Quando entrou no lotação da linha Belém Novo, na tarde de 7 de novembro, na Avenida Borges de Medeiros, na altura do Parque Marinha do Brasil, o assaltante armado foi logo gritando para os passageiros, sem disfarçar a tensão:
– Se não passar o celular, mato todo mundo.
Essa é a tônica dos roubos a ônibus e lotações na Capital nos últimos meses. O alvo principal agora, de acordo com a Força-Tarefa da Polícia Civil de combate aos roubos a coletivos, não é mais o dinheiro da viagem, mas os celulares dos passageiros. Apesar da significativa redução nesse tipo de crime desde a criação, em março, do grupo especializado – uma queda de 40,4% até outubro –, a violência nestes ataques é motivo de preocupação.
Em 27 dias, foram quatro assaltos a coletivos com pessoas feridas. No primeiro caso, em dia 21 de outubro, um motorista da linha Jardim Vila Nova foi atingido a facada no pescoço, no Cristal. Quando anunciado o roubo, ele ergueu os braços e, ainda assim, foi atacado.
– São criminosos jovens, em geral, sob o efeito de drogas e em alguns casos armados. A recomendação para que os passageiros não reajam e evitem gestos bruscos segue valendo, mas com um acréscimo importante: evite manusear o celular na parada ou dentro do coletivo – diz o titular da força-tarefa, delegado Alencar Carraro.
O suspeito do crime do dia 7 foi preso dois depois e, nesta quinta-feira, teve confirmado o indiciamento pela dupla tentativa de latrocínio. Depois de anunciar aquele roubo, o descontrole do criminoso ficou evidente com um disparo acidental para o chão.
Ele havia iniciado o assalto com a arma engatilhada. A reação de um policial civil aposentado, que era um dos passageiros, foi imediata. Entrou em luta corporal com o bandido e acabou baleado. Uma passageira, assustada pelos tiros, tentou correr do fundo para a frente do lotação. Acabou também ferida. Ambos já foram liberados pelo HPS.
O primeiro caso deixou, no dia 21 de outubro, um motorista da linha Jardim Vila Nova ferido a facada no pescoço ao ser atacado na Avenida Chuí, no bairro Cristal, também na zona sul da Capital. Conforme a apuração da polícia, ele não reagiu. Ao ser anunciado o roubo, o motorista ergueu os braços e ainda assim foi atacado pelo criminoso.
Na quarta-feira, a série de casos que poderiam virar tragédias foi completada por disparos dentro de uma lotação da linha Humaitá, na Avenida Farrapos, área central de Porto Alegre.
– Esses episódios são atípicos, mas nos assustam muito. Parece que agora o criminoso não se contenta só em roubar, precisa machucar – desabafa o gerente executivo da Associação de Transportadores de Lotação (ATL), Rogério Lago.
Nesta quinta-feira, um policial à paisana atirou em um assaltante dentro de um ônibus da linha 271 Amapá. Conforme a Brigada Militar, dois homens embarcaram no coletivo e anunciaram o assalto nas proximidades da Avenida Nonoai, no bairro Teresópolis.
Um a cada quatro roubos ao transporte coletivo na Capital acontece em lotações.
Previna-se
Em caso de assalto:
– Não reaja
– Evite movimentos bruscos
– Não manuseie o celular
– Se houve tiroteio, não corra. Você pode estar indo em direção ao tiro
– O melhor é se abaixar ou tentar abrigo
– Evite sentar muito perto da saída ou da entrada do coletivo
– A possibilidade de ser alvo de um roubo oportunista é maior
Denuncie
– Para informações que possam ajudar a polícia em investigações, denuncie anonimamente pelo 197, 3288-8528 ou pelo 98418-7814 (whatsapp)
Os celulares
Em um dia de feira no Largo da Epatur, no mês passado, os agentes da força-tarefa surpreenderam um jovem. O abordaram e exigiram que entregasse o celular. Tinham um mandado de busca do aparelho ordenado pela Justiça. Aquele equipamento havia sido levado num roubo a ônibus na Capital, repassado a atravessadores no Centro e vendido a esse jovem. O rapaz acabou indiciado por receptação.
– Tem virado prática da investigação. Identificamos os aparelhos roubados, solicitamos a interceptação telefônica e aí conseguimos chegar a quem habilitou aquele aparelho novamente – explica o delegado Alencar Carraro.
É que a investigação do grupo especializado, formado por dois delegados e oito agentes, vai além da simples apuração dos roubos quando registrados. Os investigadores trabalham com mapeamento de ocorrências e suspeitos. Em oito meses, um banco de 300 supostos criminosos foi criado. No mesmo período, 151 pessoas foram indiciadas por roubos ao transporte coletivo.
– Nos últimos dias, com esses ataques a lotações, verificamos que os roubos nas proximidades da Vila Cruzeiro estão mais constantes. Uma equipe de investigação agora atua lá dentro da vila, com abordagens em pontos de tráfico para identificação de suspeitos. Todas nossas abordagens são filmadas e servem como material para reconhecimentos por vítimas – valoriza o delegado.
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Assaltos a ônibus e lotação viram rotina em Porto Alegre
A constatação da força-tarefa é de que os roubos ao transporte coletivo estão diretamente relacionados ao tráfico de drogas. Quem comete esses crimes é visto como inferior na hierarquia do crime, mas fundamental para o sustento dos traficantes.
– O celular que é levado no roubo tem três destinos: é revendido em troca de droga, é repassado para ser desmanchado e também render lucros ao tráfico ou serve para ser repassado às cadeias. Um dos focos da nossa investigação está agora no destino dos celulares – afirma.
A redução dos crimes
– A força-tarefa foi criada em março
– Naquele mês, aconteciam, em média, 7 assaltos a coletivos por dia em Porto Alegre
– Em outubro, foram, em média, 4 assaltos a coletivos por dia em Porto Alegre
– A redução foi de 205 casos no mês para 122 casos
Frota monitorada
Atualmente, 65% da frota de lotações e 35% dos ônibus são equipadas com câmeras de segurança. A meta das associações responsáveis pelos dois modelos de transporte é chegar à implantação em 100% das frotas no próximo ano.