Amargando a marca de Estado com maior número de registros de injúria racial no país em 2018, o Rio Grande do Sul busca soluções para enfrentar esse tipo de crime. Na contramão de reduções importantes em homicídios, latrocínios e estupros, o Estado apresentou, de acordo com o Anuário da Segurança Pública, elevação nas notificações de injúria racial se comparado a 2017, subindo de 1.404 casos para 1.507 — aumento de 7,3%.
Diretora do Departamento Estadual de Proteção a Grupos Vulneráveis, a delegada Shana Hartz classifica os números do Rio Grande do Sul como alarmantes, mas relaciona o aumento a um cenário onde as vítimas não estão mais sofrendo caladas, alertando a polícia sobre situações que antes ficavam "escondidas":
— As pessoas estão mudando uma questão cultural e não aceitando mais esse tipo de crime, o que é bom. Os dados, apesar de altos, vêm nos mostrando a consciência da população de que isso realmente está errado, que caracteriza um crime que merece punição.
O coordenador de Igualdade Étnica e Racial da Secretaria de Justiça, Cidadania e Direitos Humanos do RS, Jonas Bohrer, também acredita que o número elevado de registros ocorre em razão do encorajamento da população. Bohrer cita ações junto à população negra e a grupos vulneráveis como ferramentas importantes na busca pela igualdade social.
Segundo ele, esse movimento possibilita mapeamento que ajuda no combate ao delito.
— Com isso, a gente tem subsídios para articular uma política pública para combater esses crimes, por meio de um decreto ou um projeto, com a assistência da sociedade — pontua.
Representatividade
O advogado e escritor Antônio Carlos Côrtes afirma que, além do aumento no número de pessoas encorajadas a denunciar, o histórico do Rio Grande do Sul em relação a casos de racismo e o que ele cita como uma "uma onda racista impregnada no país" ajudam a explicar a posição do Estado em relação a registros de injúria racial. No entendimento de Côrtes, a representatividade da população negra em posições de destaque nos governos municipal, estadual e federal e as ações preventivas são importante no enfrentamento a esse tipo de crime:
— Se tivéssemos essa representação de 15% em todos os escalões de governo, consequentemente teríamos uma mudança.
A Polícia Civil estima inaugurar no segundo semestre de 2020 a delegacia de plantão para crimes contra vulneráveis em Porto Alegre. Pessoas que foram vítimas em razão de sua condição racial, sexual e de gênero estão entre as que serão atendidas no local. A corporação pretende instalar a Delegacia de Combate à Intolerância e Preconceito Racial no mesmo prédio no bairro Santana, na Capital.
Shana cita a criação da delegacia especializada como movimento importante no combate a esse tipo de crime, mas estima que os registros tendem a aumentar com as vítimas sentindo-se mais seguras em notificar:
— No momento em que há um serviço específico por esse público, as pessoas se sentem encorajadas e acolhidas. Então, a tendência é de aumentar o índice de registros.
Investigação
Shana destaca que, em casos de injúria racial, as vítimas têm de procurar a polícia reunindo o maior número possível de provas, sejam documentais ou testemunhais. Segundo a diretora, esses elementos ajudam na fase de investigação e no combate à impunidade. Ela salienta que um "número real" dos casos ajuda na elaboração de políticas públicas de combate a esses crimes:
— A subnotificação é muito ruim, porque ela nos mostra uma marca errada da criminalidade. No momento em que a gente tem um índice correto de onde está acontecendo e como está acontecendo a violência, consegue canalizar políticas de segurança pública por fazer um combate mais específico e mais preventivo.