Um laudo do Instituto-Geral de Perícias (IGP) revela que 14 arquivos foram apagados do celular do menino Andrei Ronaldo Goulart Gonçalves, 12 anos, dias após a sua morte. GaúchaZH teve acesso ao resultado da análise nesta sexta-feira (6).
A investigação sobre a morte do garoto sofreu reviravolta em 2020 e, o que antes era considerado suicídio, passou a ser tratado três anos depois como um homicídio. Segundo o Ministério Público, quem cometeu o crime foi o tio do garoto, o tenente da reserva da Brigada Militar Jeverson Olmiro Lopes Goulart, 54 anos.
No laudo, constam que os arquivos foram apagados em duas datas: 7 de dezembro de 2016 e 2 de janeiro de 2017. A análise do IGP revela também os tipos de arquivos: são 11 em formato de áudio, dois em formato de texto e uma imagem.
GaúchaZH confirmou que a Promotoria ainda não acessou o conteúdo dos documentos. A responsável pela denúncia, promotora Lúcia Helena Callegari, pontuou que o réu ficou com o celular após a morte de Andrei.
A 6ª Delegacia de Homicídios e Proteção à Pessoa, responsável pela investigação, só teve acesso ao celular em 7 de janeiro de 2017, mais de um mês após o garoto ter sido encontrado morto.
Segundo ela, o laudo ainda não foi anexado ao processo. O IGP informou que finalizou o estudo e o entregou em 25 de novembro de 2019. A perícia não consegue determinar, no entanto, quem apagou os arquivos.
Segundo o depoimento à Justiça, que consta no processo, o tio disse que ficou com o celular após a morte de Andrei:
"Disse que levou o celular de Andrei consigo para o Ministério Público (onde o réu trabalhava), mas ninguém teve acesso ao conteúdo, e tentou entregar na delegacia, junto com o bilhete e o caderno. Negou ter entregue a alguém o aparelho", anotou a juíza Lourdes Helena Pacheco, ao aceitar a denúncia por homicídio.
No mesmo depoimento, o tio nega o crime:
"Afirmou que estava dormindo na cama de baixo do beliche, quando por volta das 2h acordou-se com o barulho de um disparo de arma de fogo e encontrou a vítima ensanguentada na cama de cima. Chamou Cátia e então encontraram a sua arma funcional ao lado do corpo".
A mãe de Andrei, Cátia Rosimary Lopes Goulart, disse em depoimento à Justiça que teve acesso ao celular somente em 15 de dezembro daquele ano. Ela contou que o seu irmão alegou "que a perícia seria realizada pelo computador e que ele (celular) seria dispensado pela polícia".
IGP defende laudos
O IGP defendeu, nesta sexta-feira (6), que o tiro que atingiu o menino foi disparado pela frente, com a pistola encostada na testa. Na quinta (5), quando GaúchaZH revelou a reviravolta, a promotora Lúcia disse em entrevista que o disparo foi na nuca.
— Todos os elementos apresentados na necropsia e no exame de local do crime apontam que todos os vestígios, especialmente a questão do esfumaçamento (resíduos ao redor do ferimento) e da câmara de mina (estudo que mostra forma de entrada de tiro), é um indicativo claro de que foi um tiro na testa — afirmou o perito criminal Anderson Morales.
A questão do local do tiro suscitou um debate, já que é considerado mais raro uma pessoa cometer suicídio com um tiro na nuca.
Outro ponto que gera questionamento pela promotora é a inexistência de pólvora nas mãos de Andrei. O perito químico forense Daniel Scolmeister ponderou que estudos mostram que 50% das vítimas de suicídio não apresentam resquícios nas mãos.
O perito também reforçou que o fato do réu ter lavado as mãos antes de passar pelo exame prejudica a coleta. Além disso, o exame ocorreu 4h10min depois da hora da morte.
— Se faz uma lavagem na mão, aí nós temos um problema muito grande porque pode, sim, retirar os resíduos simplesmente com uma lavagem ou esfregando — assegurou.
Sobre o pedido de reconstituição dos fatos, a diretora do Departamento de Criminalística, Sheila Wendt, sustentou que é ineficiente nessa investigação:
— Quando foi feita a análise para verificar a viabilidade para se realizar o exame, a análise dos depoimentos não trouxe elementos de que houvessem versões desencontradas. Na verdade, não houve testemunhas do fato — garantiu.
Sem pesquisas sobre suicídio
A perícia também analisou se houve pesquisas sobre suicídio após a data da morte de Andrei no celular. Não foi encontrada, em nenhuma plataforma, segundo o laudo, buscas sobre o assunto no aparelho do garoto.
O tio havia dito, também em depoimento, que o menino havia feito pesquisas anteriores sobre suicídio. Essa perícia, no entanto, foi inconclusiva. A delegada Elisa Souza considerou o relato dos tios ao embasar a tese inicial da Polícia Civil sobre suicídio.
Contraponto
Procurado nesta sexta (6) por GaúchaZH, o advogado Edson Perlin, que defende o tenente, preferiu não se manifestar. Disse que é o mais adequado por "questões de ordem e de Direito". Ainda afirmou que vai pedir à Justiça que decrete sigilo do processo.