A 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) julga na tarde desta terça-feira (20) um habeas corpus coletivo que poderá beneficiar milhares de presas em todo o país. De acordo com a solicitação, da Defensoria Pública da União e de membros do Coletivo de Advogados em Direitos Humanos, sediado em São Paulo, grávidas, mães de recém-nascidos ou de crianças com até 12 anos incompletos sob sua responsabilidade, ainda não condenadas, poderão ter a prisão preventiva substituída por domiciliar.
O número de mulheres que poderão ser beneficiadas ainda não é conhecido. Segundo o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), em janeiro, já havia 622 grávidas ou lactantes (em amamentação) no sistema, em todo o Brasil. Dependem de levantamentos a quantidade de mães de crianças até 12 anos incompletos e sob sua responsabilidade e de quantas, nessas condições, estão encarceradas por prisão preventiva.
No Rio Grande do Sul, segundo a Superintendência dos Serviços Penitenciários (Susepe), há 34 gestantes. Destas, 17 estão na Unidade Materno Infantil (Umi) do Presídio Estadual Feminino Madre Pelletier, em Porto Alegre, que abriga também nove mães com seus filhos com menos de um ano de idade. Três nasceram durante o Carnaval, segundo a juíza Patrícia Fraga, da Vara de Execuções Criminais (VEC).
O habeas corpus tem como base o Código de Processo Penal, que permite aos juízes a adoção da medida. Mas a extensão do benefício de forma generalizada preocupa o Judiciário assim como o Ministério Público no Estado.
Cadeia nunca é lugar para crianças (...) Mas é preciso dar suporte às mães.
PATRÍCIA FRAGA
Juíza da 2ª VEC da Capital
Para a juíza Patrícia Fraga, da 2ª VEC da Capital, cuja jurisdição abrange os dois maiores estabelecimentos femininos do Estado (o Pelletier e a Penitenciária Estadual de Guaíba), se não houver análise de cada caso, a própria presa e as crianças poderão ser prejudicadas.
— Será um excelente passo, desde que haja um acompanhamento dos casos. Algumas terão família que as acolha. Outras, não. Essas, então, precisam ser encaminhadas a assistentes sociais dos municípios. Ou seja: não basta a liberdade. Em muitos casos, é preciso o acolhimento — defende.
De acordo com a magistrada, muitas presas, incluindo as grávidas e as que já são mães, chegam ao presídio partindo de um “ambiente fragilizado”, com vulnerabilidades, como o uso de drogas.
— Cadeia nunca é lugar para crianças. Por isso, a gente se preocupa tanto. Mas é preciso dar suporte às mães, para que se mantenham longe das drogas e não retornem ao crime — alerta.
O fato de a mulher estar grávida ou ter filho não pode ser salvo conduto para que pratique crimes.
MARCELO DORNELLES
Subprocurador-geral para Assuntos Institucionais do MP
No Ministério Público, o subprocurador-geral para Assuntos Institucionais, Marcelo Dornelles, também defende análises individuais, sob outra ótica.
— O fato de a mulher estar grávida ou ter filho não pode ser salvo conduto para que pratique crimes. Há, por exemplo, casos de presas que podem ter praticados crimes contra os próprios filhos — argumenta.
Segundo o procurador, o habeas corpus deve atingir “situações pontuais e específicas”.
— Não desconheço o direito, mas abrir genericamente o benefício é um absurdo — diz.
Especialistas analisam a medida
O recurso a ser votado pela 2ª Turma é analisado por especialistas. Para a advogada criminalista Fernanda Tucunduva van Heemstede, há “uma falha sistêmica do Poder Judiciário” em aplicar a lei de forma isonômica e garantir o direito das mulheres de forma democrática:
— Importante salientar que habeas corpus não trata apenas das condições desumanas dos presídios, que impossibilitam o crescimento saudável de crianças, mas trata igualmente dos atos discriminatórios que ocorrem no país.
Para o coordenador do curso de Direito Penal da Faculdade de Direito do IDP de São Paulo, Fernando Castelo Branco, existem diversas medidas cautelares que substituem a prisão preventiva:
— A proibição de frequentar determinados lugares, o monitoramento eletrônico. Falta ao Judiciário se acostumar a regras alternativas à prisão.
NÚMEROS E ÍNDICES
População carcerária feminina
- No país: 42 mil
- No RS: 2,03 mil
Presas preventivamente
- No país: 34%
- No RS: 33%
Grávidas e lactantes
- No país: 622
- No RS: 43