A superlotação nas carceragens das delegacias de Porto Alegre tem novo prazo para acabar: fevereiro. Essa foi a promessa feita nesta quarta-feira pelo secretário estadual da Segurança Pública, Cezar Schirmer, durante visita a um dos centros de triagem anunciados no dia 9 de novembro após presos serem algemados em lixeira na frente do Palácio da Polícia.
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À época, Schirmer garantiu a entrega deste imóvel para 45 dias a partir da assinatura da ordem de serviço. Desde então, quarenta e nove dias se passaram e o secretário voltou a prometer os mesmos 45 dias. A justificativa para atraso está na burocracia:
– Na verdade, eu estava acostumado com a burocracia de Santa Maria (cidade onde foi prefeito por dois mandatos a partir de 2009). Lá é mais ágil e rápido. Aqui é mais difícil, mais lento. De qualquer forma, o importante é que temos uma solução à vista – explicou.
O centro de triagem visitado pelo secretário tem capacidade para 82 presos e está localizado na Rua Doutor Salvador França, nos fundos do Instituto Psiquiátrico Forense. Trata-se de um imóvel da Superintendência dos Serviços Penitenciários (Susepe) que era utilizado como anexo do Instituto Penal Feminino para abrigar detentas do semiaberto. Conforme a superintendente Marli Ane Stock, o albergue foi desativado há pouco mais de um ano.
– Estava deteriorado. As condições do imóvel eram ruins. Então, deixamos de usar – disse Ane.
Com mão de obra de 40 homens do Exército e custo da reforma estimado em R$ 400 mil, o prédio de 660 metros quadrados terá seis celas com banheiro. Os detentos serão encaminhados ao centro de triagem pela Polícia Civil após o registro da ocorrência na delegacia. De lá, passam aos presídios à medida que abrirem vagas. Ane acredita que, com a capacidade total sendo utilizada, serão necessários cerca de 40 agentes penitenciários.
– Temos as escalas de horas extras que já pedimos a suplementação ao governo do Estado – comentou.
Reforma feita com mão de obra do Exército
Schirmer elogiou a parceria com o Exército, dizendo ter intenção de repetir a experiência sempre que possível. Ao evitar ao máximo comprometer-se com datas de inauguração dos demais centros de triagem, disse que 2017 tende a ser o ano do "começo da mudança na segurança pública do Rio Grande do Sul":
– Em 45 dias essa questão dos presos em delegacias estará resolvida. Isso que é fundamental.
Também nos fundos do Instituto Psiquiátrico Forense, utilizando uma estrutura inacabada da Susepe, será construído outro espaço semelhante ao centro visitado por Schirmer, mas com capacidade para abrigar 120 detentos. O custo desta obra é estimado em R$ 2,1 milhões e o prazo de conclusão projetado para seis meses. Este também é o tempo idealizado pelo secretário para conclusão do centro de triagem em Charqueadas e das celas de monoblocos a serem construídas em Porto Alegre.
Contêineres: "Não abandonei a ideia, mas estamos analisando"
Mais polêmica das medidas anunciadas por Schirmer, a utilização de contêineres para abrigar presos antes do encaminhamento ao sistema prisional está em fase de análise em razão das manifestações rechaçando a ideia.
– Apareceu, como sempre aparece quando se tem uma boa ideia, um monte de gente contra (este centro de triagem). Estamos examinando o assunto – garantiu, alegando ter recebido ofícios de órgãos e entidades relacionadas aos direitos humanos.
– Eu fico um pouco perplexo com isso, pois, afinal de contas, o pior mesmo era o que estava acontecendo nas delegacias. Lá, sim, é desumano. Tiveram também os detentos aprisionados em uma lixeira. Na época, ninguém falou disso. Daí, quando encontramos uma solução, que é o contêiner, aí aparece o mundo reclamando – desabafou o secretário.
Ao enfatizar que não abandonou a ideia dos contêineres, explicou que nove empresas se ofereceram para produzir as celas, porém, nenhuma faz a base estrutural onde o equipamento precisa ser instalado.
– Então, teremos de contratar uma empresa de engenharia para fazer a base e uma para fazer o contêiner. E isso é muito problemático. Se conseguirmos contornar essa dificuldade, vamos fazer os contêineres – finalizou.
