Um problema recorrente relacionado ao sistema prisional e à segurança pública do Rio Grande do Sul parece sem perspectiva de solução. Presos nem sempre são levados para audiências. Tribunal de Justiça (TJ) e Superintendência dos Serviços Penitenciários (Susepe) trocam críticas sobre os motivos. A pedido de GaúchaZH, o TJ fez um levantamento do número de audiências que necessitariam da presença de presos.
No período de 27 de março a 30 de abril, foram realizadas 929 audiências que deveriam ter a presença de algum investigado, denunciado ou condenado que está no sistema prisional. Dessas, 257 (28%) não tiveram a presença de presos e em 672 (72%) houve a apresentação. O levantamento leva em conta processos das comarcas de Porto Alegre, Passo Fundo, Santa Maria, Caxias do Sul, Pelotas, Canoas, Novo Hamburgo, São Leopoldo, Esteio, Sapucaia do Sul, Gravataí, Viamão, Alvorada e Cachoeirinha.
Na tarde de quinta-feira (30), a juíza Betina Ronchetti, da Vara Criminal do Foro do Alto Petrópolis, em Porto Alegre, viu frustradas audiências que deveriam ter a presença de nove réus presos, que acabaram não sendo levados.
— Os presos não foram apresentados e isso acontece, via de regra, sem comunicação com antecedência, de modo que nós não temos tempo hábil para avisar as pessoas que estão programadas para vir prestar seus depoimentos nas audiências.
A juíza explica que a não apresentação de um preso gera uma série de problemas, entre eles, a soltura dos detentos.
— A falha na apresentação de presos acaba acarretando um prejuízo geral no andamento dos processos, com risco grande à segurança pública. Porque a demora pode gerar solturas por excessos de prazos. Hoje mesmo eu tive que tomar a decisão de soltar um preso.
As audiências que não tiveram o comparecimento de réus presos citadas pela magistrada, por exemplo, foram remarcadas para outubro.
—Perde a segurança pública como um todo. Quem sofre é a comunidade com essas deficiências — desabafa Betina.
O que diz a Susepe
Em nota, a Susepe afirma que o Judiciário alterou rotas previamente estabelecidas para prioridade de audiências e que a instituição está se adaptando à mudança "devido ao grande número de requisições que recebe diariamente".
A superintendência divulgou ainda um balanço de audiências realizadas em agosto. Afirma que estavam marcadas 8.347 em todo o Estado, das quais foram realizadas 5.978 e que "as demais não aconteceram por inúmeros motivos". Segundo a Susepe, chega a 75% o índice de audiências com apresentação, percentual semelhante ao divulgado pelo TJ.
Os cancelamentos pelo Judiciário, sem aviso prévio, também foram alvo de críticas. Afirmam que "algumas vezes prejudicam os planejamentos de outras audiências pré-agendada".
Na nota, a instituição cita como exemplo uma audiência prioritária que seria realizada no Foro Central nesta semana, "em que 15 apenados estavam envolvidos num crime de grande repercussão e que foi cancelada com menos de 24 horas de antecedência, prejudicando a logística de escoltas de outras sessões".
Ainda conforme a nota, a instituição afirma que "já implementou cinco salas de videoconferência em estabelecimentos prisionais, sendo uma sala na Pasc (Penitenciária de Alta Segurança de Charqueadas), três na Cadeia Pública de Porto Alegre, conhecido como Presídio Central, e uma na Penitenciária Estadual de Caxias do Sul. Além disso, está formando novos servidores e adquirindo novas viaturas".
O que diz o TJ
Em nota assinada pelo juiz-corregedor André Vorraber Costa, o TJ rebate as críticas feitas pela Susepe. Diz que a implantação do sistema de videoconferência "se trata de iniciativa exclusiva do Poder Judiciário do Rio Grande do Sul, que, com recursos próprios, adquiriu os equipamentos e formou toda a infraestrutura necessária ao seu funcionamento". Também alega que na primeira fase do projeto, desenvolvido em 2017, foram instaladas 98 salas de videoconferência. E que na fase atual contempla mais 319 unidades, das quais 304 deverão ser finalizadas até o final de setembro.
Em relação à logística para o transporte dos presos, o TJ declara que a "Susepe propôs a alteração das rotas já estabelecidas, o que demandou a retomada das tratativas, diante da repercussão que haveria no serviço judicial". E que o assunto está em discussão na corte. "Por derradeiro, há que se destacar que, mesmo com a implantação das rotas, persistiram dificuldades para a apresentação dos réus presos", conclui a nota.