A morte a garrafadas da transexual Thalia Costa, 32 anos, chocou uma família de São Borja, na Fronteira Oeste. A mãe dela precisou ser hospitalizada e uma irmã de Thalia, que mora em Porto Alegre, teve de ir às pressas à cidade natal. Chegou ao município na madrugada desta sexta-feira (22), horas antes do enterro no Cemitério do Passo.
Espécie de confidente de Thalia, Mariane Costa Barbosa, 26 anos, acompanhava à distância o relacionamento da irmã com o jogador de futebol Douglas Gluszszak Rodrigues, de 22 anos. Na quarta-feira (20), dia do crime, os dois completaram um mês de namoro. O corpo dela só foi encontrado na manhã do dia seguinte, às margens do Rio Uruguai.
Às vezes a transexual repassava à ela mensagens apaixonadas — em áudio e texto — do atacante da Associação Esportiva São Borja.
— Na cabeça dela, ele estava apaixonado. E nesses áudios tinha muito amor envolvido. Mas agora eu digo que ele é um monstro, destruiu uma família. A gente sofreu uma perda muito grande. Queremos justiça — revolta-se a irmã.
Dez dias antes de ser morta, na véspera do Dia dos Namorados, Thalia pediu para terminar o relacionamento com Douglas, mas ele não aceitou e o namoro persistiu.
Horas antes do crime, o casal comemorou o primeiro mês da relação em um apartamento. A entrada e a saída deles no edifício foi flagrada por uma câmera de segurança, cuja gravação a polícia teve acesso. A partir das imagens, os investigadores conseguiram chegar ao jogador de futebol.
Vídeo mostra jogador entrando no local em que matou namorada
Antes de ir ao apartamento, Thalia conversou por telefone com Mariane por volta das 13h30min. A conversa foi rápida:
— Ela estava tranquila, não demonstrou nada. Depois a gente não se falou mais — conta Mariane.
Outro indício que levou a polícia a Gluszszak foi o rastro de sangue em uma quadra que separava o apartamento dele de onde foi deixado o carro, horas após o crime. Mariane explica que o jogador cortou a mão ao aplicar os golpes de garrafada em Thalia.
— O rosto dela ficou desfigurado — observa a irmã.
O relacionamento dos dois não era de conhecimento de todos. Segundo Mariane, ela não queria expôr o companheiro.
"Pessoa muito querida", classifica irmã
Na cidade de 61 mil habitantes, Thalia era conhecida pelo bom humor e pelas inúmeras amizades.
— Ela é, foi, uma pessoa muito querida por todos — conta a irmã, ainda se acostumando com a perda.
Há dez anos, quando Thalia passou a se vestir de mulher, foi a personalidade cativante que a fez contornar o preconceito e desaprovação de desconhecidos, que a viam na rua com trajes femininos.
— Quando ela teve a transformação, a população não aceitou, mas ela começou a cativar eles. Foi uma pessoa que cativou São Borja — exalta-se Mariane.
Há pouco mais de um ano, a jovem passou a trabalhar como vendedora de uma loteria nas ruas da cidade. O trabalho externo acabou fazendo com que ela ficasse mais conhecida na cidade. Em sua rede social, comemorou a sorte de um cliente, que ganhou um carro novo.
No campo amoroso, Thalia também se dedicava. Durante o relacionamento com Gluszszak, ia em todas as segundas-feiras pegar o namorado na rodoviária, ainda de madrugada. Durante a semana, ele se dividia entre São Borja e Canoas, na Região Metropolitana de Porto Alegre. Passava de segunda a sexta-feira na cidade da fronteira em um alojamento alugado pelo time. Depois, voltava para Canoas, onde mora a ex-esposa dele e a filha de três anos.
Antes do jogador de futebol, Thalia namorou outro homem por quase quatro anos. O relacionamento só terminou devido a agressões do companheiro. Antes da "transformação", como a família classifica a nova identidade de gênero, chegou a se casar com uma mulher, mas acabou terminando.
Homem confessou o crime
Em depoimento, o namorado da vítima confessou a briga e o crime. Ele alegou que os dois discutiram porque Thalia queria divulgar fotos do casal em redes sociais, o que ele não permitia.
Conforme o delegado Marcos Viana, responsável pela investigação, o homem vai ser indiciado por homicídio triplamente qualificado: por motivo fútil, uso de recurso que dificultou a defesa da vítima e emprego de meio cruel.