Relembre alguns episódios que envolvem a superlotação dos presídios
19 de outubro
As consequências do caos provocado pela superlotação do Presídio Central e das principais penitenciárias do complexo de Charqueadas, que já afetavam a Polícia Civil, passaram a atingir o policiamento ostensivo. Em 19 de outubro, uma viatura da Brigada Militar (BM) e outra da Guarda Civil de Porto Alegre abrigavam presos, uma vez que as celas da 2ª e da 3ª Delegacias de Polícia de Pronto Atendimento (DPPA) estavam lotadas. Os veículos permaneceram estacionados até a manhã do dia seguinte junto à 3ª DPPA, na Zona Norte. Na viatura da BM, dois policiais militares do 19º BPM faziam a escolta de dois presos por tráfico de drogas.
6 de novembro
Presos que estavam sendo mantidos na carceragem DPPA de Canoas atearam fogo na cela. Uma policial passou mal ao inalar fumaça no combate ao incêndio e teve de ser socorrida no hospital. Presos batiam nas grades das celas e ameaçavam matar outros detidos.
7 de novembro
No dia seguinte, o secretário da Segurança Pública, Cezar Schirmer, admitiu que estava em estudo, e com boa possibilidade de ser adotado, o uso de contêineres para abrigar detentos recém-ingressos no sistema prisional.
9 de novembro
Dois presos foram algemados a lixeira em frente ao Palácio da Polícia, em Porto Alegre, onde passaram parte da madrugada. Tratavam-se de foragidos que foram detidos durante abordagem policial.
10 de novembro
Por medida de segurança e para não expor os presos, o comandante-geral da Brigada Militar, coronel Alfeu Freitas Moreira, orientou o policiamento para que mantenha as viaturas com os presos em ruas menos movimentadas de Porto Alegre.
16 de novembro
Depois da superlotação de celas nas DPPAs, do uso de viaturas da Brigada Militar para manter presos sob custódia e até do extremo de um preso algemado a uma lixeira em frente ao Palácio da Polícia, uma nova forma de custódia de preso foi vista diante da 2ª DPPA, no Palácio da Polícia. Desta vez, um preso foi mantido dentro do micro-ônibus do 21º BPM.
19 de novembro
Para evitar exposição e constrangimento, um micro-ônibus da BM que abrigava presos à espera de vagas em cadeias ficou estacionado no pátio do Palácio da Polícia. No entanto, insatisfeitos, os seis detidos quebraram janelas e estragaram bancos do micro-ônibus, que ficou completamente depredado em seu interior. Os presos pediam transferência, pois haviam passado a noite no veículo. Mesmo após a revolta, eles seguiram algemados dentro do micro-ônibus por algumas horas e foram autuados por depredação. Dentro da carceragem, outros detidos atearam fogo a roupas e protestaram contra as condições do local.
22 de novembro
Cezar Schirmer confirmou a utilização de um ônibus desativado como alternativa à detenção de presos que aguardam vagas no sistema prisional. O Trovão Azul, como é conhecido, tem capacidade para abrigar até 30 detentos e era utilizado pela Superintendência dos Serviços Penitenciários (Susepe) para transportá-los. Diferente do micro-ônibus da Brigada Militar, depredado no Palácio da Polícia por seis detentos, possui grades no seu interior.
24 de novembro
Neste dia, a Brigada Militar bloqueou parcial uma das principais vias de Porto Alegre em horário de pico: a Avenida Ipiranga. Em frente ao Palácio da Polícia, no sentido bairro, oito presos sob custódia da Brigada Militar em sete viaturas paradas sobre a faixa de rolamento e a calçada da Ipiranga inviabilizavam o serviço de patrulha de 15 policiais às 16h. A ocupação da via pelos veículos da polícia gerou lentidão e curiosidade de quem trafegava pela área. Em razão do calor, alguns policiais optaram por abrir as portas onde estavam os detentos para ventilar as celas. Conforme um policial, que preferiu não se identificar, dois presos estavam no local há três dias esperando transferência para o sistema prisional. Era consenso a insatisfação dos PMs.
30 de novembro
Ônibus-cela da Susepe começa a receber presos. Com capacidade para até 30 detentos, está estacionado em um pavilhão em frente à Academia da Polícia Civil, na Rua Comendador Tavares, no bairro Navegantes, zona norte da Capital, para ser utilizado enquanto são executados os trabalhos para a instalação do Centro de Triagem de presos provisórios no Presídio Central de Porto Alegre. Esta é a primeira das cinco estruturas previstas pelo governo estadual para solucionar a questão da superlotação das carceragens das delegacias de Polícia.