– É impossível que a criança tivesse aquele tipo de lesão por uma queda acidental, um acidente doméstico.
Foi categórica a frase da médica Ana Helena Pons, do Hospital de Pronto Socorro (HPS), que prestou o primeiro atendimento e a tentativa de salvar a vida do menino Diogo Flores Nascente, aos três anos, em 19 de junho de 2013. O menino acabou morrendo horas depois e agora, depois de quatro anos, o padrasto dele, Luiz Otávio Baptista da Silva, 36 anos, é julgado pelo júri popular pela morte do menino. Durante todo o processo, o acusado sustentou que a morte do enteado foi provocada por uma queda no banheiro do apartamento em que moravam, no bairro Santo Antônio, na zona leste de Porto Alegre.
A médica, que atua há 22 anos no HPS, foi a segunda testemunha apresentada pela acusação na sessão do júri iniciada às 9h30min desta quarta-feira (19). Serão, ao todo, oito testemunhas a serem ouvidas – três apresentadas pela defesa – nesta quarta. A partir da manhã de quinta-feira (20), haverá o debate entre os promotores Eugênio Paes Amorim e Lúcia Helena Callegari e a defensora pública Tatiana Kosby Boeira. A perspectiva é de que o júri, presidido pela juíza Taís Culau de Barros, chegue a uma sentença até a tarde.
Mobilização
Familiares e amigos fizeram uma mobilização desde as primeiras horas da manhã no Fórum. Vestiam camisetas do Movimento Diogo Nascente, que foi criado após a morte do menino como forma de alerta contra a violência doméstica. Pelo grande número de assistentes, foi instalado um telão em um dos corredores do Fórum.
– É uma mistura de sentimentos o que eu senti esse tempo todo. Raiva, injustiça, impunidade. Estou apreensivo, mas espero que a justiça seja feita – desabafou o pai da criança, Eduardo Stasiak Nascente, 32 anos, que acompanha o julgamento.
O Ministério Público trabalha com a possibilidade de pena máxima ao réu, que ultrapassaria, segundo a promotora Lúcia Callegari, os 30 anos de prisão.
– É um crime que teve uma criança como vítima no seio familiar. É um crime chocante e que precisa ser punido exemplarmente como forma de inibir a violência doméstica – acredita a promotora Lúcia Callegari.
Para Eugênio Amorim, as provas técnicas obtidas no processo são irrefutáveis.
– O tipo de lesão sofrida pelo menino, com rompimento da veia porta, exigiria um impacto muito grande. Como o de um pontapé, o de uma agressão muito contundente. Não tenho dúvida neste caso – argumenta.
A defesa
Durante os depoimentos das testemunhas de acusação, Luiz Otávio da Silva permanecia de cabeça baixa e com as mãos juntas, como se rezasse. Ele está preso desde 2014, quando teve a sentença por homicídio triplamente qualificado pronunciada. Ainda assim, mantém a versão de um acidente doméstico.
A alegação do padrasto é de que Diogo possa ter caído de cima do vaso sanitário e batido em uma elevação entre o box e o piso do banheiro enquanto ele buscava uma toalha depois do banho do menino.
– Esta é a tese defensiva que, tranquilamente, vamos argumentar. Neste caso, há uma série de precipitações da acusação. Muitas afirmativas categóricas que não se confirmam – aponta.
O MP chegou a denunciar Karen de Arruda Flores, 29 anos, a mãe do menino, como coautora do crime, por negligência. Ela não foi pronunciada pela Justiça e está entre as testemunhas apresentadas pela defesa neste julgamento. Agora, os promotores aguardam julgamento de um recurso junto ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) para também levarem a mãe ao júri popular.