Foram necessários dois dias e mais de 15 horas e 30 minutos de julgamento para que a sentença de condenação do bioquímico Ênio Luiz Carnetti, 51 anos, fosse proferida pela juíza Taís Culau de Barros. Às 16h50min desta terça-feira, a magistrada estabeleceu ao réu pena de 54 anos e 8 meses de reclusão em regime inicial fechado pelo assassinato a facadas da ex-mulher, Márcia Cambraia Calixto Carnetti, à época com 39 anos, e do filho do casal, Matheus Calixto Carnetti, então com cinco anos.
Leia mais
Mulher e filho são encontrados mortos na Capital
Bioquímico suspeito de assassinato "investigava" a mulher
Bioquímico é indiciado por matar mulher e filho
O crime aconteceu em 25 de julho de 2012, na residência da família, no bairro Tristeza, na zona sul de Porto Alegre. No dia seguinte, Carnetti tentou suicídio pulando da ponte do Canal Furado, na BR-290, para dentro do Guaíba, mas foi resgatado por um pescador. Preso – atualmente no Presídio Central – desde que os corpos foram encontrados, no dia seguinte ao crime, o condenado solicitou à juíza para não participar do próprio júri, sendo conduzido de volta à cadeia.
– Ter ido embora (do júri) não foi uma boa escolha. Era a oportunidade dele se desculpar para a família, para a sociedade – avaliou a promotora Lúcia Helena Callegari, considerando a pena dentro do esperado.
Pela morte da mulher, o bioquímico foi condenado a 22 anos e 8 meses de reclusão, pena a ser somada ao assassinato do filho, fixada em 32 anos. A juíza Taís afastou a inimputabilidade do réu, refutando o argumento da defesa de que o bioquímico havia sofrido um surto psicótico ao desconfiar que Márcia estaria lhe traindo. Para a defesa, o parecer de um psiquiatra particular comprova a insanidade mental de Carnetti. Porém, laudo do Instituto Psiquiátrico Forense (IPF), órgão oficial do Estado, atesta que o bioquímico era capaz de entender o caráter ilícito da sua ação. Para a magistrada, por meses Carnetti traçou estratégias e planos e, de forma vil, ao final, culminou por matá-la.
As testemunhas arroladas pelo Ministério Público, entre elas o pai e o irmão de Márcia, uma ex-colega de trabalho e a doméstica do casal, contaram que o bioquímico mantinha uma relação extraconjugal, traição descoberta pela vítima no oitavo mês da gravidez de Matheus. A enfermeira deu seguimento ao matrimônio de 15 anos, mas teria dito a testemunhas que não o considerava mais seu marido, apenas pai de seu filho.
– O casamento deles terminou quando ela descobriu a traição – disse a ex-colega ouvida.
Dois anos antes da sua morte, a mulher já vinha manifestando a pessoas próximas vontade de pedir o divórcio, até que externou essa intenção ao marido. O principal motivo seria o ciúmes demasiado do réu. Relato de testemunhas – e até bilhetes escritos pelo condenado – mostram que ele passou a ameaçá-la de morte caso a separação se concretizasse.
Família fala em alívio
Os pais de Márcia, João Calixto, 74 anos, e Elizabethe Cambraia, 65 anos, acompanharam o julgamento e se disseram aliviados com a condenação.
– Não queria morrer antes desse julgamento. Estou me sentindo aliviado – disse o pai, que começou a estudar direito após a morte da filha.
– Era a pena que eu esperava. Mas, de verdade, o que eu queria mesmo é que nada disso tivesse acontecido – complementou a mãe.
Márcia era enfermeira da prefeitura de Porto Alegre. O menino estudava na pré-escola de um colégio particular da Zona Sul. Ênio era bioquímico do Laboratório Central do Estado (Lacen) e mantinha ainda um laboratório particular.
RELEMBRE O CASO
A Polícia Civil e a Brigada Militar encontraram os corpos da mãe e do filho na manhã do dia 26 de julho de 2012. Márcia estava de bruços no chão do quarto de casal da residência, morta a facadas. O filho, Matheus, estava em seu quarto, na cama, de pijama, em posição fetal.
Perto dele, foram encontradas duas facas de cozinha ensanguentadas, usadas para cometer os crimes. Na cozinha, uma faca maior foi achada nas mesmas circunstâncias. O menino foi colocado como quem dorme após ter sido morto pelo pai.
Os policiais arrombaram a casa um dia depois de o marido de Márcia e pai de Matheus ter saltado da ponte do Canal Furado, na BR-290. Resgatado por um pescador, foi levado pelo Corpo de Bombeiros ao Hospital de Pronto Socorro da Capital (HPS). Ele deixou o carro Focus no local onde pulou e o veículo foi apreendido pela polícia.
Após o resgate, Carnetti disse aos policiais que não tinha filho, mas passou o telefone de Márcia e explicou que ela estava em uma reunião em Brasília. Foi o pai de Márcia, João Calixto, que, desconfiado, procurou a polícia. A delegada plantonista Clarrisa Demartini, que entrou na moradia, também foi arrolada pelo MP como testemunha.
Na casa, a delegada encontrou cópias de e-mails de Márcia impressos sobre a cama e bilhetes escritos pelo marido que ajudaram a entender a motivação do crime. Nas mensagens, havia indícios de traição da mulher. Nos bilhetes escritos à mão pelo bioquímico, ele dizia que preferia morrer a ir para prisão e que assassinou o filho para ele não sofrer.
O JULGAMENTO