A quebra de recordes em crimes contra o patrimônio no Estado, sobretudo os que usam violência, não surpreende o cientista social Juan Mário Fandino Mariño, doutor em Sociologia e professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Colombiano, é especialista em segurança pública e violência na América Latina. Até por conhecer algumas das mais violentas cidades latinas, admite: a situação em Porto Alegre é de “desorganização social” e “triunfo de uma corrente social egoísta”, uma espécie de capitalismo selvagem que admite ganhos em troca do assalto aos bens alheios. Em entrevista, analisa o crescimento avassalador dos assaltos nas principais cidades gaúchas.
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A que o senhor atribui essa quebra de recordes em assaltos e roubos de veículos?
Infelizmente, não me surpreende. Há sempre uma expectativa, no meio acadêmico, de que os homicídios sejam a marca definitiva da criminalidade. Isso porque é o crime máximo contra a vida. Ele é válido para mostrar a disputa entre facções criminosas, a dinâmica das gangues. Mas, até por isso, é sazonal, seu crescimento oscila muito. O que realmente representa a ruptura do pacto social é o crime contra o patrimônio. É induzido, muitas vezes, pelo tráfico de drogas, que alimenta essa escalada de ataque ao patrimônio. O sujeito que experimenta o gostinho pelo dinheiro, muitas vezes com o tráfico, raramente volta ao trabalho assalariado. E a forma rápida de sustentar essa vida é através do assalto.
E por que isso acontece nas maiores cidades do Rio Grande do Sul?
É nelas que se cria o clima social mais favorável ao descompromisso e à contestação do Estado. Nessas periferias, onde o desemprego é alto, cria-se uma corrente social egoísta. E o Rio Grande do Sul começa a trilhar esse caminho.
Como se pode enfrentar esse problema?
Em duas frentes. O tráfico, que é a mola propulsora da economia da violência, tem de deixar de ser alternativa econômica. Isso leva muito tempo, porque há comunidades estruturadas em torno desse modo de vida. Ele estabelece controles informais, à margem do Estado e dos compromissos sociais. A outra providência a ser tomada é criar empregos para essas populações marginalizadas. Repressão simples é como aspirina: a dor passa, mas o problema segue.