento aos amigos e conhecidos, que podem auxiliar com informações. Ao divulgar o sumiço, informe os contatos de órgãos oficiais como Polícia Civil e Brigada Militar para receber informações. Isso evita que criminosos interessados em extorquir familiares de desaparecidos se aproveitem da situação
- Outra orientação importante é que as famílias comuniquem a polícia não somente o desaparecimento, mas também a localização. É muito comum os policiais depararem com casos de pessoas que não estão mais desaparecidas, mas que no sistema constam como sumidas porque o registro de localização não foi feito
Colabore
Informações sobre casos de desaparecimentos podem ser repassadas à Polícia Civil por meio do telefone 0800 642 0121, pelo 197 e também pelo site da instituição neste link.