"Já passou da hora de fazer a regulamentação"
José Pastore, consultor em relações do trabalho
Professor da Universidade de São Paulo (USP) e um dos maiores especialistas do país em relações trabalhistas, o sociólogo José Pastore considera urgente a regulamentação das greves no setor público. Pastore considera as paralisações movimentos legítimos de pressão sindical, mas defende limites para determinadas categorias.
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O país não tem regras específicas para greve no serviço público. Há um vácuo legislativo?
Na Constituição de 1988 está escrito que a greve dos servidores públicos será regulada por lei própria, o que não foi feito até agora. Então, já passou da hora de fazer a regulamentação. Há mais de 10 projetos de lei tramitando no Congresso sobre esse tema, alguns há mais de 20 anos. Já deviam ter sido aprovados.
O projeto que está no Senado determina a manutenção de uma força de trabalho de 50%, podendo chegar a 80% na segurança pública. Como equilibrar o direito a greve com a prestação dos serviços aos cidadãos?
Greves são legítimas e precisam ser preservadas, pois são a maneira de o trabalhador exercer pressão dentro do regime democrático. Mas as regras precisam ser respeitadas.
A Constituição diz que forças de segurança que usam armas não podem ser sindicalizadas nem fazer greve. É até surpreendente que o projeto permita greve, ainda que com 80% dos servidores no trabalho. Em todos os países, determinadas atividades essenciais não podem fazer greve.
É preciso estabelecer regras distintas para o setor privado e para o setor público?
Claro, a greve tem de ser regulada de acordo com a atividade. Uma greve numa fábrica de brinquedos só causa prejuízo ao dono da empresa. Agora, uma greve no sistema de abastecimento de água de uma cidade causa prejuízo a toda a população, por isso precisa ser restringida. A lei vai regular até onde vai a liberdade de fazer greve.
"Estão querendo conter a reação pela repressão"
José Dari Krein, professor da Unicamp
Pesquisador do Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), José Dari Krein considera a lei em discussão no Senado um retrocesso democrático. Para Krein, as propostas inviabilizam o direito a greve e se tornam elemento de repressão do Estado sobre os sindicatos.
O governo teme que a crise econômica provoque greves pelo país. Este é o momento para se regular as paralisações?
A forma como o governo optou por ajustar a economia aprofunda a recessão e penaliza o trabalhador, gerando tensão social. Então, o potencial de conflito no setor público é muito elevado. A proposta que está no Senado é para inviabilizar as greves. Estão querendo conter a reação pela repressão. Por isso, se retoma a regulamentação.
O projeto determina a manutenção de uma força de trabalho de 50%, podendo chegar a 80% na segurança pública. Como equilibrar o direito a greve com a prestação dos serviços aos cidadãos?
A greve no setor público precisa conquistar apoio na sociedade. O sindicalista tem de ter consciência disso, pois está mexendo com serviços essenciais. Agora, inviabilizar o direito de greve não combina com a democracia. Acho que esse contingente mínimo de trabalho poderia ser objeto de autorregulamentação pelos próprios atores. Como qualquer coisa na sociedade, pode haver distorções, mas isso o Judiciário se encarrega de analisar para você ter uma coisa mais civilizada.
É preciso estabelecer regras distintas para o setor privado e para o setor público?
Não vejo necessidade de regras diferenciadas. Já existe uma certa regulamentação. O Tribunal Superior do Trabalho (TST) usa para o o setor público as mesmas regras das greves do setor privado. O problema é que tudo que está se propondo não avança para a democratização. Não se pode legitimar certas barbáries, até porque o número de greves no Brasil não é expressivo.