No último dia útil antes do feriadão de Ano-Novo, na sexta-feira (28), o ex-prefeito de Estância Velha Elivir Desiam, 57 anos, conhecido como Toco, esteve reunido com amigos e colegas na Assembleia Legislativa, em Porto Alegre, para tratar de um cargo que assumiria no novo governo por indicação do seu partido, o PTB.
Nada no comportamento de Desiam indicava a tragédia que ocorreria horas depois, quando foi encontrado agonizando na beira do mar em Imbé, no Litoral Norte, e o corpo de sua namorada, Lúcia Bialoso Valença, 35 anos, foi achado na casa em que os dois viviam, no centro de Estância Velha, no Vale do Sinos.
Desiam foi socorrido, mas não resistiu a uma parada cardiorrespiratória. Por enquanto, a principal hipótese é de que ele tenha matado Lúcia e cometido suicídio. A suspeita está baseada no relato da ex-mulher de Desiam, que mora no Litoral. Em contato com ela, o ex-prefeito teria confessado o crime e dito que iria tirar a própria vida. Eles tinham dois filhos adotivos e estavam separados.
A mulher, então, avisou a polícia, que informou a suspeita à Brigada Militar em Estância Velha. O corpo de Lúcia foi encontrado por policiais militares por volta das 10h de sábado (29), dentro de casa. A porta precisou ser arrombada. Segundo vizinhos, a casa havia sido comprada pelo ex-prefeito para o casal morar e já passara por reforma.
Desiam, duas vezes prefeito de Estância Velha, havia concorrido a deputado estadual no último pleito pelo PTB. Antes disso, trabalhou por cerca de um ano no gabinete do deputado Maurício Dziedricki (PTB), o mesmo onde esteve reunido na última sexta-feira.
— Ele e a Lúcia tinham relação boa. Na sexta, ele estava normal. Ia almoçar comigo, mas não deu tempo. Nos encontramos na reunião de tarde. Pelo perfil de gestor que ele tinha, estava cotado talvez para ser secretário adjunto de Desenvolvimento. Ele estava bem, me falou do casamento, que seria em janeiro. Tudo que aconteceu não combina com o Toco que conhecemos, um homem incapaz de entrar em atrito, não sabemos o que aconteceu — lamenta Maicon Schuh, que também trabalha com Dziedricki e que foi coordenador da campanha de Desiam.
O vice-governador eleito Ranolfo Vieira Junior (PTB) ressaltou as qualidades do ex-prefeito:
— Estivemos juntos na campanha, em caminhadas, e pude sentir a acolhida da comunidade em relação a ele. Pela experiência que tinha e pela votação que fez, seria uma indicação do PTB para compor o novo governo. Se for verdadeira a hipótese para as mortes (de feminicídio seguido de suicídio), jamais se imaginava que pudesse ocorrer com ele, um homem que demonstrava muito equilíbrio.
Tentando entender que problema poderia estar angustiando Desiam, um amigo lembrou que, na quarta-feira (26), ele esteve na Paróquia Sagrado Coração de Jesus, no centro de Estância Velha, para pagar o dízimo e, depois, teria conversado com uma familiar sobre cuidados necessários com a mãe dele, que vive em um asilo.
— Parece que ele estava se sentindo pressionado por algo e que estava se preparando para o que aconteceu — comentou o amigo neste domingo (30).
Familiares e amigos de Lúcia também não encontram motivo para o que aconteceu. Conforme o industriário José Bialoso, 45 anos, irmão de Lúcia, ela e Desiam tinham boa relação e estavam felizes com os preparativos do casamento civil, que ocorreria dia 24. Lúcia era servente concursada da prefeitura e trabalhava em uma creche municipal. No momento, estava de férias.
— Minha irmã foi casada e ele também. Mas nunca tiveram nada antes de se separarem. Estavam juntos há um ano e ela queria se casar, fazer tudo certinho. Com a correria das eleições, decidiram que seria depois. Ela era muito discreta. Ele queria que ela fosse em eventos da campanha, mas ela evitava. Tinha uma vida caseira — contou Bialoso.
Conforme o industriário, o anúncio recente do casamento, divulgado no site do cartório de Novo Hamburgo, teria desagradado a familiares do ex-prefeito, que teriam passado a fazer insistentes ligações para Lúcia e Desiam. O industriário disse que a casa da irmã estava toda organizada, sem sinais de arrombamento, e que a única coisa que sumiu foi o celular dela. Ele também estranhou o fato de haver R$ 3 mil junto ao corpo, que estava no chão da cozinha, coberto e com um travesseiro sob a cabeça.
A morte de Lúcia teria ocorrido por estrangulamento. Já Desiam foi encontrado no começo da manhã na praia por guarda-vidas, na altura da guarita 130, e levado para o posto de saúde do município, mas não sobreviveu. Lúcia foi sepultada na manhã deste domingo, em Estância Velha. O sepultamento do ex-prefeito está previsto para ocorrer nesta tarde, no Litoral Norte.