Uma facção que tem base no Vale do Sinos, a mesma que planejou a escavação de um túnel para fuga em massa do Presídio Central e que comprou uma fazenda no Mato Grosso com quase três vezes o tamanho de Porto Alegre, volta a ser alvo da Polícia Civil.
Conforme a investigação, a organização criminosa planejou roubar um helicóptero e trocá-lo por uma carreta carregada de cocaína. Para isso, chegaram a matricular integrantes em aulas de voo, mas a ação foi abortada.
A investigação prosseguiu em relação à lavagem de dinheiro e, nesta quinta-feira (13), 220 policiais cumpriram 151 ordens judiciais em nove cidades gaúchas e uma catarinense.
De acordo com a polícia, os criminosos pretendiam roubar um helicóptero no final de 2018 em uma escola para pilotos em Santa Catarina. O fato foi descoberto pelo delegado Rodrigo Caldas, titular da 3ª Delegacia de Canoas e responsável pela Operação Chicago.
Segundo ele, inicialmente, o grupo pretendia alugar uma das aeronaves da escola e durante o voo realizar o roubo. O fato foi comprovado durante a investigação de um ano e meio por meio de depoimentos e, principalmente, por trocas de mensagens entre os integrantes da facção após a apreensão de telefones de alguns suspeitos durante a apuração.
Em uma delas, eles destacam a simulação do aluguel com dois casais, a aquisição de um bloqueador de sinal para evitar o rastreamento por satélite e até mesmo a clonagem de documentos e sinais identificadores. Em outra conversa de texto pelo WhatsApp, os integrantes da facção ressaltam o contato urgente com a empresa que ministra as aulas e também a troca da aeronave a ser roubada por uma carreta de drogas, basicamente cocaína, que seria trazida do Paraguai.
Mas em outra troca de mensagens, os suspeitos mandam fotos do helicóptero em Santa Catarina para comparsas no Rio Grande do Sul e mais informações sobre desistir do aluguel e realizar as aulas de voo. No texto, eles destacam tirar o brevê, o documento que dá ao seu titular a permissão para pilotar aeronaves. Além disso, os integrantes da facção ressaltam que, se tudo saísse conforme o combinado, atacariam o piloto logo após o pouso em local a ser combinado.
Plano cancelado
O diretor da 2ª Delegacia Regional Metropolitana, delegado Mario Souza, que responde pela área de atuação em que está inserida a 3ª Delegacia de Canoas, diz que um dos objetivos do cumprimento dos mandados judiciais realizados nesta quinta-feira também é descobrir porque o plano foi abortado. Logo após as aulas de voo, com pelo menos dois integrantes da facção matriculados, por algum motivo houve a desistência de roubar o helicóptero. Mesmo assim, o prejuízo foi grande, já que, atualmente, uma hora de voo apenas custa em torno de R$ 2,2 mil na escola catarinense.
Souza ressalta que um criminoso fez o treinamento e é apurado se um segundo também participou, não descartando também que as aulas desse outro envolvido possam ter ocorrido em outra escola, no Paraná. A polícia não está divulgando os nomes dos locais para não expor os responsáveis pelo fato de que eles não sabiam que se tratava de integrantes da organização criminosa gaúcha.
— Acredito que a facção desistiu de levar o plano de roubo adiante, já que as aulas temos informações de que ocorreram, pelo fato de que o grupo passou gradativamente a ser descapitalizado através de várias operações policiais sobre lavagem de dinheiro, como a que deflagramos hoje (quinta-feira). Ou também pelo fato de que não houve acordo entre o grupo e os fornecedores da droga. Isso é o que temos de apurar na sequência — ressalta Souza.
Operação Chicago
Depois da descoberta do plano e ainda da desistência de levar o roubo do helicóptero adiante, a 3ª Delegacia de Canoas seguiu investigando os criminosos. Com a apreensão de celulares dos suspeitos — onde estavam as mensagens com parte do planejamento para roubar a aeronave — e outras técnicas de investigação, o delegado Caldas conseguiu também comprovar que pelo menos seis lideranças estavam por trás das finanças da facção com base no Vale do Sinos.
— Eles não se envolvem com o tráfico, com armas e com o "jogo sujo", apenas com o dinheiro, com o giro de capital, investimentos, compras e vendas, além da típica lavagem de dinheiro que está sendo o nosso alvo nesta operação. Fica claro que os criminosos vem agindo há anos, literalmente, como uma empresa — destaca.
Após levantamento do patrimônio dos investigados, pouco mais de um ano e meio depois a Polícia Civil deflagra a Operação Chicago com mais de 200 agentes, inclusive com o apoio do helicóptero da instituição. Foram cumpridos seis mandados de prisão preventiva, 40 de busca e ainda mais de cem apreensões e bloqueios judiciais contra a facção criminosa que tem base no Vale do Sinos.
A organização teve bens apreendidos judicialmente que foram avaliados em R$ 17,3 milhões: 48 veículos, 19 imóveis e 38 contas bancárias. As ordens judiciais foram cumpridas em Canoas, Porto Alegre, Sapucaia do Sul, Nova Santa Rita, Gravataí, Estância Velha, São Leopoldo, Imbé e Capão da Canoa. Além de Itapema, em Santa Catarina.
Lavagem de dinheiro
Caldas explica que, para os mandados em Itapema, teve o apoio da polícia local. Além disso, ele diz que o nome "Chicago" se deve ao fato de que no município dos Estados Unidos houve a atuação pioneira de lavagem de capitais por meio da máfia.
Segundo a investigação, a partir do dinheiro de venda de drogas, eram adquiridos veículos como carros e lanchas, imóveis, armas, munição, mais entorpecentes, bem como o investimento em outras áreas. O grupo depositava dinheiro em dezenas de contas bancárias, mas também comprava dólares.
No período de apuração, diversas empresas foram criadas para o processo e facilitação da lavagem do dinheiro. Um fato que a polícia descobriu ao buscar provas com o objetivo de descapitalizar a facção, foi a ocultação de drogas transportadas dentro de carregamentos de diversas sacas de grãos entre os Estados do Sul do país.
Caldas destaca que a investigação não vai parar com a operação, pelo contrário, deve aumentar ainda mais. Os nomes dos presos ainda não foram divulgados pela polícia.