Passadas as fases de testes, que duraram cerca de 30 dias, começou a funcionar ,no início de julho, o sistema de bloqueio no Complexo Prisional Francisco d'Oliveira Conde (FOC) e na unidade de segurança máxima Antônio Amaro Alves, em Rio Branco, no Acre, que concentram 47% da população carcerária daquele Estado. Juntas, elas estão em uma área total de 113 mil metros quadrados distante 300 metros de vilas da capital acriana. Para o diretor-presidente do Instituto de Administração Penitenciária, Martín Fillus Hessel, o investimento de R$ 172 mil mensais só gerou resultados positivos.
— Durante a fase de testes, alguns celulares continuavam funcionando, houve mudança de tecnologia das operadoras, mas a resposta da empresa contratada foi imediata. Com os ajustes, deixamos todos os presos no "escuro" sem interferir no entorno — explicou.
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Assim como no Rio Grande do Sul, lá os presos ordenavam execuções, roubos e estruturavam suas organizações de dentro do sistema.
— Melhorou consideravelmente. Ainda não temos dados estatísticos, mas percebemos a diminuição dos assassinatos cometidos por ordens de presos. Claro, que os recados ainda chegam às ruas pelas visitas, advogados, mas parece ter reduzido.
O Ministério Público instaurou, em julho ainda, um inquérito civil público para apurar denúncias sobre possíveis falhas no início da operação. O promotor de justiça responsável pelo inquérito e coordenador do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), Bernardo Fiterman Albano, classificou os problemas como ajustes de "sintonia fina".
— Correções foram feitas e agora está funcionando muito bem. Nosso setor de inteligência identificou que conseguimos dificultar muito a comunicação dos presos. Antes, a gente prendia, mas eles continuavam ordenando da mesma forma de dentro dos presídios.
Para evitar retaliação, o governo tomou medidas prévias de segurança, como transferência de presos para penitenciárias federais, para alas com regime disciplinar diferenciado, colocou novas esteiras de Raio x, detectores de metal entre outros equipamentos. Ainda assim, entre 5 e 6 de agosto, houve uma onda de ataques criminosos em quatro ônibus em Rio Branco e Feijó, em um quiosque em Tarauacá, e contra a garagem da Prefeitura de Sena Madureira. Em quatro dias, 40 pessoas foram presas.
"MANDAVAM MATAR POR CARTA"
Diretor do Presídio Central, tenente-coronel Marcelo Gayer, reconhece o poder das facções ao admitir que assassinatos são ordenados de dentro da maior cadeia gaúcha. Ele não questiona a necessidade de instalação dos bloqueadores, mas ressalta que os recados dos presos continuarão a transpor os limites das prisões.
— As ordens vão continuar por meio de visitas, advogados e etc. Só demorarão mais para chegar ao destinatário — diz.
Ângelo Carneiro complementa:
— Em 2010, pegamos visitas saindo da Pasc (Penitenciária de Alta Segurança de Charqueadas) com recados escritos em papel. Mandavam matar por carta. Tem solução, mas os presos sempre vão correr atrás para burlar a segurança.
Sobre possíveis rebeliões, Gayer alerta que qualquer mudança na rotina das cadeias pode ter reflexo na rua.
_ Se for tomada alguma atitude que dificulte a ação criminosa, eles vão utilizar todas as artimanhas possíveis para mudar o cenário — diz, cogitando vandalismo contra ônibus, prédios públicos e até homicídios como forma de intimidação.
Foi o que aconteceu em 2016 no Rio Grande do Norte, quando o governo contratou uma empresa paulista para fazer o bloqueio do sinal em três das 33 unidades prisionais mantidas pelo Estado. O contrato, com vigência de cinco anos, prevê o pagamento de R$ 29 mil por mês. Tão logo os equipamentos foram instalados na Penitenciária Estadual de Parnamirim, em 28 de julho, a primeira a receber os equipamentos, uma série de ataques ocorreu em 42 cidades.
Ônibus, carros, prédios da administração pública e bases policiais foram alvos de incêndios, depredações e disparos de arma de fogo. Os ataques, 118 ao todo, aconteceram entre o dia 29 de julho — um dia após a instalação dos bloqueadores em Parnamirim — e o dia 15 de agosto. Não houve mortos.
Em novembro, foi a vez da Cadeia Pública de Nova Cruz receber o sistema e, em 7 de dezembro, a tecnologia chegou à Penitenciária Estadual de Alcaçuz, onde aconteceu uma rebelião durante a fase de testes que destruiu parte dos equipamentos. Ao menos 26 detentos morreram no dia em que integrantes de uma facção invadiram os pavilhões rivais e promoveram os assassinatos, ação não relacionada à instalação dos bloqueadores. Após o massacre, a empresa prestadora do serviço fez os reparos mas o sistema ainda não foi religado.
Doutor em sociologia pela Universidade de Wisconsin, nos EUA, o colombiano Juan Mario Fandino Marino lembra que o celular é hoje o principal meio de comunicação entre os presos e sua organização criminosa. Por isso, é necessário que essa troca de informações seja interrompida.
— Porém, a polícia precisa estar preparada, pois a reação pode ser brutal.
Schirmer garante que não há motivo para temer:
— Não podemos abdicar do que é bom para a segurança pública por ameaça de facção. Se for assim, temos que fechar as portas.
Prisões modelos não têm bloqueadores
As quatro penitenciárias federais, consideradas modelo de segurança no país, não contam com sistema de bloqueadores porque, segundo o Ministério da Justiça, "o rigoroso sistema de segurança impede a entrada de celular". Desde a inauguração da primeira unidade, em maio de 2006, no Paraná, nunca foi apreendido qualquer aparelho com presos. Conforme o governo federal, todas as pessoas que entram passam por detectores de metais, incluindo juízes, servidores, advogados e visitantes. São feitos quatro procedimentos de revista. Além disso, dois ou três agentes acompanham as visitas.