Com intuito de reduzir a espera das famílias pela liberação de corpos mantidos no Departamento Médico-Legal (DML) de Porto Alegre, um manual com orientações deve ser implantado a partir do próximo mês. O documento está sendo elaborado por grupo de trabalho, que inclui órgãos como Instituto-Geral de Perícias (IGP), Judiciário, Defensoria Pública, Ministério Público e Polícia Civil. A expectativa é de que esteja disponível em novembro.
A iniciativa é voltada especialmente para aqueles casos em que a identificação não pode ser feita pela coleta de digitais, por exemplo. Neste caso, é necessário adotar outros procedimentos, como realização de exame de DNA, análise da arcada dentária e até a busca da identificação judicial. Nestes casos, a direção do Instituto-Geral de Perícias (IGP) percebeu que nem sempre a informação chega de maneira clara às famílias, o que pode estender o prazo de identificação e liberação.
A intenção é de que a família tenha acesso mais fácil sobre os possíveis procedimentos a serem adotados. E não crie, por exemplo, falsa expectativa a respeito da identificação pelo DNA — exame que permite verificar a compatibilidade genética, mas nem sempre garante a identificação do familiar. Em setembro, GaúchaZH relatou o drama de uma família que tentava liberar o corpo de homem desaparecido. Após 48 dias de espera, conseguiram a identificação pela arcada dentária.
— A ideia do manual vem para resolver junto à família, mostrar os caminhos. Sempre foram dadas orientações às famílias, mas a gente está percebendo que não são suficientes. Então, precisamos parar, analisar e tomar novas medidas — diz a diretora do IGP, Heloísa Helena Kuser.
Para André Esteves de Andrade, que representa a Defensoria Pública no grupo de trabalho coordenado pela Secretaria da Segurança Pública, a melhoria da comunicação pode agilizar a liberação dos corpos, reduzindo os casos em que seja necessária ação judicial. Ele afirma que esses casos são considerados de urgência pela Defensoria Pública.
— Essa iniciativa vem para esclarecer esse cidadão e agilizar a identificação. Para que essas pessoas sejam enterradas com dignidade. A superlotação é um problema até de insalubridade. A demanda do DML é muito grande. Quanto mais rápido consegue, a identificação e liberação, melhor é, tendo em vista tanto a situação do familiar, como buscar a não lotação do DML. Todos os órgãos têm de trabalhar juntos para resolver isso o mais rápido possível.
Câmara fria
Em média, 11 corpos ingressam por dia no necrotério da Capital. Nesta terça-feira (22), havia 46 — a capacidade é para 54 cadáveres. Em maio, reportagem de GaúchaZH mostrou que o DML operava acima da capacidade (havia 79 vítimas no dia 27) além de estar acima da capacidade, o necrotério operava com a câmara fria abaixo da temperatura ideal.
Atualmente, o compartimento está em processo de manutenção. Os corpos foram removidos para um contêiner refrigerado. Após a limpeza do local, ocorrerá vistoria para identificar a extensão do problema.
— Será preciso avaliar o tamanho do dano. Saber se necessitará de troca de equipamentos, de reforma ou se é um problema elétrico. Também queremos fazer uma troca de piso — explica a diretora do IGP.
Entenda as formas de identificação:
- Coleta de impressões digitais
Todos os corpos que chegam ao DML são submetidos à coleta de digital. Mas em alguns casos não é possível fazer este tipo de identificação como, por exemplo, em corpos carbonizados ou em avançado estado de decomposição.
- Arcada dentária
Alguns materiais permitem confronto odontológico e podem ser levados pela família até o DML, quando for necessária a identificação desta forma. São eles: ficha dentária e radiografia arquivadas por dentista, modelo de gesso para confecção de prótese dentária, pasta ortodôntica para colocação de aparelho dentário, placa de bruxismo, placa de clareamento, prótese ou aparelho dentário, protetor esportivo ou fotografia do sorriso.
- DNA
A compatibilidade genética nem sempre garante a identificação da vítima. Se o material de referência for fornecido por um irmão, permitirá apontar que o corpo pertence ou não a um irmão daquela pessoa, mas não qual irmão. O mesmo ocorre quando quem fornece o material é o pai ou a mãe. Apontará a compatibilidade genética com um filho, mas não qual filho. Não garante a identificação pelo legista.
A única forma que permite a identificação é quando o confronto é feito com material coletado de um filho ou filha da vítima. Mesmo quando se sabe que não poderá determinar a identificação do indivíduo, o DNA é realizado porque pode excluir o vínculo com aquela família ou ser usado como elemento para análise judicial.
- Judicial
Nos casos em que o legista não consegue apontar a identificação pelas impressões digitais, arcada dentária ou DNA, é preciso recorrer à Justiça. As famílias que não têm condições de contratar advogado, podem buscar a Defensoria Pública, que ingressará com uma ação, solicitando a identificação judicial. A Justiça analisará o contexto (perícias realizadas, reconhecimento de roupas, tatuagens, entre outros) e decidirá se o corpo será liberado à família.